Foi quando estava chegando para um jantar, na noite da última segunda-feira, que um médico de 44 anos se tornou mais um número nas dramáticas estatísticas da violência na Capital. O homem, que pediu para ter a identidade preservada, foi abordado por três criminosos por volta das 21h na Avenida Taquara, no bairro Petrópolis, e mantido refém dos assaltantes por cerca de 15 minutos.
Após recolher os pertences do homem, os três criminosos realizaram um sequestro relâmpago, levando o médico em seu veículo. Durante o percurso, o carro em que eles estavam capotou na Avenida Ijuí. A vítima do sequestro foi levada para o Hospital de Pronto-Socorro com ferimentos leves e liberada em seguida. Os ladrões fugiram.
Na manhã desta terça-feira, Zero Hora conversou, por telefone, com o médico, que descreveu a ação dos criminosos como profissional e violenta. Confira:
Como você foi abordado pelos assaltantes? Estava saindo do carro?
Sim, eu estava chegando para um jantar por volta das 21h. Repentinamente, um carro, acho que um Peugeot 206, parou ao meu lado. Saíram três elementos do veículo, que aparentavam ser bem jovens, talvez até menores de idade. Eles me mandaram deitar no chão, bem rente ao muro da casa, pegaram meus pertences, perguntaram quem estava dentro de casa, se eu morava ali. Dei minhas coisas e a chave do carro, perguntei se eles sabiam ligar o carro. Achei que eu iria ficar ali e eles iriam embora.
Você se manteve calmo nesse momento?
Eu sempre treinei para manter a tranquilidade. Na verdade é um absurdo o fato de treinarmos para sermos roubados, porque todos sabem que um dia serão. Eu fazia um treinamento mental, pensando em como deveria reagir, e me foquei nessas coisas. Ontem eu estava no momento errado e na hora errada.
O que houve então?
Não lembro bem o que falaram, mas me disseram para dar o relógio e o celular, e eu disse que o telefone estava dentro do veículo. Foi aí que eles decidiram me colocar pra dentro do carro. Eu fiquei sentado no banco de trás, no meio, com um homem em cada lado, sendo um deles com uma arma apontada pra mim. O terceiro homem estava no banco da frente, dirigindo. Eu só não consigo lembrar o rosto deles. Não olhar para a cara dos bandidos também fazia parte do meu treinamento.
Dentro do carro, eles disseram para onde iriam te levar?
Eles começaram a rodar, e me pediram a senha iTunes. Eles queriam esta senha porque sabiam que, através dela, poderiam interromper o rastreamento do aparelho e desbloquear ele para revender. Eu não lembrava essa senha, disse uma, depois outra, mas não conseguia lembrar a correta. Eles usavam termos bem técnicos para falar do telefone. Tinham conhecimento sobre o assunto.
Foi aí que eles começaram a ficar mais violentos?
Sim, eles começaram a me ameaçar e dizer: "Tu vai morrer por causa de um celular, tu vai levar um tiro por causa dele". Eles me deram uns 10 minutos para tentar lembrar a senha, e começaram a me dar coronhadas na cabeça com a arma dizendo que isso iria ajudar a lembrar. Eu só dizia para eles: "Calma, vou lembrar, continua rodando que daqui a pouco vem".
E você lembrou?
Não, até agora não lembro a senha. Na hora, eu só pensava: "Vou morrer por causa de uma maldita senha". Mas, de repente, ouvi um estrondo muito forte. Foi quando o carro capotou. Não sei dizer o que levou o motorista a bater o carro.
Ele estava andando em velocidade alta?
Eu não saberia dizer. Na hora não parecia, mas pelo jeito que ficou o carro, imagino que sim. Quando o carro capotou, os três saíram correndo, e eu permaneci no carro. Um deles ainda voltou logo depois para pegar a arma que tinha ficado dentro do veículo. Depois disso, dei alguns segundos e saí.
Como você descreveria a ação deles?
Eles não pareciam nervosos, me pareciam profissionais e bem violentos. Eles sabiam bem o que estavam fazendo. No início até que não pareciam agressivos, mas conforme o tempo foi passando, foram ficando mais violentos.
Como você está agora?
Estou bem fisicamente, apesar de ter levando alguns pontos no couro cabeludo. Mas de qualquer forma essa situação que estamos vivendo é muito complicada, porque a gente trabalha, trabalha, e é isso o que acontece.