Relator da análise das contas de 2014 do governo no TCU, o ministro Augusto Nardes não se considera impedido de julgar o caso. Nardes garante que o parecer pela rejeição das contas é técnico e considera que a intenção de afastá-lo é uma tentativa de intimidar o tribunal.
Nardes diz que governo tenta intimidá-lo e que TCU não vai se acovardar
O senhor se considera impedido de participar do julgamento?
Essa estratégia do governo já foi utilizada com outros ministros, como Joaquim Barbosa (do Supremo Tribunal Federal, no mensalão) e José Jorge (do TCU, no caso Pasadena). O governo tenta uma estratégia para protelar e não discutir o mérito da matéria.
A tentativa de afastamento pela AGU surpreende?
Em um domingo, três ministros de Estado vão a público tentar desqualificar o relator, sem responder o que a sociedade precisa saber, que são as pedaladas. Não vou ficar intimidado.
Suas entrevistas interferem na análise das contas?
Nosso trabalho é técnico, e o que tenho falado trata de dois acórdãos que já foram julgados. Teve um julgamento das pedaladas, que ouviu várias autoridades, é um assunto público.
"É um trabalho técnico e isento", defende relator das pedaladas
E o vazamento de parte do voto de rejeição das contas?
Não me julgo suspeito, até porque o trabalho é técnico, foi assinado por 14 auditores, todos concursados do TCU. O regimento interno do tribunal estabelece que o relator entregue o parecer prévio aos demais ministros cinco dias antes da sessão. Entreguei na quinta-feira e na sexta um jornalista divulgou parte do voto, mas não por meio de mim.
O senhor falou demais?
Não, nunca procurei jornalista para passar informação, mas sou atencioso. Sou pago pela sociedade, então, devo relatar o que acontece no tribunal. Isso faz parte do meu conceito de democracia. O que se tenta no atual governo é amordaçar as pessoas.
O senhor já disse que o TCU fará "história". O que isso significa?
É a primeira vez que apresentamos o contraditório em um caso de contas públicas. Já estamos fazendo história.
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Existe o temor de que o governo tente anular o julgamento no STF?
O governo tem de responder sobre os R$ 40 bilhões das pedaladas e pelo que gastou sem autorização do Congresso.
Críticos dizem que o senhor tem pretensões políticas no Estado.
Não faz sentido. Não tenho nada decidido sobre aposentadoria ou meu futuro.
A rejeição das contas pode ser usada para um pedido de impeachment. Essa conotação política atrapalha?
Não discutimos política, discutimos técnica. Não entro em mérito de impeachment. O Brasil caminha a passos largos para se aproximar do que acontece com o Rio Grande do Sul e outros Estados. Por isso, a importância da transparência nas contas públicas. Alguém tem de ter coragem para estabelecer parâmetros.
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O pedido de afastamento
1 A Advocacia-Geral da União (AGU) protocolou no TCU o pedido de afastamento do ministro Augusto Nardes, relator do julgamento das contas de 2014 do governo federal.
2 A AGU argumenta que Nardes antecipou seu voto (de rejeição) e concedeu entrevistas sobre o caso, o que estaria em desacordo com a legislação.
3 O pedido chegou ao presidente do TCU, que o repassou ao corregedor do tribunal.
4 O parecer do corregedor é analisado pelo plenário do TCU. A análise será feita antes do julgamento das contas, marcado para amanhã.
5 Se os ministros do TCU afastarem Nardes, ele deixa a relatoria do caso e não pode votar.
6 Caso não tenha sucesso no TCU, a AGU deverá ingressar com ação no Supremo.
Em infográfico, entenda o que são as pedaladas fiscais do governo Dilma
As irregularidades
Não contabilização de dívidas do governo com Banco do Brasil, BNDES e FGTS (R$ 40,2 bilhões acumulados até 2014)
Descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (art. 1)
Adiantamento da Caixa para pagar Bolsa Família, seguro-desemprego e abono salarial (R$ 7 bilhões em 2014)
Descumprimento da LRF (art. 1, 32, 36 e 38)
Adiantamentos dados pelo FGTS à União para cobertura de despesas no Minha Casa Minha Vida (R$ 1,4 bilhão)
Descumprimento da LRF (art. 32)
Adiantamentos concedidos pelo BNDES à União para cobertura de despesas no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI)
Descumprimento da LRF (art. 1, 32, 36)
Pagamento de dívida contratual junto ao FGTS do Minha Casa Minha Vida sem autorização do orçamento
Descumprimento da LRF (art. 1, 3, 5 e 32) e da Constituição (art. 167)
Uso de recursos além do aprovado no orçamento por estatais ligadas a Petrobras, Telebras e Eletrobras
Inobservância da Constituição (art. 167)
Ausência de contingenciamento de despesas discricionárias da União de pelo menos R$ 28,54 bilhões, quando já se sabia que não haveria dinheiro para gastar
Descumprimento da LRF (art. 1 e 9)
Existência de distorções no Plano Plurianual 2012-­2015, tornando-­o sem confiabilidade
Descumprimento da Constituição (art. 37)
Condicionamento de aumento de gastos públicos à aprovação de lei no parlamento que mudava meta de superávit
Inobservância da Constituição (art. 37), da LRF (art. 1) e da Lei Orçamentária (Art. 118)
Inscrição irregular em Restos a Pagar (dívida de curto prazo) de R$ 1,367 bilhão referente a despesas do Minha Casa Minha Vida no exercício de 2014
Descumprimento da Constituição (art.37), da LRF (art. 1) e da Lei que regula os orçamentos (art. 36, 35 e 67)
Omissão de transações deficitárias da União junto ao Banco do Brasil, ao BNDES e ao FGTS nas estatísticas dos resultados fiscais de 2014
Descumprimento da LRF (art. 1) e da Constituição (art. 37)