Setenta anos depois de transmitido pelo rádio, o discurso em que o imperador japonês Hiroíto reconheceu que era um ser humano como qualquer um de seus súditos pode ser ouvido pela primeira vez pelo público de todo o mundo. Até o momento, o único registro do pronunciamento era uma cópia de qualidade inferior feita pelas forças americanas em 1946. O esquecimento mostra até que ponto o episódio foi traumático para o Japão.
Diferentemente do que ocorre em monarquias ocidentais, nas quais reis e imperadores têm por hábito dirigir-se ao público em datas festivas, no império japonês a figura do chefe de Estado era cercada de uma aura mítica. Acreditava-se que o imperador era descendente direto de deuses e, portanto, imortal. A transmissão, feita no dia 15 de agosto de 1945, menos de um mês antes da assinatura da rendição do Japão na II Guerra Mundial, foi a primeira vez em que a maioria dos japoneses ouviu a voz de Hiroíto.
Para os Estados Unidos, o discurso foi o momento mais simbólico da solução de compromisso adotada pelos americanos em relação ao pós-guerra no Japão. Enquanto alguns em Washington propugnavam a instauração de uma república no país derrotado e ocupado, acabou prevalecendo a ideia de preservar a monarquia, defendida, entre outros, pela eminente antropóloga americana Ruth Benedict. Hiroíto conservou o trono, mas foi obrigado a reconhecer que era mortal.
A gravação original, lançada no sábado em formato vinil pela Agência da Casa Imperial, está disponível neste site.
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Luiz Antônio Araujo
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