Uma confusão marcou o cumprimento dos mandados de prisão da operação Custo Brasil nesta quinta-feira: por horas permaneceu a dúvida se o ex-deputado federal gaúcho e ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira é ou não alvo das ordens judiciais.
A prisão de Ferreira chegou a ser noticiada, mas, ao mesmo tempo, ele estava em Brasília, entre a sua casa e o trabalho, na assessoria da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos Deputados.
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Em contato com ZH pouco depois do meio-dia desta quinta-feira, Ferreira disse que "parece que tem" um mandado de prisão contra si. Ele afirmou que permanece em casa, na capital federal, e que aguarda orientação dos advogados. Assegurou que, caso confirme a ordem, irá se entregar às autoridades.
– Estou na minha casa, não sei o que houve. Estou aguardando, capturando informações pela internet. A partir do que os advogados falarem, eu vou me apresentar (à polícia) – afirmou Ferreira.
Ele informou que ainda não contava com detalhes da operação e das questões ligadas ao seu nome.
– Meus advogados estão tentando acessar. Evidente que vou me apresentar. Acho que, daqui a pouco, fica esclarecido esse assunto – disse o petista.
Entenda o caso de Paulo Ferreira
Investigadores da Operação Custo Brasil, em entrevista coletiva na manhã desta quarta-feira, esclareceram o papel supostamente desempenhado pelo ex-deputado federal e ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira na contratação fraudulenta da empresa Consist pelo Ministério do Planejamento.
Para a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, Ferreira atuou no processo de direcionamento do contrato e também foi beneficiário de pagamentos de propina a partir de repasses da Consist ao escritório de advocacia Portanova – alvo de buscas na manhã desta quarta-feira – por serviços fictícios.
– Houve participação ativa do Paulo Ferreira para que houvesse a contratação da Consist e para que parte do valor arrecadado fosse para o Partido dos Trabalhadores – afirmou o delegado Rodrigo de Campos Costa.
Além de ter procurado beneficiar o PT com parcela das propinas, conforme a apuração, Ferreira também teria obtido vantagem pessoal.
– As evidências são de que o Paulo Ferreira participa no início do esquema, e, depois, ele recebe valores de um escritório de advocacia muito próximo a ele. O Paulo Ferreira aparece nesses dois momentos muito claramente. No início, na concepção. E no final, recebendo valores – explicou o procurador federal Andrey Borges de Mendonça.
Os dois mandados da operação Custo Brasil no Rio Grande do Sul, um de prisão preventiva e outro de busca e apreensão, já foram cumpridos pela Polícia Federal na manhã desta quinta-feira pela Polícia Federal. O alvo foi o escritório de advocacia Portanova, no centro de Porto Alegre, suspeito de ter recebido dinheiro de contratos fictícios da empresa Consist, que prestava serviços ao Ministério do Planejamento.
O preso, Daisson Portanova, proprietário do escritório, foi levado à Superintendência da PF em Porto Alegre e será encaminhado para São Paulo, base da investigação da ofensiva, que é um desdobramento da operação Lava-Jato.
As diligências que ajudaram a deflagrar a ação desta quinta-feira da PF, com a prisão do ex-ministro Paulo Bernardo, começaram a partir da 18ª fase da Lava-Jato, denominada Pixuleco II, em agosto de 2015, quando foram cumpridos mandados de busca e apreensão no escritório Portanova.
Os materiais apreendidos indicaram a possível implicação de um político gaúcho: o ex-deputado federal e ex-tesoureiro do diretório nacional do PT Paulo Ferreira.
Foram encontradas anotações que indicavam que Ferreira seria o destinatário de R$ 270 mil repassados ao escritório pela empresa Consist Business Software. O valor teria relação com ações judiciais do escritório, mas levantamento dos investigadores apontou que Portanova não atuou em nenhum processo em defesa da Consist ou do próprio Ferreira.
Os pagamentos, feitos entre janeiro e maio de 2015, não teriam relação com nenhuma prestação de serviço. A suspeita dos investigadores da Lava-Jato foi de que se tratava de dinheiro ilegal pago pela Consist ao político.
