Uma audiência pública que ocorre nesta sexta-feira na Câmara de Vereadores aborda o projeto de lei nacional que pode mudar a forma como 81 adolescentes que cumprem atualmente alguma medida no Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) de Caxias do Sul são vistos pela sociedade.
Talvez a questão mais emblemática da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, debatida no Congresso a partir da aprovação da provação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171-A/93, seja esta: a mera introdução de adolescentes em presídios será capaz de combater a criminalidade ou apenas responderá aos anseios de uma população cansada da impunidade?
O Case de Caxias do Sul, em contingente de internados, trabalha com o dobro da capacidade. Os 81 adolescentes dividem dormitórios que serviriam a 40. Cada dormitório tem uma cama, com o acréscimo de um colchão para atender os excedentes. Não é o ideal, mas ali, pelo menos, eles têm rotina obrigatória de escola, cursos e oficinas, recreação, horários estipulados para acordar e até escovar os dentes.
Os internados têm entre 12 e 21 anos, mas 80% da faixa etária é de 16 a 19 anos. O histórico de vida dos menores atesta uma situação de vulnerabilidade social. Praticamente a totalidade deles (95%) vêm de famílias com passagens pelo Conselho Tutelar e pela rede de assistência social. Um dos pontos em comum é a evasão escolar e o envolvimento dos menores na drogadição.
Do motivos das internações no Case, cerca de 50% é por roubo e 40% por homicídio, motivados por desafetos e rivalidades entre grupos e bairros. Cerca de 60% dos menores são reincidentes.
- Eles vêm para cá, trabalhamos na ressocialização, conseguimos mudanças de atitudes, mas eles voltam para o mesmo contexto social que eles tinham antes: o mesmo bairro, a mesma companhia, o mesmo quadro de pobreza e drogadição. Percebemos, sim, uma vontade de mudança, mas os adolescentes saem e se deparam com a mesma realidade - atesta o assessor jurídico da unidade, Bruno Loureiro da Costa.
A reportagem conversou com um adolescente internado no Case de Caxias. Com 19 anos, ele cumpre pena há 1 ano e seis meses por assalto.
Por que tu está aqui?
Entrei numa bronca. Caí num assalto. Eu tava com outras pessoas. Eu não tava armado. A gente tinha roubado um carro e foi pra vila, onde a gente tava usando uma droga e a Brigada pegou nós. Eu tava com dois amigos.
Já tinha vindo para o Case antes?
Não, foi a primeira vez.
Tu já tinha se envolvido em algum furto ou roubo antes?
Tinha. Em bastante.
E por que começou?
As amizades. Comecei a andar com umas amizades e começamos a roubar e a usar drogas. Usava o dinheiro pra comprar roupas ou drogas.
Tu roubava por que não tinha dinheiro?
Tinha, mas eu escolhi os meus amigos. Eles convidavam (para roubar) e eu ía.
Quando tu parou de estudar?
Na sexta série. Eu não gostava. Meu pai e minha mãe mandavam eu ir pra escola, mas eu não obedecia. A mãe recebia bolsa família e parou por causa disso. Teve até conselho tutelar, mas não adiantou.
Tu sabe o que é essa discussão de agora, da redução da maioridade?
Sim. Eu sou contra. Tá louco. Dezesseis anos e ir pro presídio... Vai virar uma creche.
Por que vai virar uma creche?
Vão continuar na mesma vida. Eles vão gostar daquele lugar e vão roubar e até matar quando sair de lá.
Infância marcada
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Redução da maioridade penal é tema de audiência pública nesta sexta na Câmara de Vereadores
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