No cadastro da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), a profissão de Jocemar Takeuchi Navarro, 35 anos, consta como auxiliar de serviços gerais. Japonês, como é conhecido, costuma dizer que trabalha com vendas e complementa a renda negociando automóveis usados. Para policiais, o serviço dele é diferente: consultor de quadrilhas de ladrões de carro. Nos últimos dias, Japonês se tornou pivô de uma polêmica surgida quando o chefe da Polícia Civil, Guilherme Wondracek, afirmou evitar sair à noite em Porto Alegre por causa de ataques a motoristas.
A Capital é castigada por bandos de ladrões de carro cujos esconderijos são cidades da Região Metropolitana, em especial, Sapucaia do Sul, onde mora Japonês. Investigado em duas dezenas de inquéritos, réu em 15 processos em Porto Alegre, Sapucaia e Novo Hamburgo, a maioria por delitos ligados a furto e roubo de veículos, Japonês tem uma trajetória que mostra como um bandido deste ramo criminoso está sempre entrando e saindo da cadeia. E, após 12 prisões, a última em 20 de junho, é, tecnicamente primário.
Para entender isso é preciso recorrer ao prontuário criminal de Japonês. A ficha policial aponta que aos 18 anos ele se tornou um habitué de delegacias. Foram 29 ocorrências, a maioria delas, registros de violência doméstica, dano, ameaça, lesão, acidente de trânsito e direção sem habilitação. Esses fatos não geraram punições por serem considerados delitos de baixo potencial ofensivo, mas podem ter servido de trampolim para um mergulho no submundo do crime. A partir de 1998, ele foi flagrado furtando veículos e com arma sem registro.
Acabou condenado em cinco processos. Dali para frente, fugiu duas vezes de albergues do semiaberto e se livrou de outras cinco acusações por furto, receptação, formação de quadrilha, porte ilegal de arma e homicídio. Após cumprir sete anos e cinco meses de prisão, ganhou liberdade em março de 2008. Em setembro daquele ano voltou a ser preso, por receptação, em São Leopoldo, mas o processo demorou e a pena prescreveu.
Em 2013, passados cinco anos sem condenações, Japonês se viu quite com a Justiça. Desde então, tem a ficha limpa, com todos os crimes prescritos, conforme regra prevista pelo Código Penal. Só vai sujá-la se voltar a ser condenado. E isso é possível de acontecer. Desde 2010, ele responde a outros cinco novos processos, ainda sem sentença, e já foi três vezes preso provisoriamente.
Ostentação sem confusão
Para a polícia, Japonês evoluiu de simples ladrão para "executivo da indústria do furto e do roubo de carros". Nas palavras do delegado Juliano Ferreira, do Departamento Estadual de Investigações Criminais, Japonês é um facilitador de negócios entre o bandido que pega os veículos na rua (fornecedor) e o receptador que vai clonar ou desmanchar o carro (cliente).
- É um grande intermediário. Se um ferro velho quer uma Mitsubishi L200 Proton ele não vai pedir para um ladrão, vai encomendar o carro ao Japonês - garante o delegado.
No bairro onde mora, em Sapucaia do Sul, nada de escolta por seguranças nem cães ferozes (ele tem dois poodles). O seu lema, conforme os mais próximos, é "ostentação sem confusão". Na garagem, carros de luxo, como um Camaro branco e outro amarelo (cerca de R$ 200 mil cada) e ainda usa relógios de R$ 10 mil.
- Ele é amável, educado, cumprimenta todo mundo. Nunca transpareceu nada - diz uma vizinha que não quis se identificar.
Familiares de Navarro, segundo a Polícia Civil, são os designados para executar os planos. Os investigadores salientam que objetivo de Japonês é "não sujar as mãos":
- É um cara calmo, esperto, malandro e, o principal, cheio de contatos. Ele gosta de coisas boas e evita confusão. Evita o telefone e dá as ordens pessoalmente - relata um agente da Polícia Civil.