A escultura "Tree Virus", de Peter De Cupere, não é grande coisa: uma árvore morta, escura, colocada sobre uma bola branca irregular suspensa sobre um buraco e coberta por um iglu de plástico. Montada em um campus universitário na Holanda, em 2008, a coisa toda podia muito bem passar por restos do cenário de um filme de Tim Burton - não fosse pelo cheiro fortíssimo.
Dentro do iglu, uma combinação potente de menta e pimenta-do-reino deixa o ar carregado, enche o nariz e agride os olhos. Muitos visitantes choram; outros tantos fogem. Há também quem se divirta, rindo através das lágrimas.
Esse é o estranho poder da arte olfativa.
- Quando você se aproxima de uma instalação com cheiro, não dá para disfarçar. Seu corpo inteiro começa a reagir. Quando olha para alguma coisa, começa a pensar sobre ela, mas eu quero que as pessoas sintam o impacto do trabalho - explica De Cupere, artista belga que usa os odores para causar reações viscerais há quase vinte anos.
Sim, De Cupere faz arte que fede: esgoto, suor, peixe podre, cigarros, desodorizadores sanitários, mas também grama, pasta de dente, doces, flores e sabonete. Tudo isso tem destaque garantido nas instalações, pinturas, perfumes, apresentações e até um aplicativo para iPad criados por esse provocador - mas ele é apenas um dos diversos artistas contemporâneos que lançam mão do odor para criar arte que gera experiências pessoais, emotivas e, às vezes, até físicas.
Os pesquisadores dizem que o olfato tem uma vantagem indiscutível sobre os outros sentidos quando se trata de estimular respostas.
- Há uma relação estreita, direta e única, entre o ponto no cérebro que processa o cheiro e onde as lembranças ficam armazenadas. É daí que vem aquela característica especial que distingue o olfato dos demais sentidos - diz Rachel Herz, psicóloga da Universidade Brown e autora de "The Scent of Desire: Discovering Our Enigmatic Sense of Smell" ("O Aroma do Desejo: Descobrindo o Nosso Enigmático Sentido do Olfato").
O bulbo olfatório - o feixe de neurônios que transmite as informações do nariz para o cérebro - faz parte do sistema límbico, que lida com as emoções, a memória de longo prazo e o fluxo de adrenalina.
Assim como as madeleines de Proust abriram um verdadeiro portal de lembranças da infância, os cheiros geram sentimentos diversos, dependendo do primeiro contato que a pessoa tem com eles.
- O exemplo clássico é o da gaultéria, considerado muito agradável nos EUA, mas detestável no Reino Unido. Isso porque no primeiro caso é usado como ingrediente de balas e doces; no segundo, vira aroma de produto de limpeza sanitária ou remédio - explica.
E prossegue, dizendo que sempre gostou do cheiro do gambá porque antes de saber sua fonte, o reconhecia como o cheiro da floresta.
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Com o odor posso fazer um trabalho universal, que todo mundo entende, embora sempre haja um aspecto pessoal. É um exercício mais íntimo que a visão, além de muito subjetivo. Dá uma nova dimensão à obra - afirma ele, em entrevista por telefone.
A arte que incorpora cheiros sempre foi uma discrepância, e não sem razão. Os aromas, que começam com fragmentos químicos microscópicos flutuando no ar, são difíceis de controlar e suscetíveis às condições ambientais. Em 1902, um poeta e crítico de arte chamado Sadakichi Hartmann tentou usar perfume e um leque em um "concerto olfativo" em Nova York, mas o cheiro foi sendo sobrepujado pela fumaça dos cigarros e ele acabou tendo que sair do palco, vaiado.
Smell-o-Vision, método desenvolvido décadas depois para pulverizar aromas nas salas de cinema, fracassou em parte porque demoravam demais para chegar aos camarotes superiores. Mesmo hoje em dia, De Cupere precisa de galerias que peguem leve no ar condicionado para exibir suas obras.
O artista descobriu o poder dos cheiros bem cedo: aos nove anos destilou grama do quintal de sua casa para fazer perfume e percebeu que a novidade deixava as pessoas mais felizes no ônibus
- Sete horas da manhã, todo mundo com sono, mas você entrava no ônibus e sentia o cheirinho de grama recém-cortada. O pessoal começava a sorrir - conta ele.
Geralmente usa os cheiros para provocar - como as estátuas da Virgem Maria feitas de desodorizadores de privada, água benta e secreções vaginais. E "Warflower", em exibição no Instituto de Arte Courtauld, em Londres, é uma planta grotesca, plantada no capacete militar, que exala cheiro de pólvora.
De Cupere é muito famoso em sua terra natal, mas seu apelo já começa a se espalhar: fará a primeira exposição em Cuba e já tem compromissos marcados na Suíça, Itália, Holanda e Alemanha ainda este ano.
Entretanto, nunca exibiu nos EUA - considerado um mercado difícil, dados os gostos convencionais de arte e cheiros do país, como explica K.J. Baysa, diretor de estratégia do Instituto de Arte e Olfato de Los Angeles.
- A obra de De Cupere não é, em absoluto, a primeira opção em arte que envolve aromas porque estamos acostumados a associá-la com as notas agradáveis de algum perfume. A arte de vanguarda, neste caso, não atrai as massas - sentencia.
- O pessoal ainda não está acostumado. Acha meio maluco, mas o cheiro encerra uma infinidade de possibilidades - conclui De Cupere, otimista.
Arte olfativa
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