Um dos maiores escândalos da política gaúcha, o caso Rodin, está próximo de ter um novo capítulo. Ainda em 2007, o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal (PF) evidenciaram a existência de um esquema de desvio milionário do Detran.
Agora, o processo principal, que contabiliza 29 réus condenados em primeiro grau e penas que variam de dois a 38 anos de prisão, já tem data para ser julgado em segunda instância, em Porto Alegre. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) marcou para o dia 15 deste mês a análise da ação.
Três desembargadores da 7ª Turma do TRF4 julgarão as apelações dos réus condenados na Justiça Federal de Santa Maria, no processo que teve a sua primeira sentença expedida, em 2014, pelo juiz Loraci Flores de Lima.
Além disso, há outro componente em pauta: a decisão do STF, no mês passado, que prevê a possibilidade de um réu, condenado em segunda instância, começar a cumprir pena de prisão, mesmo que esteja recorrendo a tribunais superiores. Até então, réus recorriam em liberdade.
Essa situação assombra a defesa e, claro, os réus, que temem uma possível prisão., caso as condenações sejam mantidas. Os advogados que já foram intimados trabalham para montar suas estratégias na tentativa de evitar o pior cenário aos seus clientes (leia abaixo).
Dos 29 condenados na ação criminal, 23 contabilizam penas em regime inicialmente fechado, cinco, em regime semiaberto, e apenas um em regime aberto.
No entanto, o TRF4 tem decidido que uma eventual prisão só é cabível após julgamento dos chamados embargos declaratórios (quando há omissão ou contradição no acórdão, que é a decisão final) ou infringentes (quando a decisão ocorre por maioria). O Tribunal afirmou que há agilidade na apreciação de eventuais recursos.
Mas, não faz projeções de um tempo médio para a análise, caso os advogados usem esse recurso. Apenas com a manutenção da condenação em segunda instância é que então pode-se expedir o mandado de prisão dos condenados.
Teia de relações
A Operação Rodin evidenciou a existência de um aparato criminoso que teria lesado o Detran/RS em R$ 90 milhões, em valores atualizados. A engrenagem do esquema se daria com a distribuição de propina a agentes políticos e funcionários públicos, além do uso de fundações ligadas à UFSM - Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência (Fatec) e Fundação Educacional e Cultural para o Desenvolvimento e o Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura (Fundae) - com a atuação de sistemistas, empresas contratadas ilegalmente para prestar serviços que deveriam ser executados pelas fundações.
O que dizem os advogados dos réus
Confira abaixo o que alegam os advogados de sete dos 29 réus. O "Diário" não conseguiu contato com os outros réus que serão julgados no dia 15 de março.
"Agora resta conhecer a decisão dos desembargadores, as razões de apelação já foram apresentadas e, desde então, a única novidade é que pedimos que o Tribunal estabeleça um rito especial para o julgamento. Em processos grandes, como o do Mensalão e como é a Rodin, costuma ser feito isso, para que haja uma ordem na manifestação das defesas dos réus. Até para os julgadores saberem de qual crime e réu se trata em cada momento, mas ainda não há uma resposta do TRF4. Meu cliente tem convicção da absolvição, então não é uma preocupação a possibilidade de que, ao ser condenado, o professor Sarkis seja preso".
Fabio Fayet, advogado de Paulo Jorge Sarkis
"Fomos notificados pelo sistema. Fizemos um pedido para que o tribunal divulgue a ordem das manifestações orais no dia do julgamento, se será tudo no mesmo dia, ou não. Só a sentença tem 1,2 mil páginas, (o processo) é muito longo. Para a explanação oral vamos centrar nos pontos mais importantes, a apelação teve 250 páginas. Então vamos ter de centrar em alguns aspectos processuais e probatórios. Esperamos o bom senso por parte dos desembargadores para preservar a presunção de inocência dos réus. É um processo que envolve questões complexas, que precisam ser debatidas em tribunais superiores".
Bruno Seligman de Menezes, advogado da família Fernandes e de Luciana Balconi Carneiro)
"Fui notificado ontem e já pedi que seja definido um cronograma para o julgamento, que pode até ser estendido por mais dois ou três dias. Com a absolvição de Renan Hademacker hoje (ontem), na segunda instância, amanhã (hoje) já vou pedir para anexar documentos à apelação de defesa do Pellegrini, e devo solicitar a cisão do processo ou que ele seja julgado em separado, para que haja tempo de os desembargadores analisarem as novas provas. Não tenho receio do julgamento do dia 15. (Sobre possível prisão no segundo grau) Pode acontecer, apesar de ser uma hipótese não vinculativa. Ainda que aconteça, a desembargadora deve deixar essa decisão para após o esgotamento do julgamento em segundo grau, após os embargos infringentes".
