Após a confissão de Curió, a Justiça Federal de Brasília determinou novas buscas para tentar achar os corpos de Cilon e de outros guerrilheiros, porém segue atrás de mais detalhes sobre a provável localização. Uma agenda com anotações de Curió, que o militar entregou a um jornalista, deve ser pedida pela Justiça. Mas não se sabe se nessa agenda existem mais pistas do local onde os corpos teriam sido ocultados. Há relatos de que, após as execuções, os corpos eram queimados para dificultar a identificação.
Segundo Marx, as expedições devem ser retomadas em 2016, pois devido ao período de chuvas, só é possível fazer escavações no Araguaia de maio a outubro. O procurador não diz o que fará em relação à confissão de Curió, mas é provável que o major da reserva seja processado criminalmente pelas mortes.
- Enquanto houver um corpo insepulto, o Estado terá essa dívida. Acho que o processo tem de ser aberto, pois todos têm de pagar por seus atos criminosos. Execução é um crime imprescritível - diz o jornalista Lino Brum Filho, 72 anos, um dos sete irmãos de Cilon.
Em 1996, o governo federal reconheceu que os desaparecidos estavam mortos e indenizou parentes. Só então a família colocou esta lápide no túmulo, que segue vazio
Cilon (codinome Simão) ao lado da mãe Lóia (esq) e da madrinha Elza
Nascido em 1946, em São Sepé, Cilon Cunha Brum foi morar em Porto Alegre aos 17 anos. Na Capital, trabalhou em uma agência de propaganda, que o convidou para se transferir para uma filial em São Paulo. Além de trabalhar na capital paulista, Cilon começa a estudar Economia na PUC-SP e, em 1970, decidiu largar o emprego para se dedicar à militância no PC do B. Era um dos períodos mais violentos da ditadura, e o partido era monitorado pelas forças de repressão, tendo vários integrantes torturados. Segundo o irmão, Lino, na época, a família ficou sabendo que Cilon era um doutrinador do partido, que tentava cooptar mais universitários para a sigla.
- A última vez que ele viu a família foi em 9 de junho de 1971, quando veio a Porto Alegre para batizar a minha filha Liniane. Ele foi embora e, dois meses depois, enviou bilhete dizendo só "vou viajar para fora, depois mandarei notícias", mas nunca mais voltou nem deu notícia - conta Lino.
Desesperada, a família fez tudo o que foi possível para descobrir o paradeiro de Cilon. De 71 a 79, procurava os órgãos de segurança pedindo informações sobre Cilon e só obtinham uma resposta: "Nada consta." Com terceiros, só obteve pistas.
- Só então, em 1979, é que a OAB do Rio divulgou uma lista de desaparecidos e mortos na ditadura. Constava o nome Cilon da Costa Brum, citando que era gaúcho e que desapareceu no Araguaia. Eles erravam na grafia, mas a gente teve certeza de que se tratava dele - diz Lino.
O irmão conta que Cilon sabia dos riscos que estava correndo. Nessa última visita à família, o próprio Lino o alertou que seria arriscado e tentou demovê-lo da ideia de seguir atuando na militância, em função do momento conturbado da ditadura.
- Ele sabia que estava correndo riscos e disse que se fosse morrer assim, morreria feliz. Se ele estava lá, lutando por uma sociedade mais justa e igualitária, acho que ele estava feliz.
Tanto o pai quanto a mãe de Cilon morreram sem ter certeza do paradeiro do filho. Seu Lino faleceu em 1976, e dona Lóia foi descansar ao lado do marido em 1989. No jazigo da família, em São Sepé, traz a inscrição: "Esta sepultura aguarda o corpo de Cilon Cunha Brum".
- Nos últimos anos de vida, todos os dias, a mãe pedia para sentar na porta e dizia: "Acho que hoje meu filho vem" - diz Lino.
Lino e a filha Liniane, que escreveram um livro sobre o padrinho, foram ao Araguaia, a partir de 2009, e conversaram com moradores que conviveram com Simão (Cilon). Nessas andanças, eles descobriram que Simão havia sido capturado e, como prisioneiro, trabalhou por um tempo na base militar no Araguaia:
- Uma moradora nos contou que conviveu com o Cilon, mas que, num dia, os militares chegaram de helicóptero, desceram e levaram Cilon e outro guerrilheiro ao mato e voltaram sem eles.
Sombras da ditadura
Irmão de Cilon Cunha Brum ainda tem esperança de achar corpo de guerrilheiro morto em 1974
Agora, major Curió confessou ter matado guerrilheiro sepeense durante a Guerrilha do Araguaia
Deni Zolin
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