Ferreira também foi citado por Alexandre Romano, o Chambinho, ex-vereador do PT de Americana (SP), suspeito de ser operador de propina. Depois de ser preso pela Lava-Jato e levado para Curitiba, Chambinho afirmou, em depoimento aos investigadores, que as notas emitidas pelo escritório de advocacia à Consist não tiveram relação com prestação de serviços. Ele explicou que os documentos foram "emitidos a pedido de Paulo Ferreira". Chambinho ainda disse que o ex-deputado "lhe procurou, de forma autônoma, pedindo repasses ao escritório Portanova para ajudá-lo". O operador declarou aos investigadores que Ferreira foi "o beneficiário final dos repasses".
A Consist é uma empresa de tecnologia que, sem licitação, instalou um software de análise e gerenciamento de empréstimos consignados no Ministério do Planejamento a partir de 2010. Os servidores federais que faziam empréstimos consignados pagavam taxa mensal de pouco mais de R$ 1 à Consist pela prestação do serviço de gereciamento. O valor era superfaturado, e a Consist abria mão de 70% da arrecadação, montante que era distribuído em propinas para agentes públicos como Paulo Bernardo e o PT, que ficaria com 20%. Foram movimentados mais de R$ 100 milhões em pagamentos de vantagens ilícitas.
Depois da Pixuleco II, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu que a investigação sobre a Consist e o Ministério do Planejamento deveria ser desmembrada da Lava-Jato, que apura desvios de recursos na Petrobras. Toffoli entendeu que o caso não tinha nenhuma relação com a estatal do petróleo. Como a Consist e o delator Chambinho eram de São Paulo, as apurações foram enviadas por Toffoli para lá.
À época das buscas no Portonova, em agosto de 2015, Paulo Ferreira confirmou ter indicado o escritório para atuar junto à Consist, em causas previdenciárias e trabalhistas. Isso porque conhece o proprietário, Daisson Portanova, há mais de 30 anos e foi colega dele. Ferreira disse também que o contrato existiu, está amparado em relatórios de trabalho, teve impostos recolhidos e, ainda, uma ação de cobrança porque a Consist não pagou tudo o que devia ao escritório Portanova. Ele assegurou que o contrato não era de fachada e negou enfaticamente ter recebido qualquer recurso.
Na manhã desta quinta-feira, em contato com ZH, Paulo Ferreira confirmou que manteve relação política com Romano, o Chambinho, mas negou irregularidades.
– Estou tranquilo. Tenho uma distância abismal desse assunto da Consist. Não participei da inteligência que formulou esse contrato. Nunca neguei minha relação com o Alexandre Romano, conheço ele há muitos anos. Ele me demandava agendas, mas nunca entrei no conteúdo dos negócio dele e não fui usufrutário de nenhum benefício que ele tenha conquistado. Quando ele me envolve dizendo que participei de reuniões, ele tem de provar. Eu nego isso. Nunca tratei desse assunto e não conheço nenhum diretor da Consist – afirmou Ferreira.
Ele ainda reforça que os episódios fraudulentos que envolvem a contratação da Consist pelo Ministério do Planejamento não coincide com o período em que ele era tesoureiro do diretório nacional do PT, quando teria mantido relação mais próxima com Chambinho.
– Acho até natural ser convocado para prestar esclarecimentos, mas ainda não fui. Vou tranquilamente explicar minha relação com o Alexandre Romano, que foi o grande beneficiário desse processo. Fiquei surpreso com a quantidade de dinheiro que ele movimentou nas suas contas. Em um só contrato com a Consist, ele recebeu R$ 32 milhões nas suas empresas. Atribuo essa citação que ele me faz à tentativa de dividir responsabilidades – disse o petista.
Ferreira voltou a confirmar que indicou o escritório Portanova para atuar junto à Consist dentro das suas especialidades jurídicas. A intermediação foi feita por Chambinho.
Ainda em agosto de 2015, Daisson Portanova explicou que foi contratado pela Consist em outubro de 2014 para prestação de serviços de assessoria trabalhista e previdenciária, acompanhando processos na Justiça do Trabalho e emitindo pareceres. Cobrava honorários mensais e recebeu, até metade de maio, R$ 270 mil. A Consist ainda deveria mais R$ 240 mil.