Águas do rio removeram o fino de carvão, mas especialistas acreditam que ainda pode haver sedimentos em alguns trechos
Por volta das 20h do dia 25 de novembro de 2014, o rompimento de uma barragem de rejeitos do beneficiamento de carvão da Mina Bonito I, em Lauro Muller, provocou o despejo de água com resíduos de carvão no rio Rocinha, afluente do rio Tubarão. A quantidade que vazou não foi detalhada pela empresa Carbonífera Catarinense ou órgãos ambientais, mas foi suficiente para deixar o manancial completamente negro. De acordo com a empresa, os trabalhos para estancar o vazamento entraram madrugada adentro e depois foram necessários 10 dias para fazer a limpeza da substância que ficou na encosta até o ponto de encontro com o rio. Um ano depois, nenhuma ação prática foi efetivada para recuperação ambiental da região e o órgão federal fiscalizador de mineração não emitiu sequer uma multa.
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Após processo movido pelo Ministério Público Federal (MPF), um acordo na Justiça estipulou multa de R$ 504 mil para a empresa e outros R$ 28 mil para funcionários, além de medidas ambientais, a ser paga a partir de 2016. A medida é o mais próximo de uma punição a que os responsáveis foram submetidos desde o vazamento. Se a tragédia catarinense é muito menor do que o recente rompimento de barragem em Mariana (MG), as consequências posteriores guardam algumas semelhanças, como a falta de ação prática do poder público para inibir ou cobrar recuperação ambiental imediata de empresas do setor.
– O vazamento foi de grandes proporções, em níveis tais que resultou na mortandade de animais e em potenciais danos à saúde humana, inclusive com ameaça de interrupção de abastecimento de água potável na cidade de Tubarão - escreveu Darlan Airton Dias, procurador em Criciúma e coordenador do Grupo de Trabalho nacional sobre mineração do MPF, na ação proposta na Justiça contra a empresa.
O departamento de geologia do MPF informa que ainda pode haver sedimentos de fino de carvão no fundo do rio, principalmente em pontos onde a correnteza é fraca. Seria preciso uma varredura em toda extensão para procurar resquícios do mineral. Por enquanto, sem qualquer ação de recuperação efetiva, o rio só aparenta estar limpo por causa da sua própria capacidade de regeneração.
O resultado do processo foi um acordo assinado entre a Carbonífera Catarinense e o MPF, no dia 9 de novembro. Além de multa, a empresa se comprometeu a alterar processos produtivos e, até 2018, desativar e recuperar as três bacias utilizadas para limpeza da água na mina. No entanto, a última medida já estava prevista em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) anterior com o MPF, mas não foi cumprido pela carbonífera. Responsável pelo sistema de gestão ambiental da empresa, Paulo Felipe de Mello explica os procedimentos adotados pela empresa após o acidente:
– Houve um trabalho intenso nas primeiras horas para interromper o vazamento e posteriormente para limpar o rastro de lodo que ficou na vegetação próxima à empresa. É importante ressaltar que o material que foi parar no rio não foi o fino de carvão puro, mas uma água que já tinha passado por algumas etapas de filtragem.
Legislação branda e atraso na recuperação ambiental
Após análises feitas por técnicos da Fundação do Meio Ambiente (Fatma) no local, que constataram o impacto ambiental na margem e na água dos rios Rocinha e Tubarão, o órgão aplicou uma multa de R$ 900 mil, além do embargo na operação da mina Bonito I, que produz cerca de 100 mil toneladas de carvão mineral por mês, a maior parte para produção energética. Dois meses depois, a empresa voltou a operar e assinou um termo de compromisso com a Fatma, se comprometendo a recuperar uma área de 2.500 m² na margem esquerda do rio Rocinha, e assim reduzir a multa para R$ 90 mil. A medida está prevista no Código Ambiental do Estado, de 2009.
Para obter o benefício, a empresa ainda precisa apresentar um Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) e só após a ação ambiental terá que pagar a multa reduzida. O plano foi protocolado na Fatma no dia feito no dia 3 de março deste ano. No entanto, o órgão ambiental ainda não analisou o projeto. O presidente da Fatma, Alexandre Waltrick Rates, justifica o atraso devido ao número elevado de processos para os técnicos avaliarem e critica lei ambiental atual:
– Temos que fazer uma ampla reforma na gestão ambiental. Os técnicos têm mais de 3 mil processos para analisar e isso tem repercussão inclusive na fiscalização. Os servidores da Fatma passam mais tempo licenciando do que fiscalizando. Isso ocorre em todo o Brasil. Espero que o acidente de Mariana (MG) sirva para o país repensar o modelo de gestão do meio ambiente.
No Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão federal que fiscaliza a atividade mineradora, não há registro de multa para a empresa devido ao acidente que provocou vazamento de resíduo de carvão para o rio catarinense. Além disso, ao contrário do que foi informado ao DC pela superintendência do DNPM em Santa Catarina, a Carbonífera Catarinense afirma que não possui Plano de Segurança de Barragem (PSB), uma exigência legal. Em nota, o departamento federal respondeu que a empresa foi autuada por não ter o plano e que apresentou defesa, que está sob análise.
O que cada órgão fez em um ano
FATMA: órgão estadual responsável pelas licenças ambientais
Novembro/14 - Fatma aplica multa de R$ 900 mil e interrompe atividade da empresa
Janeiro/15 - Carbonífera volta a operar e assina Termo de Compromisso (TC) com a Fatma, utilizando brecha no Código Ambiental Estadual, que permite redução da multa em até 90% após acordo de recuperação
Março/15 - Empresa entrega Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) para avaliação do órgão ambiental. Documento ainda não foi avaliado pela Fatma. Segundo a presidência da Fatma, a multa só é paga após a recuperação ambiental ser realizada e aprovada por técnicos do órgão ambiental
MPF: órgão de defesa dos direitos do cidadão perante a Justiça
Novembro/14 - Um processo investigatório é aberto pelo MPF para acompanhar o acidente
Setembro/15 - Procurador Darlan Airton Dias apresenta processo judicial contra a empresa
Novembro/15 - Carbonífera Catarinense faz um acordo com o MPF, aceitando multas de R$ 504 mil para a empresa e outros R$ 28 mil para funcionários. O valor será pago em 36 parcelas mensais, que começam a ser cobradas a partir de 25 de janeiro de 2016. Além disso, empresa se compromete a fazer alterações na estrutura interna, adquirindo novos equipamentos e desativando a barragem onde ocorreu o acidente
DNPM: órgão federal fiscalizador da atividade mineradora
Não há registro de aplicação de multa ou qualquer tipo de sanção à empresa