O juiz federal Sérgio Moro, que conduz as ações da Operação Lava-Jato, intimou, nesta terça-feira, os defensores da maior empreiteira do país a explicarem anotações feitas pelo próprio presidente da companhia, Marcelo Bahia Odebrecht, em seu telefone celular.
Para a Polícia Federal, há indícios de que o empresário, preso desde 19 de junho, lançou mão de uma estratégia de confrontar as investigações da Lava-Jato, buscando criar "obstáculos" e "cortinas de fumaça", que contaria com "policiais federais dissidentes", dupla postura perante a opinião pública, apoio estratégico de integrantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e ataques às apurações internas da Petrobras.
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"O trecho mais perturbador é a referência à utilização de 'dissidentes PF' junto com o trecho 'trabalhar para parar/anular' a investigação", alerta o juiz da Lava-Jato. Para Moro, "sem embargo do direito da defesa de questionar juridicamente a investigação ou a persecução penal, a menção a 'dissidentes PF' coloca uma sombra sobre o significado da anotação".
Nas 64 páginas do relatório de indiciamento de Marcelo Odebrecht, Márcio Farias, Rogério Araújo e outros executivos, a PF traça um panorama a partir das anotações do presidente da Odebrecht, de e-mails e materiais apreendidos, para apontar tal conduta do empresário - indiciado por corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa e crime contra a ordem econômica.
"Considerando a aparente gravidade dessas anotações, antes de extrair as possíveis consequências jurídicas, resolvo oportunizar esclarecimentos das Defesas dos executivos da Odebrecht, especialmente das de Marcelo Odebrecht, Márcio Faria e Rogério Araújo, acerca das referidas anotações", afirmou Moro, que deu prazo para as defesas até a próxima quarta-feira.
Um dos pontos da conduta atribuída à Odebrecht para tentar neutralizar as investigações seria: a "utilização de 'dissidentes' da Polícia Federal. No Relatório de Análise 417/2015, da PF no Paraná, consta: 'Marcelo ainda elenca outros passos que devem ser tomados identificando-os como 'ações B', tido aqui como uma espécie de plano alternativo ao principal."
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Em uma das anotações, foi identificada uma suposta menção a Marcio Faria e Rogério Araújo: "( ) MF/RA: não movimentar nada e reembolsaremos tudo e asseguraremos a família. Vamos segurar até o fim Higienizar apetrechos MF e RA Vazar doação campanha. Nova nota minha mídia? GA, FP, AM, MT, Lula? Ecunha? ( )"
"Em análise sumária e embora tudo esteja sujeito à interpretação, MF e RA aparentam ser referências aos coinvestigados e subordinados de Marcelo Odebrecht, Márcio Faria e Rogério Araújo. Aparentemente, a anotação indica que ambos estariam sendo orientados a não movimentar suas contas e que, no caso de sequestro e confisco judicial, seriam reembolsados. A referência a 'higienizar apetrechos MF e RA' sugere destruição de provas, com orientação para que os aparelhos eletrônicos utilizados por Márcio Faria e Rogério Araújo fossem limpos, ou seja, que fossem apagadas mensagens ou arquivos neles constantes eventualmente comprometedores. 'Vazar doação campanha' é algo cujo propósito ainda deve ser elucidado, mas pode constituir medida destinada a constranger os beneficiários", aponta Moro.
"Outras referências como a 'dossiê', 'blindar Tau' e 'expor grandes' são igualmente preocupantes", afirmou. "Por outro lado, nada indica que essas anotações eram dirigidas aos defensores de Marcelo Odebrecht, não havendo, em princípio, que se falar em violação de sigilo legal. Não é crível ademais que ele orientasse seus advogados ou recebesse orientação de seus advogados nesse sentido. De todo modo, ainda que assim não fosse, o sigilo profissional também não acobertaria o emprego de estratagemas de defesa ilícitos, por exemplo a destruição de provas."
Quando foi consultada anteriormente sobre as anotações, a Odebrecht informou: "embora sem fundamento sólido, o indiciamento do executivo e ex-executivos da Odebrecht já era esperado. As defesas aguardarão a oportunidade de exercer plenamente o contraditório e o direito de defesa."
*Estadão Conteúdo