Centenas de ex-funcionários da Universidade da Região da Campanha (Urcamp) vivem uma semana de expectativas, aguardando os próximos capítulos de um drama que se estende por anos no interior do Estado. São credores que esperam a quitação de débitos atrasados da instituição – estimados em mais de R$ 600 mil –, o que ficou prometido para ocorrer no dia 6 de junho.
Os repasses se referem aos passivos trabalhistas de 208 ações judiciais de profissionais que não receberam os salários em dia ou foram demitidos sem obter as verbas rescisórias, e passaram a viver rotina de promessas frustradas e indignação.
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A data para o pagamento, definida em audiência no início de maio em encontro coordenado pelo juiz auxiliar de conciliação do Tribunal Regional do Trabalho (TRF) da 4ª Região, Eduardo Vargas, é aguardada com desconfiança pelos ex-funcionários, em razão do histórico de atrasos.
– Em meados do ano passado, também haviam acordado pagar até o final de 2015, mas fizeram o depósito somente de um mês e nada mais depois. Eles nunca cumprem o que acordam – afirma a fisioterapeuta Clarissa Araújo, 43 anos, que trabalhou por 12 anos na instituição.
A ex-professora Marta Assis, que lecionou na universidade por cerca de 15 anos, também se mostra preocupada:
– Estamos nos mobilizando para tentar uma solução. Desde que tudo isso começou, muitos entraram em depressão, outros adquiriram empréstimos que não podem pagar. Nada referente aos funcionários foi levado em consideração. Eles nunca pagaram o que foi acordado – reforça a professora.
Universidade alega atraso em repasses do Fies pelo governo
Foi em 2013 que a longa tratativa começou. Um expediente administrativo passou a prever a destinação de 8% da renda mensal da universidade para o pagamento das pendências trabalhistas e salários atrasados. Mas as parcelas foram pagas só nos primeiros meses. Desde 2015, a instituição deixou de realizar os repasses, afirmam os profissionais. Conforme o advogado Guilherme Johann Neto, que representa quatro credores, nos últimos 16 meses, apenas quatro depósitos teriam ocorrido.
A reitora da Urcamp, Lia Quintana, afirma que o principal responsável pelos atrasos seria um problema nos repasses do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), pelo governo federal:
– Em 2014, ocorreu uma migração de alunos pagantes para o Fies, e grande parte da receita da universidade passou a depender deste componente. Mas o governo atrasou pagamentos, reteve outros, e isso prejudicou o balanço mensal, gerando um descompasse financeiro.
Conforme a reitora, atualmente cerca de 30% dos alunos da instituição estão vinculados ao Fies, o que representa cerca de 40% da receita da Urcamp, porque esses estudantes se matriculam em um número maior de disciplinas.
Em nota, o Ministério da Educação (MEC) garantiu que o repasse é realizado mensalmente, e argumentou que o caso da Urcamp está pendente da apresentação de uma petição por parte da universidade.
"O valor reclamado pela Universidade da Região da Campanha (Urcamp) diz respeito a saldo remanescente de títulos envolvendo aditamento preliminar do 1º semestre de 2015, cujo repasse depende da apresentação de petição de desistência de ação judicial envolvendo índice de reajuste de preço de mensalidade de curso financiado pelo FIES", diz a nota.
Credores cobram venda de bens para sanar dívidas
A justificativa para as pendências trabalhistas da Urcamp é contestada por Johann Neto. O advogado argumenta que a instituição deveria recorrer à venda de bens em leilões, sem comprometer o funcionamento da universidade, para cumprir os pagamentos. Segundo o Johann Neto, desde 2013, só uma área foi vendida – 20 hectares do campus rural. Além disso, conforme o advogado, pelo menos dois acordos entre ex-funcionários e a instituição foram firmados fora do expediente administrativo, o que não seria permitido pelo Judiciário:
– Além de tudo, eles desrespeitam a ordem dos pagamentos, na qual se deveria dar prioridade aos idosos e portadores de doenças, que somam cerca de cem trabalhadores – argumenta.
Sobre esses acordos, Lia firma que não teve acesso aos documentos, já que foram entregues diretamente ao juiz, e só deve se manifestar depois de analisar o material.
Para o diretor do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do RS (Sinpro-RS), Marcos Fuhr, a justificativa dada pela universidade em relação aos problemas com o repasse do Fies é plausível, e a categoria espera que o acordo para pagamento no dia 6 seja cumprido:
– Isso está no discurso de todas as instituições. Tenho de acreditar que a universidade vai cumprir com o prometido, não posso apostar contra algo que seria muito ruim para professores e funcionários.
Com oito campi espalhados em cidades gaúchas voltadas para a agricultura, esta não é a primeira vez que a universidade se envolve em polêmica. Em 2012, devido ao atraso de salários, os professores da instituição entraram em greve. Em 2015, a Urcamp foi excluída pelo Ministério da Educação (MEC) do Programa Universidade para Todos (ProUni) por não ter apresentado comprovantes de regularidade fiscal dentro do prazo. Pouco depois, a reitoria entrou com ação contra o ministério e, por meio de liminar, foi autorizada a preencher as vagas do ProUni.
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