A revelação de que o gaúcho Paulo Ferreira, ex-tesoureiro do PT, teria recebido subornos de R$ 1,5 milhão em grandes obras da Petrobras e destinado recursos para escolas de samba está amparada em documentos. O Ministério Público Federal (MPF) recebeu cópias de quatro pagamentos feitos à escola Estado Maior da Restinga, de Porto Alegre, no valor de R$ 45 mil, além de transferências bancárias que somam R$ 61,7 mil à madrinha de bateria da agremiação, Viviane Rodrigues.
O material foi repassado por um dos delatores da Operação Lava-Jato, Alexandre Romano, ex-vereador petista na cidade de Americana (SP). Romano diz que atuava como uma espécie de faz-tudo para Ferreira, que chegou a ser deputado federal pelo PT-RS. Além da Restinga, são investigadas as relações de Ferreira com a Praiana e a Império da Zona Norte, de Porto Alegre, escolas de samba que homenagearam Ferreira em Carnavais recentes.
Alexandre Romano declarou que fazia a maioria dos repasses em espécie, mas que, por vezes, realizou transferências bancárias a pessoas relacionadas a Paulo Ferreira. "Da parte de Paulo Ferreira, o depoente sacava no banco e entregava para ele, em espécie, no escritório do depoente ou nos diversos almoços que tinha com Paulo Ferreira através de transferências bancárias ou através do pagamento de contas fornecidas por Paulo Ferreira", diz trecho da delação de Romano. Ferreira admite que conhece Romano, mas nega que tenha negócios com ele.
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Romano diz que as transferências bancárias feitas à madrinha da bateria Viviane Rodrigues foram feitas em parcelas mensais de R$ 3,5 mil. Outros repasses foram feitos à pessoa jurídica da escola, nominais para a ONG Sociedade Recreativa e Beneficente Estado Maior da Restinga. São vários cheques, com quantias que variam de R$ 20 mil a R$ 5 mil. Romano também relata cheques nominais que ele teria repassado a familiares de Ferreira e ao próprio Ferreira.
O ex-tesoureiro petista tem longa história como mecenas de escolas de samba da capital gaúcha. Tanto que já foi homenageado por duas entidades carnavalescas de Porto Alegre, nos últimos anos. Em 2009, a Império da Zona Norte bordou uma bandeira oficial com o nome de Ferreira, durante inauguração da quadra, encabeçada pelo ex-deputado petista. Já em 2016, no último Carnaval, a Academia de Samba Praiana levou à avenida o samba "Uma declaração de amor em Verde e Rosa: Paulo Ferreira, um homem do Carnaval". As cores mencionadas são as da Praiana, e o enredo fala da trajetória do ex-deputado e ex-tesoureiro do PT.
As relações de Ferreira com essas duas escolas também são investigadas pelo MPF. O ex-deputado é casado com a ex-ministra Tereza Campello (Desenvolvimento Social).
Escolas de samba admitem ajuda de Ferreira
Zero Hora contatou as três escolas de samba mais ligadas a Paulo Ferreira. O presidente da Estado Maior da Restinga, Robson Dias (o Preto), admite que Ferreira é um dos grandes incentivadores daquela entidade e de outras em Porto Alegre, tanto que recebeu o título de Embaixador do Carnaval. Entre as ajudas que Preto considera marcantes estão visitas que ele e mais 10 integrantes da sua escola de samba fizeram à China.
– Ferreira intermediou nossa ida à embaixada da China em Brasília e, depois, visita à própria China. Ele conseguiu isso por meio de verbas de ministérios, acredito – afirma o presidente da escola da Restinga.
A outra benesse reconhecida por Preto é a ida de 86 integrantes da Estado Maior da Restinga, de avião, aos Jogos Parapan-Americanos, em 2007, no Rio de Janeiro. Eles se apresentaram junto com a Grande Rio, "num intercâmbio propiciado pelo deputado Paulo Ferreira", diz o dirigente carnavalesco.
– O Paulo Ferreira nos abriu os horizontes, nos ensinou onde captar recursos. Mas nunca ouvimos falar que qualquer dinheiro fosse ou seja proveniente de desvios – ressalta Preto.
Miro Leal, dirigente da escola de samba Praiana, admite boa relação com Paulo Ferreira, mas nega que a escola tenha recebido recursos para homenagear o ex-deputado no Carnaval deste ano.
– Era essa a ideia, ele prometeu, mas não conseguiu viabilizar a doação. Ficou de aportar valores ao longo do ano, mas não fez. Nós cumprimos nossa parte – diz Miro.
Em outros anos Ferreira teria ajudado, mas Miro não recorda quantias.Ele ressalta que Ferreira tem importante papel "na cadeia produtiva do Carnaval gaúcho".
Ex-dirigente da Império da Zona Norte, Walmir Oliveira admite que Ferreira ajudou algumas vezes a escola de samba, mas não sabe dar detalhes. Ele está há três anos fora da entidade e diz que as contribuições devem ser detalhadas pelo atual presidente (que não foi encontrado por ZH).
Zero Hora tentou ouvir a madrinha da bateria da Estado Maior da Restinga, Viviane Rodrigues, mas ela não deu retorno aos pedidos de entrevista.
* Zero Hora