Num artigo que passou injustamente despercebido, o cientista político Francis Fukuyama lamentou, em outubro do ano passado, que os Estados Unidos tenham se tornado um "Estado de tribunais e partidos". Com essa definição, ele pretendeu designar um regime democrático que falhou "em se adaptar a circunstâncias externas cambiantes, seja em razão de inflexibilidades intelectuais ou da capacidade das elites no poder de proteger suas posições e bloquear a mudança". O texto, intitulado América em Decadência, apareceu na prestigiosa revista americana Foreign Affairs.
A fim de ilustrar sua tese, Fukuyama - mais conhecido por ter dito nos anos 1990 que a queda do Muro de Berlim representava o "fim da história", impressão prontamente desmentida pelos fatos - lançou mão de um exemplo mundialmente famoso: o fim das leis de segregação racial. O primeiro passo nessa direção, lembrou, foi uma decisão da Suprema Corte, em 1954, em favor de um pequeno grupo de pais e filhos que tinham o acesso à educação pública negado com base em critérios de cor de pele.
"O que é notável", escreveu Fukuyama, " é que uma das mais importantes mudanças nas políticas públicas americanas começou não porque o Congresso como representante do povo americano aprovou-a, mas porque indivíduos litigaram por meio do sistema judicial para mudar as regras".
Basta substituir a expressão "fim da segregação" por "casamento gay" para perceber que o estado de coisas descrito por Fukuyama está em pleno vigor. No Brasil, com sua democracia infinitamente mais disfuncional que a americana, é provável que a revolução nos direitos civis representada pelo movimento LGBT tenha de seguir o mesmo caminho. Não há outro jeito de contornar a muralha medieval erguida no Congresso por evangélicos e conservadores de todas as plumagens.
Saiba como ativar o filtro colorido na sua foto de perfil no Facebook
Em 2013, CNJ aprovou conversão de união estável gay em casamento civil
Leia mais notícias do mundo