Uma falsa sensação de alívio tomou a recicladora Sandra Marilu da Silva, 42 anos, desde que a obra da nova ponte do Guaíba parou, há pouco mais de duas semanas. À medida que os trabalhos avançavam em direção à Ilha dos Marinheiros, em Porto Alegre, mais perto Sandra e sua família estavam de sair de casa – sem, porém, ter certeza do local para onde vão.
As preocupações mais imediatas foram atenuadas, mas as incertezas não abandonam as famílias que terão ser realocados devido à construção da estrutura, interrompida por falta de verbas do governo federal. Ao todo, 998 são residências e 33 comércios e instituições serão removidos e construídos em novas áreas. Aproximadamente 35% da obra, que começou em outubro de 2014, foi concluída.
– A gente fica um pouco sossegado porque a obra parou, mas vivemos na indefinição. Não sabemos direito para onde vamos, quando vamos, como serão as casas – resume Sandra.
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Além das casas, as toneladas de concreto ocuparão símbolos importantes para a ilha como a capelinha de Nossa Senhora Aparecida e a quadra de futebol da comunidade. O galpão de reciclagem que emprega mais de 20 pessoas e existe desde 1989 é mais um motivo de preocupação.
Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), os moradores da ilha irão para uma área localizada mais ao sul da mesma ilha. Já parte dos moradores das vilas Tio Zeca e Areia, do Bairro Farrapos, ficará no mesmo local, após revitalização da área. Os demais irão para loteamento a ser construído na Avenida Ernesto Neugebauer, na antiga área da Secretaria de Patrimônio da União (SPU).
Sem satisfações
Isso é o que está no papel. Na prática, os moradores têm dúvidas sobre o que realmente será feito quando a obra avançar para a ilha. Os trabalhos foram interrompidos e nada foi dito aos moradores:
– Promessa não quer dizer que vai se cumprir – afirma Sandra.
Enquanto pouco se sabe sobre o futuro, não se consegue planejar nem o presente. A secretária do galão de reciclagem Itamara Moura, 28 anos, não consegue melhorar o pátio onde vive pra evitar que a casa seja alagada a cada nova enchente do Guaíba. Sua casa está localizada exatamente onde ficarão dois pilares da ponte, nos fundos do galpão de reciclagem.
– Queríamos levantar mais a casa, pintar, arrumar por dentro, aterrar o pátio por causa das enchentes, mas nada disso a gente pode pensar em fazer porque não sabe quando vai precisar sair. A vida da gente fica parada – lamenta Itamara.
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Trabalho continua, garante Dnit
Segundo o Dnit, até o momento, não houve uma paralisação total da obra e a previsão da retomada "do ritmo normal ainda não está definido". O órgão disse que o trabalho técnico social junto com as comunidades será mantido, assim como os trabalhos para a liberação dos projetos que cabem à prefeitura.
Contatado pela reportagem, o EdificaPoa informou que já foi aprovado o estudo de viabilidade urbanística da área que vai receber os moradores na Ilha dos Marinheiros. Porém, ficou de informar na segunda-feira se o projeto arquitetônico já está em análise para aprovação.
A Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) já emitiu as licenças prévias das áreas. Após a aprovação dos projetos pela prefeitura, será possível, segundo o Dnit, solicitar as licenças de instalação. Até o momento, não foi realizada nenhuma intervenção na área que receberá as casas.
Mesmo sem prazo de retomada das obras e garantia de recursos, o governo do presidente interino Michel Temer já manifestou interesse em incluir a obra da nova ponte do Guaíba em um lote de concessões de rodovias que incluiria a BR-290, entre Osório e Porto Alegre.
Com isso, seria possível viabilizar a continuidade da construção da estrutura sem recursos públicos. Assim, a obra seria tocada pelo novo administrador privado, que também teria uma outras rodovias sob sua responsabilidade.
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