Quem foi nessa terça-feira aos postos de saúde da Capital em busca de medicamentos não conseguiu retirar remédios, problema que pode se estender pelos próximos dias. Por determinação do Conselho Regional de Enfermagem (Coren), os enfermeiros da Secretaria Municipal de Saúde da Capital estão proibidos de dispensar remédios nas farmácias das unidades de saúde.
A decisão segue lei federal que proíbe qualquer outro profissional de saúde, que não um farmacêutico, de dispensar remédios a pacientes - ato que inclui a entrega dos medicamentos e orientações sobre uso e reações adversas.
Na prática, como não há profissionais para todas as 141 unidades de Porto Alegre, os postos de saúde não podem mais entregar medicamentos para a população. A alternativa é ir até as dez farmácias distritais. Uma reunião marcada para esta quarta-feira, entre representantes da Secretaria Municipal de Saúde e dos conselhos regionais de Farmácia e Enfermagem, vai debater o assunto.
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A população que mora nos extremos da Capital é uma das mais atingidas pela mudança. Moradores do Chapéu do Sol, na Zona Sul da Capital, não conseguiram retirar medicamentos na unidade local. Com virose, o porteiro Gabriel Avragon, 19 anos, consultou na tarde de ontem e precisou ir até a farmácia distrital da Restinga. Para fazer o trajeto, é preciso pegar dois ônibus e contar com a sorte do medicamento estar disponível no local:
- Antes, já tínhamos dificuldade de conseguir medicamentos pela falta no estoque. Agora, mesmo se houver (remédios), não vão nos dar, por causa dessa decisão - reclama dona Geni Pinto Machado, 82 anos, que precisa de remédios para controlar a pressão.
Sem conseguir retirar três tipos de remédios para o coração, o frentista José Carlos Silveira Vieira, 58 anos, defende que a comunidade precisa se unir para pedir um farmacêutico para o posto.
- Estamos a 26km do Centro. Para garantir remédio, teria que ir até o posto Modelo (Centro de Saúde Modelo, localizado na Avenida João Pessoa), onde a medicação é garantida - afirma José.
A decisão vale até para medicamentos de uso contínuo, pois não há brechas da lei que tratem especificamente disso. O autônomo Claudio Lopes, 39 anos, precisa de quatro medicamentos para ansiedade que utiliza há sete anos e também, na tarde de ontem, não conseguiu retirá-los na UBS do Chapéu do Sol.
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Prefeitura aposta em adaptação gradual
A Secretaria Municipal de Saúde possui 64 farmacêuticos lotados em diferentes áreas como Gerência de Regulação de Serviços, laboratórios de análises clínicas e hospitais. Onze atuam nas dez farmácias distritais. Mesmo que todos os 64 fossem lotados aos postos, não seriam suficiente para atender as 141 unidades.
O secretário Fernando Ritter aposta em uma adaptação gradual dos postos e garante que irá negociar com os conselhos de Farmácia e de Enfermagem. Ele informa que foram chamados 20 farmacêuticos aprovados em concurso que se somarão à equipe. A prefeitura também estuda possibilidades de suspender judicialmente a medida do Coren para que a população possa continuar retirando os remédios nos postos.
A necessidade legal de que haja um farmacêutico em cada unidade de saúde com dispensação de remédio não acompanhou a expansão do número de postos na Capital, lembra o presidente do Conselho Regional de Farmácia (CRF), Maurício Schuler Nin. Ele reforça que o tema é discutido desde 2013 com a Secretaria Municipal da Saúde. Para resolver o problema, ele sugere aumentar o número de farmácias distritais ou formar de técnicos em Farmácia, ligados ao Conselho, que poderiam estar presentes nos postos.
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Enfermeiros temem erro
O presidente do Coren, Daniel Menezes de Souza, lembra que a decisão do conselho está baseada em uma lei federal de 1973 e em um parecer nacional do Conselho Federal de Enfermagem, que reforça o cumprimento da regra. A determinação, segundo Daniel, tem jurisprudência para todo o Rio Grande do Sul:
- O profissional tem o direito de não fazer atividades para as quais não tem competência e habilidade. A população também fica exposta a vários riscos.
Muitos profissionais queixam-se de se sentirem inseguros para dispensar a medicação. Também cabe apenas ao farmacêutico cuidar do armazenamento, ter controle do estoque e da validade dos medicamentos. Atualmente, estas atividades são feitas por enfermeiros nas unidades de saúde.
- O enfermeiro pode ser processado criminalmente por exercício ilegal da profissão. A legislação coloca como uma alternativa, em razão do interesse público e na falta do farmacêutico, que um profissional técnico, regulado pelo Conselho Regional de Farmácia, pode auxiliar no atendimento - avalia Daniel.
O medo de errar é o que mais atormenta uma enfermeira de um posto de saúde da Zona Norte de Porto Alegre. Ela prefere não se identificar. A profissional ressalta que não é apenas "entregar a medicação", é preciso também avaliar a cor do medicamento e cuidar do armazenamento:
- Em postos de saúde não circula farmacêutico nenhum. Já aconteceu de técnico e auxiliar entregarem medicação errada. São problemas que podem acontecer. Se entregarmos agora, depois dessa decisão, estamos sujeitos a sofrer penalidades.
Um enfermeiro também deixa de fazer uma ação em saúde ou dar uma orientação que é da sua competência enquanto entrega a medicação, lembra ela.
Farmácias distritais
Enquanto não ocorre uma decisão sobre o assunto, é preciso retirar os medicamentos em uma das dez farmácias distritais da Capital.
Sarandi: Rua Baltazar de Oliveira Garcia, 744
Restinga: Avenida Macedônia, 750
Bom Jesus: Rua Bom Jesus, 410
IAPI: Rua 3 de abril, 90
Centro de Saúde Modelo: Rua Jerônimo de Ornelas, 55
Murialdo: Avenida Bento Gonçalves, 3.722
Navegantes: Avenida Presidente Roosevelt, 5
Santa Marta: Rua Capitão Montanha, 27
Vila dos Comerciários: Rua Moab Caldas, 400
Camaquã: Rua Pitta Pinheiro Filho, 176
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Porto Alegre
Decisão proíbe enfermeiros de entregarem medicamentos e população fica sem remédios nos postos de saúde
Alternativa é retirar os medicamentos em uma das dez farmácias distritais da Capital
Jeniffer Gularte
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