Ao ser traído por alguém, não raro se passa a usar a expressão "amigo da onça" para defini-lo. Mas, ao contrário do que muitos imaginam, o adjetivo tem pouco a ver com algum trejeito de onça pintada. O Amigo da Onça, nome próprio, foi um personagem de cartum - um homem sem pescoço, com nariz comprido e bigode bem tratado, que satirizou costumes e épocas, lançou tipos e expressões populares e adquiriu importância tal que se incorporou, como personagem vivo, à realidade diária do Brasil dos anos 1940 desde sua publicação primeira, em outubro de 1943, nas páginas da revista O Cruzeiro.
Iotti: Amigo da Onça
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O nome do homenzinho de intenções questionáveis surgiu antes do personagem em si. A redação de O Cruzeiro teve a ideia de criar o cartum a partir de uma anedota famosa na época. Nela, há o diálogo entre dois caçadores:
Caçador 1: O que você faria se uma onça aparecesse?
Caçador 2: Ora, dava um tiro nela.
Caçador 1: Mas se não tivesse nenhuma arma?
Caçador 2: Então eu usava meu facão.
Caçador 1: E se estivesse sem facão?
Caçador 2: Subiria na árvore mais próxima!
Caçador 1: E se não tivesse nenhuma árvore?
Caçador 2: Sairia correndo.
Caçador 1: E se você estivesse paralisado?
Caçador 2: Mas você é meu amigo ou amigo da onça?
O Amigo da Onça chegou a ser mais conhecido do que seu criador, com quem era confundido. Ironicamente, o cartunista pernambucano Péricles de Andrade Maranhão (1921 - 1961), deu um corpo bastante similar ao dele ao cartum. De acordo com o jornalista João Martins, colega de Péricles em O Cruzeiro, "a ideia era de criar um personagem que lograsse retratar e captar toda a irreverência do carioca, toda a sua picardia, todo o seu humor - enfim, uma síntese do 'homo brasiliensis'.
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Onça, como era carinhosamente chamado pelos colegas de O Cruzeiro, foi desenhado ininterruptamente durante 17 anos por Péricles, que, sem saber lidar com o sucesso de sua criação, suicidou-se com gás em seu apartamento no Rio de Janeiro, na noite de 31 de dezembro de 1961. Depois da morte de Péricles, o personagem perdurou por mais 10 anos, sendo desenhado até sua morte pelo colega e amigo Carlos Estêvão. Os elementos de falsidade, malícia e hipocrisia humanos, transformados em humor, foram embrião para personagens como os Fradinhos, de Henfil, e os Skrotinhos, de Angeli.