O anúncio do presidente interino Michel Temer de que o governo federal vai criar um departamento policial para investigar violência sexual pegou de surpresa a Polícia Federal. Primeiro, porque a PF já é um departamento (ligado ao Ministério da Justiça) e por isso não poderia gerar outro departamento. Segundo, porque não é o tipo de crime que costuma ser apurado pelos agentes federais - mas, ouvidos por Zero Hora, delegados disseram que nada impede que esse tipo de delito se torne também foco de apurações da corporação.
O anúncio de Temer foi feito em reação ao caso de estupro coletivo de uma jovem no Rio de Janeiro, que causou comoção nas redes sociais. O presidente interino chamou uma reunião de emergência e disse, pelo Twitter, que o governo federal "está mobilizado para apurar as responsabilidades e punir com rigor" os criminosos e os responsáveis pela divulgação das imagens nas redes sociais.
– É um absurdo que, em pleno século 21, tenhamos que conviver com crimes bárbaros como esse. Tomaremos medidas efetivas para combater a violência contra a mulher. Vamos criar um departamento na Polícia Federal tal como fiz com a delegacia da mulher na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Ela vai agrupar informações estaduais e coordenar ações em todo país – afirmou.
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Na realidade, dizem delegados a ZH, Temer pode determinar a criação de um grupo para investigar estupros. Investigações sobre delitos de natureza sexual já fazem parte do cotidiano da PF, só que no campo da internet. A maioria das superintendências (órgãos regionais) possui a Delegacia de Defesa Institucional (Delinst), que inclui um grupo de combate a crimes cibernéticos. Uma das mais importantes tarefas dessa unidade é reprimir redes de pedofilia.
– Nada impede que dentro da Delinst seja criada uma unidade para reprimir crimes sexuais em geral, como os estupros – pondera um policial especializado em combater pedofilia.
Muitas pessoas se questionam se a PF, ao criar esse grupo, não estaria se sobrepondo à função já exercida pelas Polícias Civis estaduais e suas Delegacias da Mulher. É certo que os federais têm como prioridade combater crimes de natureza federal ou que ultrapassam fronteiras estaduais, mas nada impede que atuem contra delitos locais, desde que adquiram importância nacional. Foi assim recentemente em Luiziânia (Goiás), quando um serial killer matou diversas pessoas. A investigação foi feita, entre outros, por delegados federais designados especialmente para o caso. Em outros episódios, federais atuaram contra ladrões de banco e traficantes que atuam em mais de um Estado.