O oficial da Polícia Federal argentina Roberto Oscar González, e o colega dele, Pedro Osvaldo Salvia, fizeram parte do Grupo de Tarefas 3.3/2 (GT 3.3/2), uma subdivisão das equipes da Escola de Mecânica Armada (Esma), organismo da marinha argentina que se notabilizou como maior centro de tortura daquele país, onde teriam sido assassinadas ou sofrido agressões 5 mil pessoas. O local ficou conhecido como "empresa do crime" e "Auschwitz argentina" (em referência ao campo de concentração nazista). Mais tarde, virou um museu.
O envolvimento de González e Salvia com o GT 3.3/2 consta em processo que apura a morte do jornalista e escritor Rodolfo Walsh, do qual a dupla é formalmente acusada. Em 23 de março de 1977, Walsh, 50 anos, foi cercado nas ruas de Buenos Aires, ferido a tiros e levado por cerca de 30 homens para o quartel da Esma. O escritor era autor de uma carta à nação, revelando atrocidades e violações aos direitos humanos cometidos pelos militares no aniversário de um ano do golpe. Além de González e Salvia, outros 10 agentes da repressão são acusados do sumiço de Walsh, entre eles o então tenente Alfredo Astiz, o Anjo Loiro da Morte, e o capitão Jorge "El Tigre" Acosta (chefe do grupo), ambos condenados à prisão perpétua.
O argentino que passou de sequestrador a criador de galinhas em Viamão
Integrante da banda de Toquinho e Vinícius, Tenorinho nunca mais foi visto
Investigações apontam que do mesmo GT 3.3/2 fez parte Claudio Vallejos, torturador argentino preso em Santa Catarina, em 2013, acusado do desaparecimento do pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Junior, o Tenorinho. O músico de 35 anos integrava a banda de Toquinho e Vinícius de Moraes e foi sequestrado após um show da dupla em Buenos Aires, na noite de 18 de março de 1976. O pianista havia saído do Hotel Normandie, onde estava hospedado, para ir a uma farmácia quando foi abordado por quatro homens. Seu corpo jamais foi encontrado. Em entrevistas após ser capturado, Vallejos chegou a admitir que era o motorista do grupo que sequestrou o músico brasileiro.
Jango teria pedido canção de protesto para artistas
Tenorinho foi uma das vítimas da Operação Condor - acordo de cooperação entre militares na América do Sul para exterminar opositores. A decisão de prender o músico teria ocorrido em um intervalo do show, quando uma ilustre figura na plateia, o ex-presidente brasileiro João Goulart, deposto em 1964 e exilado na Argentina, se aproximou dos artistas. Jango teria pedido uma canção de protesto aos músicos. Como resposta, ouviu que falariam com o ex-presidente mais tarde.
Tudo indica que confundiram o pianista com um subversivo porque usava cabelo e barba compridos. Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos no Rio Grande do Sul, que ajudou a família de Tenorinho a obter indenização do governo argentino, suspeita que o real alvo seria Vinícius de Moraes, que havia sido servidor do Itamaraty no Exterior.
- O mesmo grupo fez os dois sequestros. Ele (González) poderia não estar junto na noite que Tenorinho foi preso, mas deve saber o que ocorreu - opina Krischke.