A diplomacia brasileira vive momento de retração por conta do ajuste fiscal e da vocação menos internacionalista que o governo de Dilma Rousseff tem em relação aos seus antecessores, Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso.
O Itamaraty viu embaixadas, consulados e vice-consulados pularem de 150 em 2002 para 227 em 2014, acréscimo de 51,3%. Lula havia dado o salto das 150 anteriores para 217 até 2010 - aumento de 67 representações. Dilma fez o número crescer para 227, com mais 10 unidades. Eram medidas alinhavadas pelo antecessor. A presidente não abriu a embaixada de Vanuatu, república soberana insular de 250 mil habitantes no arquipélago das Novas Hébridas. Estava na lista de Lula.
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Dos R$ 69,9 bilhões cortados pelo governo federal do orçamento de 2015, apenas R$ 40,7 milhões saíram do Itamaraty - são 3,3%, mas sobre um dos menores orçamentos entre as pastas e com cortes, em especial, no Exterior. O problema é que a manutenção de representações consome valor crescente na medida em que o dólar se valoriza. Servidores do ministério fizeram greve entre 12 e 14 de maio em razão do atraso de pagamentos. Pediam reformas estruturais no Itamaraty. Reclamaram da falta de dinheiro até para comprar papel para impressoras e pagar contas. Alguns tiveram de custear residência diplomática do próprio bolso.
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Além do funcionamento de embaixadas, programas de cooperação e doações também foram afetados.
O embaixador aposentado Sérgio Tutikian, com mais de 30 anos na carreira diplomática, questiona:
- Fazer política externa é passar o tempo todo tentando liberar dinheiro?
Embaixador credita a ministro brandura de cortes
Episódios como o do fechamento do consulado-geral brasileiro em Beirute - assinado pelo vice-presidente Michel Temer, descendente direto de libaneses - provocam desconforto entre países envolvidos. É um laço que se corta. E também é sinal de que as mais de 70 representações diplomáticas espalhadas por países como Antigua, Azerbaijão, Barbuda, Belize, Burkina Fasso, Nepal e Saint-Kitts correm risco de fechar - já houve atrasos em salários de funcionários locais, não pagamentos de aluguéis e cancelamentos de missões.
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Um episódio corriqueiro em representações de alguns países que subsistem sob condições precárias: o embaixador ou cônsul precisa alugar a residência onde viverá, mas são raras e caras as disponíveis com as condições adequadas. Isso estoura o orçamento, cuja previsão é de que 25% dos recursos sejam gastos com moradia. Muitos diplomatas se negam a ir para esses países. Um caso foi o de Lilongwe, capital do Malawi.
O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, vive um dilema: sabe da necessidade de fechar embaixadas e consulados, mas não quer ficar conhecido como responsável por desativar unidades criadas por Lula. Alguns números ilustram a situação. Nos três primeiros anos do governo Lula, o orçamento do Itamaraty cresceu 14%. No mesmo período do governo Dilma, o crescimento foi de 3,7%. Outro dado: o peso do Itamaraty no Orçamento caiu de 0,5% para 0,27% - quase a metade.
Apesar de considerar "positivo" o corte de apenas 3,3% no orçamento do Itamaraty - outros setores foram mais atingidos -, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães lembra que os gastos da diplomacia são fixos e inadiáveis. Incluem aluguéis e manutenção de embaixadas.
Guimarães sustenta que o mérito pelo fato de os cortes não terem sido mais profundos é do ministro. Em abril, Vieira admitiu: o Brasil atrasou o pagamento da contribuição obrigatória à Organização dos Estados Americanos (OEA).
- Vamos fazer (o pagamento) em parcelas. Este ano, particularmente, estamos atravessando ajuste orçamentário - disse o ministro.
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