Em novo depoimento a investigadores da Lava-Jato, o lobista e delator Júlio Camargo indicou que o esquema de propinas para evitar a convocação de empreiteiros em duas CPIs da Petrobras em 2014 teria sido muito maior do que o revelado até agora pela operação. Segundo Camargo, o ex-senador Gim Argello (PTB), preso na última terça-feira na Operação Vitória de Pirro, a 28ª fase da Lava-Jato, cobrou R$ 5 milhões de cada empresa para livrá-las das CPIs.
O novo depoimento de Julio Camargo ocorreu na quinta-feira em Curitiba. Ele é o delator que em 2015 revelou ter sido pressionado pelo presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), por uma propina de US$ 5 milhões. O relato do lobista teve peso decisivo na denúncia que a Procuradoria-Geral da República apresentou ao Supremo Tribunal Federal contra o parlamentar, por corrupção e lavagem de dinheiro.
Até aqui, a Lava-Jato identificou R$ 5,3 milhões que teriam sido pagos a Gim Argello. Uma parte teria sido repassada pela UTC (R$ 5 milhões), destinada aos quatro partidos da Coligação União e Força nas eleições de 2014 – o Ministério Público Federal destaca que não há informação de que as legendas soubessem da origem ilícita dos valores. Outra parte teria sido depositada pela OAS (R$ 350 mil) na conta da Paróquia São Pedro, de Taguatinga – cidade satélite de Brasília –, frequentada pelo ex-senador.
Leia mais
Família de Gim Argello diz que prisão do ex-senador é injustificada
Câmara Legislativa do DF exonera "operador de propinas" de Gim Argello
PF encontra apelidos como "bovino religioso" e "nazista" em mensagens de celular de empreiteiro
Em troca desses repasses, os empresários Ricardo Pessoa, da UTC, e Léo Pinheiro, da OAS, não foram chamados para dar explicações para as duas CPIs. Em nenhuma das duas comissões, houve convocação dos empresários para depor. Em seu depoimento, o delator diz que ele, Argello e Léo Pinheiro buscaram outras empreiteiras para relatar a cobrança, mas não deu mais detalhes sobre como a situação foi tratadas por elas: Odebrecht, Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez e Engevix.
Nesse novo depoimento, realizado na quinta-feira, Júlio Camargo citou três encontros com Gim Argello e outros empreiteiros após a instalação das duas CPIs. Segundo o delator, a preocupação com as comissões fez os empreiteiros investigados se articularem, organizados pelo ex-presidente da OAS Léo Pinheiro. Com isso, ele e Léo Pinheiro participaram da primeira reunião com o então senador, em Brasília.
"Gim Argello disse que a intenção não era ir contra os empresários, mas contra as pessoas das Petrobras envolvidas em processos irregulares da empresa; que Gim Argello disse que chamaria todo o setor e pediu a Léo Pinheiro e ao depoente para avisar a alguns dos empreiteiros", afirmou o delator. Então, ele e Léo Pinheiro teriam ficado responsáveis por avisar as outras empresas sobre a demanda que, no primeiro encontro, ainda não estava clara que se tratava de propina e o próprio Léo Pinheiro teria comentado.
"Léo Pinheiro, mais experiente que o depoente, perguntou se teria que haver pagamento de propina, disfarçada em contribuição política; que Gim Argello disse que deixassem esse assunto para a próxima reunião", disse.
No segundo encontro, contudo, o ex-senador teria sido mais direto e dito que tinha a "missão" de cobrar R$ 5 milhões dos empresários. "Gim Argello disse que não queria pressionar o empresariado, mas que aproveitaria a CPI para arrecadar contribuições, pois estava próximo das eleições; que Gim Argello disse que essa era uma missão que tinha recebido, um "pepino", que Gim Argello disse que queria R$ 5 milhões por empresa", relatou o lobista. O senador ainda teria deixado claro em outra ocasião que quem não pagasse a propina seria convocado.
Na época conselheiro da Toyo Setal junto com Augusto Mendonça Neto, outro delator da Lava-Jato, Júlio Camargo disse aos investigadores que sua empresa era menor e não tinha condição de arcar com os R$ 5 milhões e, por isso, teria negociado uma redução para R$ 2 milhões, que foi informada a Argello em uma terceira reunião. Os repasses, então, teriam sido acertados via doações oficiais da Toyo Setal, junto com Paulo Roxo e Valério Neves, suspeitos de operarem os pagamentos a mando de Argello e que foram soltos nesta sexta-feira.
A defesa da OAS não comentou o caso. A Andrade Gutierrez já firmou um acordo de delação premiada, homologado pelo Supremo Tribunal Federal e que está sob sigilo. A Odebrecht anunciou que busca fazer o que chamou de "colaboração definitiva", mas oficialmente o Ministério Público Federal informa que as negociações com a empreiteira não avançaram. A empresa não quis comentar o caso. A reportagem tentou contato telefônico com a assessoria da Queiroz Galvão, mas ninguém atendeu.
A defesa de Gim Argello informou que não comenta investigações em andamento. Em nota, a assessoria da Engevix afirma que "todas as informações pertinentes ao caso foram prestadas às autoridades responsáveis pelas investigações".