A intervenção da Brigada Militar nos principais presídios gaúchos deveria ocorrer por seis meses. Completa, neste sábado, 20 anos. Por que o provisório virou permanente?
Porque funcionou, acredita a maioria das autoridades e especialistas consultados por Zero Hora. Alguns fazem restrições aos gastos, outros são avessos à militarização, mas todos admitem que a presença da BM atingiu seu objetivo principal: terminar com o caos que caracterizava o sistema penitenciário até aquele 25 de julho de 1995, quando oficiais da PM assumiram a direção de quatro penitenciárias gaúchas, trazendo consigo 500 policiais militares.
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Eles passaram a fazer a segurança interna das unidades, que até então eram administradas por 280 agentes penitenciários. Com o passar dos dias, a intervenção militar se estendeu também à Febem (hoje Fase).
É preciso recordar o motivo. A imposição dos militares nas cadeias ocorreu após um ano de balbúrdia nos presídios. Um dos estopins foi o emblemático motim de 7 de julho de 1994, o mais longo da história do Presídio Central de Porto Alegre. Dilonei Melara, líder da Falange Gaúcha (atual Os Manos), que se encontrava na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas, comandou a fuga de 19 presidiários ruas da Capital afora, levando junto 10 reféns. A rebelião terminou com quatro bandidos e um policial mortos. Todos os presos foram recapturados ou mortos depois. A revolta durou 30 horas.
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Foi a mais notória rebelião, mas não foi a maior em número de participantes. Na segunda-feira de Carnaval, 27 de fevereiro de 1995, moradores do bairro Partenon começaram a ver pessoas correndo morro acima, nos fundos do Presídio Central de Porto Alegre. Eram presos em disparada, fugindo.
Ao todo, 45 detentos escaparam quebrando um muro, na maior fuga da história do sistema penitenciário gaúcho. Quase todos foram recapturados em poucos dias, mas o exemplo estava dado. Entre meados de 1994 e julho do ano seguinte, aconteceram sete grandes episódios de motins e escapadas no Central (leia abaixo), tudo isso mesclado com uma permanente porosidade do sistema carcerário - drogas, telefones e armas de diversos tipos proliferavam nas celas.
Foi em 25 de julho de 1995, após um motim com 21 presos feridos, que, indignado, o então secretário estadual da Justiça e da Segurança Pública, José Fernando Eichenberg, chamou o guarda - no caso, convocou a BM. Alegou que as fugas aconteciam em combinação com agentes penitenciários.
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A BM assumiu os quatro maiores presídios gaúchos: o Central, a Penitenciária Estadual de Charqueadas, a Penitenciária Estadual do Jacuí e a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas. Anos depois, a intervenção foi ampliada para Caxias e Osório. Juntos, abrigavam 3,3 mil presos, um terço da massa carcerária gaúcha na época.
A força-tarefa da BM foi sendo reduzida e hoje abrange apenas o Central e a PEJ - justo as maiores prisões. O primeiro interventor da BM no Presídio Central, coronel Paulo Astor Eifler Cordeiro, era de início contrário ao uso dos soldados. Como militar, cumpriu a ordem e, desde então, está convicto de que a situação melhorou muito nas prisões.
- Pararam as fugas de criminosos que saíam e matavam em assaltos, inclusive policiais eram mortos. A BM deve ficar mais tempo, é inadmissível aquela permissividade - resume Cordeiro, passadas duas décadas.
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A verdade é que, de pelo menos um tumulto por mês antes da presença da BM (um por semana, em julho de 1995), os presídios Central e PEJ registraram três rebeliões, nenhuma fuga e nenhuma morte em confronto desde 2008, segundo Sidinei Brzuska, juiz da Vara de Execuções Criminais.
A BM vai sair dos presídios? Não agora. O secretário da Segurança Pública, Wantuir Jacini, admite que não é missão de PMs gerenciar presídios, mas ressalta que fazem um bom trabalho. A ideia é repassar as prisões aos agentes, mas diante do veto a novas nomeações - por força do contingenciamento de recursos -, a saída é permanecer com a força-tarefa nos principais cárceres gaúchos. Por prazo indefinido.
Presença de policiais inibe fugas
Entre especialistas consultados por Zero Hora, a maioria considera positiva a experiência da BM nos presídios. Especialmente no que se refere à contenção de fugas.
Um oficial PM que trabalhou em Osório ressalta que, quando a BM ocupava o presídio regional daquela cidade, foi registrada uma fuga entre 2009 e 2010. Assim que os policiais militares deixaram a administração, ocorreram 50 fugas do regime semiaberto em duas semanas.
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Mesmo alguns que viam com maus olhos a troca de guarda nos presídios mudaram de opinião. Ativista dos Direitos Humanos e especialista em criminalidade, Marcos Rolim criticava a militarização das prisões gaúchas. Hoje, reconhece o que considera avanços da medida.
- Sob controle da BM nas prisões, houve uma evidente melhoria. Ficou tudo mais guarnecido, antes tinha dias em que cinco agentes vigiavam 2 mil apenados. Diminuíram as fugas, os casos de corrupção e a violência contra os presos. Uma vez conversamos com um agente que usava máquina de choque na cintura, atemorizando os detentos. Mas tem de ver se a relação custo-benefício ainda compensa. Talvez seja hora desses PMs voltarem ao patrulhamento das ruas - pondera Rolim.
Presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Rio Grande do Sul (Amapergs), Flávio Berneira considera a intervenção da BM "uma aberração" e alinha argumentos contra:
- São 20 anos com menos PMs nas ruas. A função constitucional deles é patrulhar, não administrar prisões. As fugas aconteciam porque as autoridades nunca preencheram o número ideal de servidores civis nos presídios. Quando trabalhei no Presídio Central, em alguns dias havia seis funcionários para mais de 2 mil presos. A BM nunca teve menos de 120 policiais lá, por isso as escapadas diminuíram. Se botar agentes em número suficiente, faremos melhor, porque fomos treinados para isso - desafia.