Nono colocado no ranking de aeroportos brasileiros por movimentação, o Salgado Filho deverá ter a gestão entregue à iniciativa privada a partir de janeiro de 2017, com previsão de receber investimento de R$ 1,7 bilhão e a obra de ampliação da pista, fundamental para a geração de negócios no Estado. Essa é a previsão da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, que entregou ao Tribunal de Contas da União (TCU) o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental, etapa que precede a publicação do edital que fará o chamamento de leilão para conceder o Salgado Filho.
O calendário indica a assinatura de contrato entre o governo federal e o investidor em setembro de 2016. O desfecho deverá encerrar as discussões, reviravoltas e polêmicas sobre o principal aeroporto gaúcho. Ficará descartada, ao menos nos próximos anos, a construção de um terminal novo, batizado 20 de Setembro, entre Nova Santa Rita e Portão, opção que chegou a ser prioridade da União.
A concessão terá validade de 25 anos, entre 2017 e 2041, com os investimentos divididos em três etapas. O maior volume de recursos será aplicado na primeira dessas fases, ao longo de nove anos, com destinação de R$ 1,1 bilhão à ampliação da pista de pouso e decolagem para 3,2 mil metros e construção de novo terminal de cargas, pátio de aeronaves e edifício-garagem de sete andares.
Apenas uma empresa apresenta estudos para concessão do Salgado Filho
Quando assumir a gestão, o concessionário obterá receita a partir de sete modalidades de tarifas relacionadas às operações aeroportuárias e também de negócios e serviços. Os estudos do governo estimam que a receita bruta do concessionário, ao final dos 25 anos, atingirá R$ 12,1 bilhões. Será responsabilidade do gestor privado arcar com todos os custos de operação e manutenção do Salgado Filho, que deverão somar R$ 4,8 bilhões.
O leilão também ajudará o governo federal a se capitalizar em momento de crise financeira. Quem arrematar o terminal terá de pagar outorga à União - no total, R$ 1,2 bilhão no período de vigência de contrato. Uma parcela de cerca de R$ 166 milhões deverá ser quitada já na assinatura do contrato, como adiantamento.
Diretor-executivo da Agenda 2020, Ronald Krummenauer avalia que o leilão é atrativo.
- Com o Salgado Filho se tornando um aeroporto de negócios e de passageiros, tendo a concessão de 25 anos, é bastante viável. Ninguém faz um investimento desse tamanho sem ter um contrato de longo prazo - explica.
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Advogado especializado em contratos e projetos e professor de Direito Econômico da Unisinos, Luciano Timm é mais cauteloso. Ressalta que as construtoras gaúchas, em maioria, estão em dificuldades financeiras ou recuperação judicial. As nacionais estão implicadas na Operação Lava-Jato, sem recursos e com empecilhos para a tomada de crédito nos bancos.
- Em cenário de dificuldades no Brasil e de crescimento em outros países, o investidor, em princípio, vai para esses outros lugares. Empresários estão mais interessados em México, Chile, Colômbia e Peru - lista Timm.
O professor da Unisinos ainda avalia que a taxa de retorno - que indica o lucro do concessionário - poderá não ser atraente a ponto de fazer grandes corporações internacionais investirem no Brasil. No estudo da Secretaria de Aviação Civil, são citadas duas taxas internas de retorno (TIR): uma de 8,5% e outra de 12,32%.
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Os dados indicam que o terminal de Porto Alegre movimenta hoje 8,4 milhões de passageiros por ano. A projeção é de que, em 2041, serão 22 milhões. O relatório aponta que a movimentação de carga irá evoluir de 33 mil toneladas, em 2015, para 71 mil toneladas em 2041, ao final da concessão. Esse salto de mais de 100% será fruto da ampliação da pista. Hoje, o Salgado Filho desperdiça negócios por não ter capacidade para receber determinadas aeronaves de grande porte. Do ponto de vista econômico, analisa Krummenauer, será um avanço:
- O Rio Grande do Sul perde R$ 3,3 bilhões em negócios ao ano no Salgado Filho por não ter terminal de cargas e pista ampliada. São recursos que acabam indo para Viracopos (Campinas) e Guarulhos. Pelo menos 10% ou 15% desses R$ 3,3 bilhões vão virar imposto, algo como R$ 500 milhões. Hoje, quem recebe isso é São Paulo.
Entrevista
Rogério Coimbra, secretário de Política Regulatória de Aviação Civil, responsável pelas concessões na Secretaria de Aviação Civil
"Há bastante interesse"
Por que a concessão do Salgado Filho é de 25 anos e a dos outros três aeroportos deste pacote é de 30 anos?
O sítio atual do Salgado Filho não comporta uma segunda pista. Dependendo do ritmo de crescimento da demanda, ele poderá atingir o limite de capacidade e, no futuro, será necessário outro aeroporto. Fizemos em 25 anos porque isso garante a amortização dos investimentos, mas o principal é porque, se esse aeroporto se esgotar com uma pista, facilita uma concessão nova, que poderá prever a obrigatoriedade de o novo concessionário construir outro aeroporto.
Com a crise econômica persistindo, haverá interessados?
