O jornalista Chico Marés e outros quatro profissionais do jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, no Paraná, correm o risco de serem condenados por faltar a uma audiência na Justiça na sexta-feira. Desde que foi publicada a reportagem sobre supersalários do Judiciário e Ministério Público no Estado, em fevereiro deste ano, os magistrados e promotores entraram com diversas ações pedindo indenização moral.
O problema é que as audiências têm sido marcadas em horários próximos, nas mesmas datas, mas em cidades distantes. Na sexta-feira, eles não compareceram ao tribunal que ficava a 400 quilômetros de onde tinham outra audiência, praticamente no mesmo horário.
– Fisicamente impossível. A não ser que a gente se teletransportasse de um lugar para o outro, não teria como comparecer às duas ao mesmo tempo – disse Marés ao Jornal Nacional.
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Na reportagem do jornal, a partir de dados oficiais e públicos, foi evidenciado que os juízes e promotores receberam, em média, mais de R$ 500 mil em 2015. Isso revoltou as categorias, que ingressaram com 41 ações em várias comarcas do Estado, o que obriga os jornalistas a se deslocarem a cada audiência. Conforme o Jornal Nacional, desde abril eles já percorreram mais de 9 mil quilômetros, o que corresponde à distância entre Curitiba e o Canadá.
– O que está em questão aqui não é se eles têm ou não direito a entrar na Justiça, mas sim a forma que eles entraram na Justiça que é uma agressão mesmo, uma agressão à gente, ao nosso trabalho, à Gazeta do Povo e, sobretudo, à liberdade de imprensa – afirmou Marés ao noticiário.
A Gazeta do Povo entrou com uma reclamação no Supremo Tribunal Federal, mas a liminar foi indeferida. O jornal recorreu e ainda aguarda o resultado. A ministra Cármem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que os juízes que são parte interessada em uma ação não deveriam ser os mesmos a julgar o caso. A declaração foi dada durante o 11º Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
– O que nos for considerado como atingindo expectativa, interesse ou direito, vai se entrar no Poder Judiciário, vai se ingressar, na condição de parte, por isso eu chamei a atenção que não sabemos a decisão que um juiz pode provocar, se ele tiver qualquer impossibilidade de julgar com imparcialidade, a parte contra aquele jornalista ou aquela empresa jornalística que ele considerou, esse juiz não poderá julgar – apontou.
A partir da possibilidade de condenação dos profissionais, a Associação Nacional de Jornais e a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão vão ingressar no STF como parte interessada. As duas associações consideram o caso de interesse coletivo, e como parte interessada, vão poder se posicionar e apresentar provas.
A Associação dos Magistrados do Paraná, por sua vez, disse ao Jornal Nacional considerar que os juízes passaram a sofrer constrangimento e que não há tentativa de intimidação, nem ação coordenada. A Associação Paranaense do Ministério Público declarou que as ações não representam tentativa de ferir o direito de informação.