Engolido pelas drogas ao longo de mais de três décadas, o motorista aposentado Ricardo Dreher, 55 anos, encontrou no auxílio a dependentes químicos uma forma de se manter longe do vício em cocaína e crack. Limpo há oito anos, Ricardo dedica-se desde o ano passado à coordenação da comunidade terapêutica Instituto Libertação, no Bairro Campo Novo, em Porto Alegre, onde começou como voluntário em 2011.
Na comunidade, reservada em meio à mata nativa, Ricardo ajuda a dar um novo caminho a quem enfrenta a escuridão. Disposto a repassar ao próximo a própria experiência que quase lhe tirou a vida, o aposentado encontra o conforto no abraço dos que ali esperam por uma palavra amiga. Hoje, 35 homens, com idades acima de 18 anos, vivem no local. Dos internados, apenas 12 têm condições de pagar por uma mensalidade. O restante é atendido gratuitamente. Para isso, a instituição depende de doações.
Incansável, o aposentado passa o dia no Instituto. Com a missão de dar uma nova vida a cada novo homem que lhe pede ajuda, Ricardo acabou ganhando uma definição vinda de uma mãe de um ex-dependente resgatado por ele: pescador de almas.
Leia mais
Conheça outras histórias do Caminho do Bem
Definição
"A última definição que me deram veio de uma mãe, que disse que eu era um pescador de almas. Me sinto assim, dentro da minha humildade. Lido com vidas humanas, com almas, com famílias, com gente que sofre em volta. Me orgulho disso, e isso só engrandece a minha alma. A minha pessoa."
Ex-dependente
"Vivi 35 anos num inferno. Estou longe da droga há oito anos. Cada dia é um novo dia. A droga pode parecer boa, mas hoje consigo colocar tudo numa balança e ver o quanto ela me fez perder amor, amigos, causar dor e machucar quem eu amo. Já passou meu tempo. Hoje, sou feliz por ter a chance de passar adiante a minha experiência de vida – boa e ruim. Consigo viver melhor e ajudar as pessoas, contra tudo e contra todos aqueles que não entendem o nosso trabalho."
Missão
"Posso dizer, com certeza, que sou um exemplo e um milagre por estar vivo. Foram anos acreditando que eu poderia cheirar cocaína e fumar maconha em sociedade. Quando entrei no crack, meu mundo desabou de vez ao longo de dez anos. Minha missão hoje é a mesma do Instituto: apoiar o dependente químico num novo modelo de vida, onde a resistência cederá às evidências. Vivendo em recuperação, as coisas começam a melhorar pra ti. Isso é um fato. Aqui, pelo menos, eles tentam caminhar para diminuir a dependência."
Caráter
"Escuto todos os dias 'como estão os teus maconheiros?'. E, às vezes, por eu estar aqui dentro e na rua, estas pessoas que estão aqui são mais especiais do que muitas pessoas que nunca usaram drogas. Pois defeito de caráter, todos temos. Aqui, pelo menos, eles estão tentando melhorar."
Resgate
"Um dia, desabafei com um amigo dizendo que não sabia se este trabalho estava valendo a pena. Na época, o índice de recuperação tinha baixado (estava em torno dos 25%. Hoje, é de 40%). E ele só me questionou se era pouco salvar uma vida, uma alma. Pode ser pouco para nós, mas, se deram esta missão, quem sabe era para salvar uma única vida. Então, fiquei vários dias da semana refletindo sobre a minha missão. Não é fácil, pois cruzo, chuto, cabeceio e busco doação, mas deito a minha cabeça tranquila porque sei que estou fazendo a minha parte."
Curta a página do jornal no Facebook