A pouco mais de 10 dias de o Senado votar a admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff, que deverá ser afastada do cargo temporariamente por 180 dias, Michel Temer desponta com maioria na Câmara. O vice-presidente já conta hoje com o apoio de 310 a 360 deputados, número próximo dos 367 que votaram a favor do processo contra Dilma na sessão do último dia 17.
Um dos passos decisivos para a consolidação da maioria governista foi dado na quarta-feira, quando Temer ouviu do senador Aécio Neves (PSDB-MG), na residência oficial do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a afirmação de que o partido "dará a sua contribuição e será julgado lá na frente". Além dos tucanos e do próprio PMDB, outras bancadas numerosas se aproximam, como PP, PSD, PTB e PR, do chamado centrão. Também integrarão o time de aliados antigos opositores do PT, sobretudo DEM e PPS.
– Os partidos que ajudaram a derrubar o governo Dilma tem de ajudar a governar, independentemente de cargo. O SD vai estar na base do Temer – assegura o deputado Paulinho da Força (SP).
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Aécio também alega que a conversa não deve se basear na ocupação de espaços, mas diz que o PSDB não criará obstáculo caso Temer deseje contar com alguém do partido na equipe. José Serra (PSDB-SP) é considerado nome certo, resta apenas definir a pasta.
Líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR) afirma que o partido "não irá pleitear nada", mas é outro a assegurar que poderá ceder quadros. Da sigla, Roberto Freire (SP) é citado como opção para o primeiro escalão. No xadrez dos cargos, o vice-presidente já recuou da ideia inicial de reduzir o número de ministérios para 20. Por conta dos arranjos, devem ficar em 25, ante os 32 atuais.
O argumento mais lembrado pelos aliados é o de que o país atravessa situação de emergência e que afastar Dilma e deixar Temer sem sustentação seria uma irresponsabilidade que jogaria o Brasil ainda mais fundo na crise.
– O voto foi de dupla responsabilidade. O primeiro pelo impeachment. E o segundo, pelo compromisso de tirar o Brasil do buraco. A ideia é nos mantermos na casa dos 360 votos – avalia Darcísio Perondi (PMDB-RS).
Para ratificar apoio, as siglas estão apresentando condições.
O PSDB formula um documento com sugestões. Agremiações como DEM, PPS e PP avisaram que não querem ouvir falar em aumento de impostos e retorno da CPMF. O vice-presidente emitiu sinais de que entendeu o recado: ontem à tarde, em reunião com a bancada agropecuária, assegurou que não irá apresentar proposta para elevar tributos. Não na largada, ao menos.
– Também pedimos que exista reação em caso de invasões de terra – declara Jerônimo Goergen (PP-RS), que participou de reunião da bancada do PP em que foi montado um grupo que debaterá programa a ser levado a Temer.
Em outra frente, lideranças pleiteiam que o vice utilize o eventual "mandato de transição" para fazer reformas. Entendem que o momento é favorável e apontam que a base aliada que se desenha é suficiente para aprovar propostas de emenda à Constituição.
– O governo terá de tomar logo as medidas de equilíbrio fiscal para enfrentar os graves problemas que o país atravessa. Também precisa fazer reformas importantes: tributária, trabalhista, sindical, política, previdenciária – enumera Bueno.
O PSB, rompido com o governo Dilma desde setembro de 2013, também discute o posicionamento.
– Prefeitos, deputados e senadores nossos pensam que devemos ir para o governo e ajudar o Brasil a ter o mínimo de estabilidade. Na base, há gente contra. Mas isso depende da agenda que será colocada para o país voltar a crescer e do time que será escalado, que precisa ir além dos partidos – avalia Beto Albuquerque, vice-presidente nacional do PSB.
Também do PDT, aliado de Dilma com fissuras na votação do impeachment, surgiram sinais de que é possível contar com pelo menos parte da bancada para sustentação do governo. Com PT, PC do B, PSOL e parte do PDT e da Rede, a oposição teria dificuldade para ultrapassar cem dos 513 deputados.
Para consolidar novas adesões, propostas podem ser ampliadas
Para atender parte das reivindicações de aliados, como a ala sindical representada pelo SD, o vice-presidente Michel Temer prepara o lançamento da segunda edição do documento Uma Ponte para o Futuro, onde constam propostas do PMDB para desenvolver o Brasil. A primeira edição do programa causou desconfiança por ser enfática em temas como reformas e ajustes fiscais. Logo vieram temores de retirada de direitos trabalhistas e sufocamento de programas sociais.
Siglas mais ligadas ao campo da centro-esquerda, como o PSB, também condicionam apoio à manutenção de avanços sociais e questões como o rebaixamento de juros. A versão dois está pronta e deverá ser publicada no site da Fundação Ulysses Guimarães (FUG), ligada ao PMDB, até a próxima segunda-feira.
O momento não foi escolhido por acaso: a carta será divulgada dias antes da votação da admissibilidade do processo de impea-
chment no Senado para frear especulações de que Temer acabará com políticas sociais. Também trará afirmação de apoio ao combate à corrupção. A redação está a cargo do ex-ministro Moreira Franco (PMDB-RJ), presidente da FUG e um dos integrantes do partido mais próximo de Temer.
– Tenho falado muito com ele sobre a Ponte para o Futuro dois. Vai deixar claro que o Bolsa Família será mantido. Também
reafirmará o Pronatec, o ProUni, o Minha Casa Minha Vida. Além disso, mantém direitos trabalhistas e amplia discussão sobre a previdência – diz o deputado Paulinho da Força (SD-SP).
Divisão de forças
310 a 360 parlamentares é o número estimado para a base de apoio que Michel Temer teria na Câmara, conforme projeção de aliados do vice-presidente
308 é o número de votos necessários para aprovar uma proposta de emenda à Constituição (PEC), em votações de dois turnos, instrumento para fazer algumas das reformas suscitadas
Partidos que devem apoiar o governo Temer
PMDB, PSDB, DEM, PPS, PP, PSD, SD, PTB, PRB, PR, PSC e PV
Partidos que podem apoiar, mas rachados
PSB e PDT
Partidos que devem ficar na oposição
PT, PC do B, PSOL e Rede*
*Pode haver apoio isolado