Thy Sovantha, a mais nova estrela política do Camboja, continua a todo vapor. Estudante carismática, ela ganhou fama durante as eleições de 2013, quando apoiou os esforços da oposição para derrubar o ditador do Camboja. Sua página no Facebook atraiu centenas de milhares de seguidores, tornando-a, aos 18 anos na época, talvez a voz mais poderosa de sua geração.
A oposição quase ganhou a eleição, mas protestos sobre a votação levaram à repressão por parte do governo. Em novembro, a batalha política havia chegado a um único impasse: o governo ameaçou prender o líder da oposição, Sam Rainsy, se pisasse no Camboja novamente. Ele, que estava em uma viagem ao exterior, prometeu voltar.
Thy Sovantha fez uma convocação no YouTube e reuniu centenas de seus apoiadores para encontrá-lo no aeroporto.
Porém, no último minuto, ele cancelou o voo e foi para a França.
– Fiquei muito brava. Eu o apoiei porque queremos mudanças. Se ele não voltar, como fez, a gente pensa: 'Como poderemos mudar os líderes? Como poderemos vencer? – diz Thy Sovantha.
A questão é um enigma no Camboja, que está preso mais ou menos no mesmo ciclo político há décadas.
Por 30 anos, o primeiro ministro Hun Sen, antigo guerreiro do khmer vermelho, exerce o poder por meio de uma combinação de ameaças, negociatas inteligentes e pura força de vontade. E, por quase todo esse tempo, Sam Rainsy, ex-ministro das finanças que estudou na França, é seu opositor. Alguns comentaristas comparam o par a Tom e Jerry.
Hun Sen tolera períodos de liberdade relativa e discordância política até certo ponto, mas recorre a golpes, repressão e processos judiciais quando surgem desafios sérios.
Sam Rainsy é hoje tão conhecido por fugir do país quando surgem ameaças legais quanto por sua pauta reformista. Seu mais recente retiro na França foi o terceiro em uma década.
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Para muitos cambojanos, a eleição de 2013 foi a maior oportunidade de quebrar esse ciclo. Jovens como Thy Sovantha tinham um papel importante nessa esperança, já que a mudança demográfica lhes deu uma voz mais forte do que nunca.
Dois terços da população têm menos de 30 anos, o que faz do Camboja uma das nações mais jovens da Ásia, de acordo com as estimativas das Nações Unidas. A primeira geração a crescer depois do fim dos horrores do regime do khmer vermelho e no momento em que a economia começou a crescer em um ritmo veloz, esses jovens são mais educados e céticos do que as gerações passadas. Cada vez mais, obtêm suas notícias on-line ao invés de usar a televisão tradicional e a mídia impressa, dominadas pelo partido do governo.
Politicamente, estão inquietos, depois de ter superado o estilo autoritário e o sistema de favoritismo de Hun Sen.
Mas depois de chegar tão perto de derrubá-lo e falhar, muitos andam desiludidos. E agora alguns começam a desistir de Sam Rainsy também.
– Eu me senti desapontada e sem esperança – conta Thy Sovantha, que hoje tem 20 anos.
A decisão dele de não retornar ao Camboja, segundo analistas, foi uma oportunidade perdida e uma surpresa.
– A maior ameaça para o poder de Hun Sen seria ter Sam Rainsy na cadeia. As condenações internacionais e a possibilidade de fechamento do mercado americano para a indústria de roupas seria desesperador para os empresários.– diz Ou Virak, fundador do instituto de pesquisa Future Forum.
O Partido do Povo Cambojano, que está no poder, adorou a fuga do opositor. "Falando de maneira simples, ele é um covarde" – disse um porta-voz ao The Cambodia Daily.
Mas mesmo seus apoiadores ficaram desapontados.
Ou Ritthy, de 28 anos, fundador de um grupo de discussão política de jovens, diz que ele e seus companheiros estão exasperados com o jogo de gato e rato da política cambojana.
– Muitas coisas que Hun Sen tem feito são pelo poder, pelos interesses do partido; e Sam Rainsy faz a mesma coisa. É uma política antiga em uma sociedade nova – afirma ele.
Ou Ritthy diz que o grande aumento da penetração da internet e do uso dos celulares causou uma mudança na dinâmica do país.
– Os jovens têm duas coisas: informação (eles se atualizam pelas redes sociais) e celulares. São mais independentes nesse aspecto. Seus pais não dizem mais o que devem fazer como no passado – reflete Ou Ritthy.
Depois que dois legisladores de oposição foram arrancados de seus carros e apanharam gravemente em outubro, os detetives do Facebook conseguiram identificar vários atacantes como membros das forças de segurança do governo.
Os dois partidos estão muito conscientes da mudança demográfica e tentam correr atrás do eleitorado em mutação.
Mesmo ausente, Sam Rainsy liderou conversas via Skype e compartilhou comentários políticos e imagens das férias com os fãs de sua página muito popular no Facebook. Suas fotos sem camisa pilotando uma embarcação em um resort de luxo nas Filipinas inspiraram debates acalorados sobre seu caráter.
Hun Sen entrou no Facebook em setembro com desejo de vingança. Ele gosta principalmente de publicar fotos sinceras de si mesmo – sentado no chão comendo macarrão em uma barraca de rua, envolto em uma roupa de hospital para fazer um checkup, molhando plantas em um jardim público e até fazendo selfies durante uma reunião de cúpula regional.
Sam Rainsy com certeza acredita que tem a demografia a seu favor porque os jovens do Camboja querem mudanças. Ele prometeu voltar para as próximas eleições em 2018.
– É a quarta vez que fui forçado a me exilar. Mas no fim, a cada vez, a situação muda, e eu sempre dou um jeito de voltar a tempo – contou ele por Skype de sua casa em Paris.
A questão para o Camboja é se seus seguidores estarão esperando. Thy Sovantha parece ter seguido em frente.
Ela contou a seus seguidores, que hoje são 1,2 milhão, sobre sua desilusão com Sam Rainsy. Suas mensagens no Facebook falam cada vez mais sobre educação e questões ambientais ao invés de política, e ela está focando sua energia para lançar um centro para jovens sem-teto.
Mas pode não ter desistido totalmente do sistema político. Em seu perfil no Facebook ela se descreve como “política”.