Para o presidente da Associação Médica do Rio Grande do Sul (Amrigs), Alfredo Cantalice Neto, a conduta da pediatra que negou atendimento ao filho de uma vereadora suplente do PT na Capital foi desrespeitosa com a criança. Em entrevista ao Diário Gaúcho, Cantalice defendeu que o médico deve ser isento sem se importar com cor, religiosidade e inclinação política.
Diferentemente do presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Paulo de Argollo Mendes, que aprovou o comportamento da profissional, Alfredo classificou a atitude como um ato de "radicalização". Pediatra desde 1970 e professor do pediatria por 30 anos, Alfredo enfatiza que a médica Maria Dolores Bressan agiu errado e que a filiação política da mãe, Ariane Leitão, que também foi secretária de Políticas para as Mulheres do Rio Grande do Sul durante a gestão Tarso Genro, não era motivo para deixar de atender a criança, de um ano e um mês:
– Acredito que nessa situação faltou respeito da colega com o paciente.
Em 17 de março, um dia após a divulgação de áudios entre a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, a pediatra mandou uma mensagem por WhatsApp informando que não iria atender a criança devido a sua filiação partidária.
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Na mensagem, ela justifica: "Depois de todos os acontecimentos da semana e culminando com o de ontem, onde houve escárnio e deboche do Lula ao vivo e a cores, para todos verem (representante maior do teu partido), eu estou sem a mínima condição de ser Pediatra do teu filho". Procurada pela reportagem, Dolores prefere não se manifestar.
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O caso está sendo investigado por uma sindicância aberta pelo Conselho Regional de Medicina. Após ser notificada, a médica tem 15 dias para apresentar sua defesa. A seguir, entrevista com o presidente da Amrigs.
Diário Gaúcho - Qual é a posição da associação médica sobre a conduta da pediatra?
Alfredo Cantalice Neto - Eu fui professor por mais de 30 anos e sempre ensinei meus alunos que é fundamental o médico ter respeito com o paciente. O médico deve ser isento, não pode se importar com cor, religiosidade, inclinação política. Precisa respeitar a diversidade do paciente. Acredito que nessa situação faltou respeito da colega com o paciente. Acredito que o que aconteceu, pelo que li na imprensa, foi uma quebra do relacionamento entre o médico e a criança. Ela agiu erradamente. Não havia motivo para não atender. Se o paciente é de outro partido, isso não interfere na consulta. O médico deve querer é atender bem sempre e tentar curar sempre.
Diário - A pediatra não teria respeitado o paciente?
Cantalice - Exatamente. A nossa posição é essa. Temos que fazer o possível para diminuir as dores do paciente, resolver seu problema e tendo respeito por isso.
Diário - Ao saber da conduta da médica, o senhor ficou surpreso?
Cantalice - Me surpreendi. Porque isso não é motivo para negar atendimento. Ao menos pelo que eu li na imprensa, não é motivo real para não atender o paciente. Se formos levar para esse lado, o médico colorado não vai atender o paciente gremista. O princípio fundamental da medicina é que ela é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade.
Diário - Toda essa polêmica vai despertar alguma reflexão na classe médica?
Cantalice - Sim, acho que tem que ter uma reflexão, sim. Se a gente pegar o Código de Ética Médica tem alguns dispositivos, em alguns casos bem específicos, que o médico pode encaminhar o paciente a outro profissional por quebra de relacionamento. Mas de um modo geral, eu acho que ela agiu de maneira não correta.
Diário - É comum se abordar assuntos políticos nas consultas?
Cantalice - Não. E eu como pediatra atendo independente de partido, cor... Tento ver a doença e curá-la.
Diário - A pediatra teria motivos para se arrepender?
Cantalice - Acho que intimamente ela não deve estar de bem com ela. Pelo que a gente conhece, nossos pediatras gaúchos são excelentes, raros são os médicos que têm alguma distorção de atendimento.
Diário - Como a notícia repercutiu entre os seus colegas?
Cantalice - Ficamos surpresos com a conduta e não concordamos. É uma opinião pessoal minha, da entidade e dos meus colegas. Não concordamos com o procedimento dela. Acho que ela fez algo impensado.
Diário - Fica alguma lição desse episódio?
Cantalice - A lição é de reflexão na situação atual do Brasil, que é muito delicada e radicalizada. A não aceita o que o B fala e o B não aceita o que A fala. Isso está embutido dentro de várias situações. Isso foi uma radicalização dela.
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