Uma denúncia envolvendo uma agência do Banrisul de Viamão há um ano levou a Polícia Civil a desmantelar, nesta terça-feira, uma quadrilha formada por mais de 30 pessoas, incluindo gerentes e funcionários do banco, que agia em todo o Estado. Até agora, a investigação estima que a fraude beire os R$ 7,5 milhões – mas pode ser maior, envolver ainda dois bancos privados e dobrar o número de envolvidos.
Batizada de Stellio – palavra do latim que dá nome a uma espécie de lagarto, que muda de cor para passar despercebido, e que deu origem à expressão stellionatus (estelionato) –, a operação cumpriu 211 mandados judiciais (64 de busca, 27 de prisão temporária e 120 bloqueios de ativos financeiros e de bens), reunindo 272 agentes, em 13 cidades gaúchas – uma das maiores operações realizadas em um mesmo dia pela polícia gaúcha até hoje. Somente um dos mandados de prisão temporária expedidos não foi cumprido porque o suspeito não foi localizado. Além disso, 20 veículos foram apreendidos na operação.
As ações foram realizadas em Porto Alegre, Alvorada, Cachoeirinha, Caçapava do Sul, Canoas, Capivari do Sul, Cidreira, Mostardas, Imbé, São Leopoldo, Palmares do Sul, Santa Cruz do Sul e Viamão.
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De acordo com o titular da Delegacia Fazendária do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o delegado Joerberth Nunes, a quadrilha era formada por funcionários do banco (incluindo gerentes), "laranjas" e proprietários de empresas de fachada.
– Os servidores facilitavam a contratação de empréstimos por donos de empresas de fachada ou em nome de "laranjas", ou seja, não exigiam toda a documentação necessária para abrir crédito em banco ou aceitavam cheques sem fundo e bens que haviam sido obtidos com documentos falsos – afirma Nunes.
Depois disso, o dinheiro era desviado para contas bancárias operadas pelos articuladores do esquema. Segundo o delegado Daniel Mendelski, também da Fazendária, o plano funcionava em formato de pirâmide: quando esgotava o prazo de pagamento de um empréstimo, a quadrilha realizava novo contrato e amortizava o necessário da dívida, e assim por diante.
– Usamos o famoso follow the money (do inglês, "siga o dinheiro"), porque, num esquema de corrupção, o dinheiro sempre deixa rastros – afirmou Mendelski. – Chegamos, por exemplo, a um homem que morava numa casinha nos fundos de um terreno e que havia feito empréstimo de R$ 900 mil.
O rastreamento dos valores chegou a cerca de 60 suspeitos de envolvimento e, pelo menos, 15 empresas de fachada de diferentes ramos. O empréstimo fraudulento mais antigo apurado é de 2012.
Entre os 27 presos temporariamente nesta terça-feira, há um gerente e um funcionário do Banrisul. Segundo a polícia, eles foram afastados pelo próprio banco, que colaborou desde o início com as investigações. Em nota enviada à reportagem, a instituição informa que:
"A partir de novembro de 2014, a Auditoria Interna do Banco apurou determinadas irregularidades em aberturas de contas e deferimentos de crédito nas agências Capivari do Sul e Viamópolis. Avaliados os fatos, foram adotadas medidas internas cabíveis, inclusive com a demissão de empregados. Quanto à Operação Stellio, o Banrisul permanece colaborando com as investigações e mantém integral interesse no esclarecimento dos fatos".
Em até 30 dias, a polícia deve indiciar os suspeitos por crimes como associação e organização criminosa, falsificação ideológica e de documentos, peculato, estelionato contra a administração pública, lavagem de dinheiro e corrupção, entre outros crimes correlatos. Há suspeita, ainda, de que o dinheiro fosse usado para outras atividades ilegais, mas a polícia não entra em detalhes para não atrapalhar as investigações, que seguem em andamento. O mesmo motivo é dado para a não divulgação dos nomes dos presos.
– Os principais lesados fomos nós, a população gaúcha, porque eles desviaram dinheiro público, dos nossos impostos – afirmou o chefe da Polícia Civil, Emerson Wendt. – Esperamos recuperar esses valores e, quem sabe, ajudar na crise financeira do Estado.