Mário Cipriani, advogado de Luiz Carlos de Pellegrini
"Fomos intimados ontem (segunda-feira) e esperamos que seja um julgamento técnico. Explicamos todas as possibilidades para o cliente (sobre a prisão em segunda instância) e fizemos o mesmo pedido (de ordem no julgamento)"
Vagner Sobierai, advogado de Rubem Höher
Respostas, nulidades e os possíveis cenários
Para o advogado e consultor Antônio Augusto Mayer dos Santos, a mudança de entendimento da mais alta corte do país traz uma complexa e profunda mudança de paradigma no que diz respeito a um eventual cumprimento de pena. Ele lembra que, até 2009, o STF entendia que o condenado poderia continuar livre até que se esgotassem todos os recursos possíveis no Judiciário. Ainda no mesmo ano, o Supremo decidiu que a prisão só era definitiva após o chamado "trânsito em julgado" do processo, por respeito ao princípio da presunção de inocência. Agora, contudo, as coisas mudaram:
- Se, de fato, for aplicada a decisão do STF, ela determinará a prisão daqueles que tiverem as decisões condenatórias mantidas. Essa decisão (do Supremo) traz mais efetividade às punições. Para a sociedade, a opinião é que os colarinhos-branco irão para a cadeia.
Por outro lado, Mayer pondera e chama a atenção para eventuais nulidades que podem impactar no processo:
- É preciso observar o outro lado. Até porque há muitas decisões que acabam sendo reformuladas, em instâncias como o próprio STF e no STJ (Superior Tribunal de Justiça). E é claro que, no meio do caminho, na marcha processual, pode-se ter a ocorrência de situações que configurem como nulidades.
Do lado da defesa, a estratégia está em pedir ao TRF4 a apresentação de um cronograma de como será o dia do julgamento. Outra estratégia é, por exemplo, pedir que o julgamento não se dê em apenas um dia e, assim, transcorra em mais dias, o que daria maior margem de prazo às defesas.
A procuradora do MPF Bruna Pfafenzeller limitou-se, ontem, a dizer que aguardará o julgamento para, então, verificar as possibilidades de recurso.
Os cenários
A reportagem falou com advogados e juristas aposentados que apontaram para três cenários ao fim do julgamento. São eles: a condenação de todos (com a possibilidade, até mesmo, de haver a revisão das penas), a absolvição de alguns e, inclusive, a absolvição de todos.
Com um volume de 200 mil páginas, o caso Rodin é considerado o maior processo da Justiça Federal gaúcha e, ao longo dos anos, o histórico do processo rendeu comparações com o Mensalão.
Placar das ações na Justiça Federal de Santa Maria:
- Há uma ação penal ainda em curso, que está em fase final, contra o ex-presidente do TCE João Luiz Vargas. Ele foi interrogado, ainda em 2015, em Santa Maria. As alegações finais, tanto da defesa dele quanto do MPF, já foram apresentadas. O processo está concluso para sentença desde 10 de fevereiro. Contudo, ainda não há prazo para julgamento
- Também há mais três ações de improbidade administrativa. Uma do MPF contra o chamado Núcleo Político, integrado por José Otavio Germano, Luiz Fernando Zachia, João Luiz Vargas, Frederico Antunes, entre outros. No ano passado, o juiz federal initmou a UFSM para se manifestar nos autos do processo. Já houve manifestação da UFSM, que afirmou ter interesse em participar do processo. Uma decisão do juiz Loraci Flores de Lima manteve a UFSM na ação, como parte interessada. Próximo passo é a publicação da sentença
- A outra ação de improbidade, também do MPF, de 2008, é contra 52 réus, sendo 41 pessoas físicas e 11 empresas. No momento, ainda trabalha-se na conclusão da transcrição dos depoimentos de algumas testemunhas (requeridas da parte dos réus)
- Por fim, a outra ação é da PGE, também de 2008, que tramita junto com a do MPF. Ao todo, são 10 acusados: duas pessoas e oito empresas. A exemplo da outra ação do MPF, aguarda-se a transcrição dos depoimentos de algumas testemunhas (da parte dos réus)
Acesse abaixo um material especial sobre os oito anos da Operação Rodin: