Quando o mês de novembro se aproxima, eu começo a receber convites para falar sobre a vida dos negros. Logo eu, que sou quase branco. Não que eu me sinta assim, mas, por ser o cara da tevê, não me tratam mais como os iguais a mim. Sei que isso talvez deveria me deixar feliz, já que os iguais a mim são maltratados. Mas não posso me deixar enganar por esse holograma social, pois a vida continua sinistra para quem nasceu na escuridão.
Eu sou escuro e nasci na escuridão mais bonita em que alguém poderia nascer: uma mãe preta que me ama. Mas a realidade negra ainda é pedir um cafezinho no Centro depois de quatro entrevistas de emprego em que disseram que você não estava no perfil. Juro que gostaria que alguém me explicasse o que é esse perfil.
Em uma palestra em uma escola pública, vi que na primeira série havia um monte de pretinhos e, nas séries finais, eram poucos. Onde foram parar os negros que deveriam estar se formando? Estou cansado de ouvir que somos todos iguais, quando, na realidade, uns parecem ser mais iguais que os outros.
Jaula da miséria
Aplaudo os irmãos cuja a rotina é tomar um gole de café com pão às sete da manhã e só voltar a comer às três da tarde e que, ainda assim, fazem cara de feliz para os patrões.
O pior é que, quando um de nós consegue sair da jaula da miséria, vira argumento para preconceituoso dizer que quem quer, consegue. Sejamos negros até a vitória e a vitória será negra. Senão, quando vencermos, nossa vitória não terá cor.