Eduardo Cunha (PMDB-RJ) reafirmou nesta sexta-feira não ser dono de contas no Exterior. Em entrevista ao Jornal da Globo, o presidente da Câmara dos Deputados disse que as contas atribuídas a ele são de propriedade de um truste (entidade legal que recebe outorga para administrar propriedades e bens em nome de um ou mais beneficiários), que administra recursos "de origem antiga", acumulados pelo político na década de 1980. Ele seria apenas o "contratante e beneficiário em vida".
Essa deve ser a base da defesa de Cunha no processo a que ele responde no Conselho de Ética da Câmara. Na representação enviada pelo PSOL e pela Rede, o presidente da Câmara é acusado de quebra de decoro parlamentar por ter supostamente mentido, na CPI da Petrobras, que não tem contas fora do país. Ao negar que é dono das contas no Exterior, Cunha disse, na entrevista desta sexta, que é apenas o "usufrutário em vida" do dinheiro.
– Desses ativos, administrados e geridos pelo truste, eu sou usufrutuário em vida, em condições pré-contratadas.
De acordo com Cunha, ele manteve contas na Suíça por pelo menos 10 anos, entre 1993 e 2003. Após esse período, o dinheiro teria passado a ser administrado pelo truste. Documentos enviados pelo Ministério Público da Suíça à Procuradoria Geral da República, no entanto, dizem que ele é o controlador de contas naquele país – três contas seriam ligadas a Cunha, chamadas Orion, Triumph e Netherton, além de uma quarta, cuja titular é a mulher dele, Claudia Cruz, chamada Kopec. Cunha alega que as três contas ligadas a ele foram abertas pelos trustes:
– Não tenho qualquer tipo de conta em qualquer lugar que não seja a conta que está declarada no meu imposto de renda.
Segundo ele, o dinheiro do qual é "usufrutuário" é lícito e proveniente da venda de carne e outros produtos alimentícios na África – mais especificamente no antigo Zaire, atual República Democrática do Congo. Outra parte do dinheiro, segundo o deputado, seria fruto de investimentos em ações e bolsas de valores dos Estados Unidos e da China. Nenhuma das contas mencionadas pelo Ministério Público da Suíça nem as contas abertas anteriormente por Cunha foi declarada ao Banco Central e à Receita Federal.
– Veja bem, a minha declaração à CPI pode ser facilmente defendida. Eu não tenho conta no exterior, não sou proprietário ou acionista, cotista de empresa offshore no exterior. O que tenho é um contrato com um truste que passou a ter a propriedade nominal de ativos meus de origem antiga. E desses ativos, administrados e geridos pelo truste, eu sou usufrutuário em vida, em condições pré-contratadas, e por familiares meus, em morte.
Cunha afirma que os valores existentes em contas no Exterior não precisariam ser declarados às autoridades brasileiras, já que os donos seriam os trustes. Além disso, ele alega que os recursos foram gerados e investidos no exterior, sem que o dinheiro tenha sido enviado do Brasil para fora. De acordo com a sua defesa, se os valores fossem declarados, ele seria tributado duas vezes.
– Não declarei ao Banco Central e à Receita Federal porque não houve evasão de recursos. Foram recursos gerados e ganhos no exterior. Hoje, já está fora do período fiscal. A discussão seria sobre a manutenção ou não desses recursos de forma não declarada. Não sou proprietário mais desses recursos. O proprietário é o truste, eu sou apenas o contratante e beneficiário em vida. Por isso a gente acha, os advogados entendem, que não tem obrigatoriedade de declarar o suposto benefício.
No entanto, de acordo com a reportagem do Jornal da Globo, o Banco Central afirma que "todos os acordos de truste que envolvam a guarda e administração de ativos no exterior, tendo como beneficiários pessoas físicas ou jurídicas residentes no Brasil devem ser declaradas por meio de Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior (CBE)". A declaração precisa ser feita em nome do “beneficiário residente” no Brasil.
Na entrevista, o político ainda disse que não tem documentos que comprovem as operações em bolsa e comércio internacional que teriam resultado no dinheiro armazenado em contas no Exterior:
– Veja bem, naquele momento constituí uma companhia fora do Brasil que fazia essa intermediação de mercadorias para serem importadas e exportadas. Obviamente que estamos falando de coisa de 30 anos atrás. Isso não tem documento nem contabilidade de assunto dessa natureza. Essa empresa já foi desfeita. Eu não tenho mais a guarda de nenhum documento que possa gerar isso, a não ser meu passaporte provando as minhas viagens.