Apesar da crise financeira que afeta áreas fundamentais, como saúde e segurança, 66 funcionários de sete órgãos do Estado tiveram altos rendimentos em maio.
A remuneração bruta - incluindo indenizações, funções gratificadas (FGs) e vantagens eventuais e pessoais - paga a servidores de uma autarquia e de cinco empresas de economia mista variou de R$ 30,5 mil a R$ 58,5 mil. Os valores são até 139,7% superiores ao recebido pelo governador José Ivo Sartori no mesmo período.
Confira na tabela abaixo nomes e salários dos servidores:
E também estão acima do teto do funcionalismo, que hoje é de R$ 30.471,11. Juristas afirmam que a regra do teto não vale para empresas públicas e sociedades de economia mista, a não ser que recebam verba de União, Estados e municípios para custeio ou pagamento de despesas de pessoal.
São enquadrados pela norma prevista no artigo 37 da Constituição "ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória".
Com uma dívida de cerca de R$ 400 milhões, a CEEE tem o maior número de empregados (65% do total do levantamento) com altos salários. Depois, vêm por ordem a Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH), Badesul, Corsan e Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa), empatadas, e Companhia Riograndense de Mineração (CRM).
No topo da lista de órgãos que podem ser extintos pelo Palácio Piratini, a Cesa - historicamente deficitária e com passivo de quase R$ 500 milhões - tem inativos com rendimentos de até R$ 42,6 mil. Em 2014, teve prejuízo de R$ 25,32 milhões.
As informações foram disponibilizadas no Portal Transparência após a publicação de um decreto, em junho, pelo qual Sartori determinou a divulgação da relação dos nomes e salários dos servidores estaduais. Mas, da lista de 20 autarquias e empresas de economia mista, apenas 11 liberaram os dados em formato PDF, permitindo que a reportagem cruzasse os dados e fizesse um ranking dos maiores salários. Para os demais órgãos, é preciso pesquisar cada um dos funcionários.
A explicação para o tratamento diferenciado em relação ao teto, segundo o professor de Direito Constitucional na Unisinos Leonardo Grison é que as empresas de economia mista "se submetem à lógica do mercado". Na prática, a brecha permite que organizações que têm o Estado como sócio majoritário paguem salários superiores ao teto.
- É verdade que isso cria, muitas vezes, dentro do serviço público, uma desigualdade que leva à constituição de uma casta que escapa dos limites próprios do setor público - opina Eduardo Carrion, professor titular de Direito Constitucional da UFRGS e da Fundação Escola Superior do Ministério Público.
No ano passado, começou a tramitar na Câmara uma proposta de emenda à Constituição (PEC), de autoria do deputado Washington Reis (PMDB-RJ), que determina que empresas públicas, sociedades de economia mista, concessionárias e permissionárias de serviços públicos e ainda cartórios respeitem o teto remuneratório. A matéria ainda aguarda parecer na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Sem receita para pagar vencimentos
Com apenas 213 funcionários ativos, a Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH) conta com uma folha que, em maio, chegou a R$ 5,6 milhões. Boa parte da despesa é destinada a inativos, que representam 75,4% dos servidores.
Fundado em 1921 e responsável pela administração dos portos de Porto Alegre, Pelotas, Cachoeira do Sul e Estrela, o órgão enfrenta crise nas finanças. Em 2014, arrecadou R$ 9 milhões e apresentou déficit operacional de R$ 38 milhões.
Deficitária, a SPH não consegue cobrir sozinha despesas com folha de pagamento e manutenção do serviço. Sem aportes do Tesouro também não consegue realizar investimentos de infraestrutura necessários às hidrovias.
Wilen Manteli, presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários, sugere a criação de uma entidade privada para administrar as hidrovias e deixar ao poder público o papel de formatar políticas e fiscalizar, nos mesmos moldes que o setor adota na Alemanha e nos Estados Unidos.
- A SPH cumpriu sua função muito bem até 1970. De lá para cá, foi abandonada pelo Executivo e sem recursos não consegue administrar as hidrovias. Não à toa, temos hoje apenas 700 quilômetros navegáveis no Estado. Vinte anos atrás, eram 1,2 mil - diz.
CONTRAPONTOS
O que diz o Badesul
Informou que "nenhum dos colaboradores tem remuneração que ultrapassa o teto, pois o item total de créditos na tabela está contemplando o 13º salário proporcional aos seis primeiros meses de 2015".
O que diz a CEEE
A assessoria destacou que trata-se de empresa de economia mista, sem vinculação ao orçamento do Estado", com empregados regidos pela CLT.
O que diz a Cesa
Conforme o presidente da companhia, Carlos Kercher, está sendo feita análise da folha, pois "fomos surpreendidos com esses valores".
O que diz a Corsan
Informou cumprir a legislação em vigor, pois a companhia é uma sociedade de economia mista e que não recebe recursos do Estado para pagamento da folha e custeio.
O que diz a CRM
Conforme a empresa, "não há qualquer colidência entre o salário percebido com a norma constitucional", tendo em vista que CRM é uma sociedade de economia mista que não recebe recursos do Estado para pagamento de folha ou custeio.
O que diz a SPH
A assessoria disse, em nota, que "o que vale é o limite de R$ 30.471,11" e que "o excedente fica cortado, de forma que, na prática, nenhum servidor percebe mais do que o teto acima mencionado, deduzidos ainda os descontos obrigatórios".