Estamos vendo bastante interesse dos investidores, tanto nacionais quanto internacionais. Este ano não foi de crescimento, 2016 tende a não ser também, mas são projetos de longo prazo, e o setor aéreo tem crescido muito, é um mercado com potencial. Para o investidor estrangeiro, com a questão do dólar alto, ficou mais barato investir no Brasil em reais.
Os grandes investidores brasileiros foram afetados por operações como a Lava-Jato. Poderá ser uma oportunidade maior para grupos internacionais?
É possível. Não tem restrição formal para as empresas citadas na Lava-Jato participarem. Só empresa declarada inidônea está proibida de contratar. O que se vislumbra é que elas possam estar com menos liquidez e menos apetite. Abre, sim, espaço para os investidores estrangeiros e também para as construtoras nacionais menores.
Para o usuário, a concessão poderá causar aumento de preços, desde as refeições em aeroportos até taxas ou passagens?
As receitas tarifárias são reguladas e não podem aumentar. Nisso entra a tarifa de embarque e de pouso, entre outras. A outra parte da receita é a comercial. Essas não são reguladas, mas não percebemos em nenhum dos seis aeroportos já concedidos esse tipo de aumento. Pelo contrário. A Infraero precisa licitar áreas nos aeroportos, e ganha quem oferece o aluguel maior. Aí encarece para cobrir a despesa. Já o concessionário pode escolher. Ele cobra percentual do faturamento, e não aluguel.
Calendário da concessão do aeroporto Salgado Filho
- O Tribunal de Contas da União está avaliando o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental.
- Depois da análise do órgão, a Secretaria da Aviação Civil terá de fazer audiência pública.
- A intenção é lançar o edital na segunda quinzena de abril.
- Entre o final de maio e o início de junho, deverá ocorrer o leilão.
- O contrato entre a União e o concessionário será assinado em setembro de 2016.
- Em novembro e dezembro de 2016, o investidor toma posse parcial do aeroporto. Em período de adaptação, irá acompanhar as operações cotidianas da Infraero.
- Entre janeiro e março de 2017, a concessionária toma posse efetiva do Salgado Filho, mas ainda com assistência operacional da Infraero.
- Em abril de 2017, a empresa assume plenamente a gestão do terminal.
- Em setembro de 2041, mês 300, será encerrado o contrato de concessão.
Os investimentos
- O concessionário terá de investir R$ 1,7 bilhão em obras e melhorias no Salgado Filho. Os aportes foram divididos em três fases.
- Fase 1, de 2017 a 2025, com investimento de R$ 1,148 bilhão: ampliação da pista de pouso e decolagem para 3,2 mil metros e construção de novo terminal de cargas, pátio de aeronaves e edifício-garagem de sete pavimentos.
- Fase 2, de 2026 a 2032, com investimento de R$ 297 milhões: ampliação do pátio de aeronaves de passageiros e cargas, nova pista de táxi e outro edifício-garagem.
- Fase 3, de 2033 a 2041, com investimento de R$ 344 milhões: ampliação dos pátios de aeronaves de passageiros e de cargas e edifício-garagem.
Movimento
- Hoje, o Salgado Filho é o nono colocado no ranking de aeroportos brasileiros pela movimentação. São 8,4 milhões de passageiros ao ano. Em 2041, serão 22 milhões.
- Em 2041, o terminal deverá ter 92,7% dos seus passageiros originários de voos domésticos. Os outros 7,3% serão de voos internacionais.
Detalhes
- Na estrutura do negócio, o investidor terá de ter parcela de 30% de capital próprio. Uma parte do montante a ser investido poderá ser tomado via empréstimo no BNDES.
- Para assumir o aeroporto, o investidor terá de pagar R$ 1,2 bilhão à União como outorga.
- As receitas do gestor do aeroporto são divididas entre "tarifárias" e "não tarifárias".
- As tarifárias são as taxas cobradas das companhias aéreas por embarque, pouso, conexão, permanência e carga, entre outras.
- As não tarifárias advêm de aluguéis, comercialização de alimentos, bebidas e artigos variados, estacionamento e publicidade, entre outros.
- A estimativa é de que, ao longo dos 25 anos de concessão, a receita bruta total do concessionário seja de R$ 12,1 bilhões.
- O investidor terá de arcar com todos os custos do aeroporto. A estimativa é de que, até 2041, isso represente um montante de R$ 4,8 bilhões. Esse valor não contabiliza a outorga, o Imposto de Renda e os investimentos.
Pacote federal
- Além de Porto Alegre, o novo pacote de concessões do governo federal também pretende repassar à iniciativa privada os terminais Hercílio Luz, em Florianópolis, Pinto Martins, em Fortaleza, e Deputado Luís Eduardo Magalhães, em Salvador. Eles deverão receber, respectivamente, investimentos de R$ 918 milhões, R$ 1,8 bilhão e R$ 2,8 bilhões.
- Até agora, o governo federal já concedeu seis aeroportos à iniciativa privada:
São Gonçalo do Amarante, em Natal (RN)
Presidente Juscelino Kubitschek, em Brasília (DF)
André Franco Montoro, em Guarulhos (SP)
Viracopos, em Campinas (SP)
Galeão, no Rio de Janeiro (RJ)
Confins, em Belo Horizonte (MG)