Encurralado por uma crise política, o PT deu início ontem ao seu quinto congresso com o desafio de unir o partido em torno do governo Dilma Rousseff. O distanciamento entre a presidente e a base, a relação com o PMDB e a política de austeridade estão no centro da discussão.
O primeiro sinal em direção ao Palácio do Planalto foi a aprovação ontem do documento elaborado pelas correntes majoritárias da sigla. Inicialmente crítico ao ajuste fiscal, o texto foi atenuado nos últimos dias depois de Dilma ter feito uma defesa pública do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e da política econômica.
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Ao mesmo tempo, correntes mais radicais tentaram emplacar propostas como a demissão de Levy, o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal e a estatização de redes de TV.
A insatisfação de parte do PT com a política econômica despertou críticas públicas de lideranças partidárias e contribuiu para dezenas de teses a serem apresentadas no congresso. As correntes mais moderadas mantiveram o enfoque na ideia de que o governo precisa encontrar uma receita de ajuste fiscal alinhada à ideologia de esquerda, diferente da adotada por Dilma e Levy, inspirada em métodos ortodoxos.
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Setores radicais, como a chapa Constituinte por Terra, Trabalho e Soberania, encaminharam propostas extremas. Sob o título Abaixo a Política de Austeridade, o caderno da corrente pede o rompimento imediato da política econômica e intervenção do governo no Judiciário (com a deposição dos ministros do STF e a soltura dos petistas presos por corrupção) e na mídia (com a estatização de empresas).
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Um dos setores mais críticos à atual política econômica de Dilma é o PT do RS. Reduto da Democracia Socialista (DS), uma das correntes mais radicais do partido, o diretório levou na bagagem uma série de resoluções para provocar o debate no congresso. Os documentos atacam diretamente as medidas de ajuste fiscal ao solicitarem à presidente que amplie a isenção do Imposto de Renda para trabalhadores, aumente a taxação de bancos e mantenha o fim do fator previdenciário.
- Nossas resoluções vão ajudar o governo a vir para a esquerda, e não para o centro e para a direita, que é para onde o PMDB e o PP estão empurrando o PT - diz o presidente estadual, Ary Vanazzi.
Além do cerco do PT à Dilma, o partido deve decidir se volta atrás na decisão de não aceitar mais doações de empresas. A medida foi adotada em meio ao escândalo da Operação Lava-Jato, que resultou na prisão do então tesoureiro, João Vaccari Neto, e dos protestos contra o governo em março. Ontem, Vaccari foi aplaudido de pé em Salvador e sua prisão foi considerada arbitrária pelos participantes. A corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), majoritária na política interna, defende que seja aberta uma exceção para os diretórios endividados.
Decisões anteriores dividem o partido
Em março, a sigla proibiu os diretórios de receberem contribuições, mas liberou as doações a candidatos. A proposta aprovada na Câmara com a bênção do presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é justamente o contrário da petista: autoriza as doações de empresas a partidos, e não a candidatos. Internamente, a direção da sigla avalia que a decisão de março foi tomada de forma afobada.
Embora a divisão da legenda esteja cada vez mais clara, a possibilidade de ruptura entre a presidente e setores do partido é vista com desconfiança por um dos principais especialistas na política interna da sigla, o historiador Lincoln Secco, professor da Universidade de São Paulo (USP) e autor do livro A História do PT:
- Por maiores que sejam as divergências, todos grupos estão no governo, ocupam cargos. É um jogo calculado. O PT mantém uma distância segura do ajuste para não corroer ainda mais a sua base social e porque prevê uma grande derrota nas eleições municipais.
As chapas do congresso
Partido que Muda o Brasil
429 delegados
Correntes: Construindo um Novo Brasil, Novo Rumo e PT de Lutas & Massas
Líderes: Lula e Rui Falcão
Teses:
- Retorno da CPMF para ajudar no custeio da saúde
- Criação de bancos públicos para micro e pequenos negócios
- Direcionamento do investimento e do crédito para fortalecer a indústria, a inovação e o emprego
Mensagem ao Partido
164 delegados
Correntes: Mensagem ao Partido e Democracia Socialista
Líderes: Tarso Genro e José Eduardo Cardozo
Teses:
- Aumento do imposto sobre heranças
- Aumentar a aproximação do PT com movimentos sociais e outros partidos de esquerda
- Reforma tributária que aumente a taxação das classes altas e diminua a das classes baixas
Partido é para todos
114 delegados
Correntes: Movimento PT e Esquerda Popular Socialista
Líderes: Arlindo Chinaglia e Maria do Rosário
Teses:
- Fortalecimento da Juventude Petista
- Alianças programáticas que substituam as atuais, consideradas contraditórias
- Redução da taxa básica de juro e retomada da política econômica do governo anterior
A esperança é vermelha
42 delegados
Corrente: Articulação de Esquerda
Líder: Valter Pomar
Teses:
- Reocupar as ruas com protestos e manifestações de apoio ao governo Dilma
- Ampliar a integração com outros países do Mercosul e reforçar alianças com forças ligadas à esquerda
- Alterar a linha do governo e repassar a conta do ajuste fiscal "aos ricos"
É pela esquerda que queremos o Brasil
27 delegados
Corrente: Militância Socialista
Líder: Renato Simões
Teses:
- Expulsão de filiados envolvidos em escândalos de corrupção
- Criação dos conselhos populares
- Manutenção do fim do fator previdenciário
Constituinte por terra, trabalho e soberania
11 delegados
Corrente: Trabalho
Líder: Markus Sokol
Teses:
- Impeachment dos ministros do Supremo Tribunal Federal que participaram do julgamento do mensalão e anulação das sentenças dos dirigentes do PT
- Estatização da Rede Globo e das redes de TV e rádios identificadas com religiões