Professor aposentado da USP e um dos fundadores do PT e do PSOL, o sociólogo Francisco de Oliveira, 82 anos, autor de obras como A Economia Brasileira: Crítica à Razão Dualista (1972), questiona os rumos da sigla que comanda o governo federal, mas acredita na inocência do ex-presidente Lula. "Não há provas", diz.
No ano passado, o senhor disse que o país sairia da crise e que os panelaços iriam acabar. Como o senhor vê o momento atual, em que cresce a polarização política?
Não tem consistência, é tudo muito superficial. O ataque é a Lula, mas como a Dilma está na Presidência, ela sofre as consequências. O alvo é o Lula, todo mundo já percebeu isso. O problema maior é que ele está na defensiva, está aceitando as supostas acusações, e isso é ruim porque reforça a crítica da direita.
Mas ele se defendeu partindo para o ataque, dizendo que vai para a rua, vai subir o tom.
Isso é bravata. Lula não tem mais a capacidade de chamar ninguém para a rua. As coisas mudaram muito. A rua hoje para a política é bastante inofensiva. A capacidade das ruas já acabou.
Ao mesmo tempo tem esses movimentos pelo impeachment chamando para as ruas, e movimentos à esquerda prometendo enfrentamento.
Não vai dar em nada. Essa época desse tipo de movimento político já passou, não tem mais consistência. A gente vai ver no domingo, mas movimentos de massa hoje não se fazem nos mesmos termos de antes. É uma consequência do desenvolvimento do capitalismo, tudo fica muito tênue. O capitalismo dissolve essas tensões de outra forma.
Mas houve conflitos no dia em que o ex-presidente Lula foi conduzido coercitivamente.
Quantas pessoas tinham? São Bernardo é muito sensível a isso, mas não representa o estado de espírito mais amplo. Em São Paulo, só teve manifestação em Congonhas. São movimentos pontuais. Movimento de massa é bastante diferente.
Há crescente animosidade entre petistas e tucanos. Que efeitos esse discurso de ódio tem na sociedade?
O efeito é pequeno. Não acredito que esteja havendo ódio, uma coisa acirrada, radicalidade. Não vejo nem motivo para isso. Quero ver quem vai para rua no domingo. O pessoal vai passear, na verdade. A Paulista é agradável. Mas não vai lá com objetivo de brigar pelas suas ideias, suas posições.
E esse chamado de Lula, que criticou a Justiça e prometeu ir para as ruas?
Deu certo? Não deu. Lula sempre é uma figura, é um fulcro de contradições. Mas se ele tentar chamar para a rua vai ser um fiasco. Se fosse ele, não fazia isso, porque ninguém vai atender.
Os petistas dizem que a culpa é da direita, da mídia. Por que é tão difícil a autocrítica?
Isso é assim mesmo, ninguém assume os erros que comete na vida política. Não se espere que o PT faça a autocrítica, qualquer coisa desse tipo, porque isso enfraquece a sua posição.
Mesmo diante das evidências de corrupção?
Você acha que existe isso? A maior parte é invenção da contradição política. Não acredito que o Lula, com a experiência que tem, seja tão tolo para fazer o que dizem que ele faz. Não é verdade. Lula não é nenhum ladrão, para meter a mão no dinheiro público. Ele está aí na política há 50 anos.
E por que ele não apresenta elementos para sua defesa, preferindo culpabilizar os outros?
Porque é a forma mais fácil. É uma coisa muito primitiva fazer o que a Lava-Jato está dizendo que ele fez. Não há provas. Ele é paparicado. Evidentemente, as empresas não fazem isso pelos seus belos olhos. Mas não é tão primário como dizem, é mais complicado.
A presidente Dilma resiste?
Resiste. Precisa de 300 e tantos votos para fazer qualquer ação contra ela, isso não se consegue. O último grande confronto que chegou ao Congresso no nosso tempo foi o de Collor. Ser governo é muito bom, tem cargos. Ninguém vai sair do governo. A única quebra significativa seria o PMDB. Mas você acha que há espaço para a radicalização no PMDB? Quase impossível.
E como o senhor vê a esquerda hoje no Brasil?
Está sem rumo. Eu mesmo sou da esquerda e estou sem rumo.