Depois de mais de três horas de discussão, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, no fim da tarde desta quinta-feira, manter afastado de suas funções o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), réu na Operação Lava-Jato. A decisão foi tomada por unanimidade, diante de um plenário lotado e ao som de fogos de artifício espocando no céu de Brasília.
Antes das 14h, a fila formada na porta do STF já dava a dimensão da importância da sessão que se iniciaria em seguida. Estudantes de Direito, advogados, políticos, jornalistas e curiosos ocuparam as poltronas destinadas ao público e acompanharam de camarote a histórica decisão, que promete chacoalhar a política nacional daqui por diante.
– Esse julgamento demonstra que o Judiciário, especialmente o STF, está atento ao que acontece no país – afirmou o presidente da Corte, Ricardo Lewandowski, acrescentando que "o tempo do Judiciário, não é o tempo da política nem é o tempo da mídia", em resposta às críticas em relação à demora no andamento do processo.
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O debate atraiu ainda mais as atenções por conta da decisão inesperada revelada horas antes contra Cunha. Inicialmente, os ministros estavam preparados para analisar apenas a ação ajuizada na última terça-feira pela Rede Sustentabilidade, que questionava a legitimidade do parlamentar na presidência da Câmara – e na linha sucessória da Presidência da República –, por se tratar de réu em esquema de corrupção.
Relator da ação, o ministro Marco Aurélio Mello decidiu levar o assunto aos colegas imediatamente, para apreciação coletiva. A atitude teria incomodado Teori Zavascki, relator da Lava-Jato. Isso porque, desde dezembro, estava nas mãos dele o pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pelo afastamento de Cunha, responsável por desencadear o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Nos bastidores, Zavascki decidiu antecipar a punição ao parlamentar, por acreditar que os ministros, ao analisar a ação da Rede, poderiam votar apenas pela saída de Cunha do comando da Câmara – e não pela suspensão do seu mandato, medida considerada mais radical e controversa.
A reviravolta foi gestada ao longo da noite de quarta-feira e comunicada a Lewandowski durante a madrugada. Pela manhã, a notícia ganharia as redes sociais, surpreendendo o país e o próprio Cunha. A dúvida, a partir dali, era se os ministros manteriam a definição de Zavascki.
Para sustentar a decisão no plenário, ele relembrou as suspeitas contra Cunha ao longo de 73 páginas. Afirmou que a permanência do deputado na presidência da Câmara representava "risco para as investigações" da Lava-Jato e, mais do que isso, conspirava "contra a própria dignidade da instituição por ele liderada". Para evitar críticas, destacou se tratar de "situação extraordinária, excepcional e, por isso, pontual e individualizada".
– Não há a menor dúvida de que o investigado não possui condições pessoais mínimas para exercer, neste momento, na sua plenitude, as responsabilidades do cargo de presidente da Câmara dos Deputados – disse Zavascki.
Todos os ministros acompanharam o voto do relator, que foi classificado por Celso de Mello como "denso e magnífico". A cada parecer contra Cunha, aumentavam os estalos dos fogos de artifício do lado de fora e, do lado de dentro, o burburinho entre os presentes.
Ao dar seu voto, Marco Aurélio brincou diante das especulações de que ele e Zavascki teriam brigado e saudou o colega por ter "adiantado boa parte do trabalho" que lhe caberia.
– A decisão de Teori desmente que haveria no âmbito do Supremo competição juvenil para redefinir relatoria de matérias – resumiu Marco Aurélio.
Ao finalizar o julgamento, Lewandowski chegou a classificar a medida como "extremamente comedida", argumentando que Zavascki poderia ter optado, por exemplo, por determinar a prisão preventiva de Cunha.
A ação da Rede não chegou a ser julgada, mas políticos ligados ao partido, como o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ), que acompanhou a discussão, comemoraram o desfecho. O clima era de euforia.
– O resultado é muito importante para a política brasileira – sintetizou Molon.
Antes de deixar o local, sem falar com a imprensa, Teori foi cumprimentado por colegas. Da ministra Cármen Lúcia, recebeu até um abraço.