O descredenciamento de 60 instituições de saúde pela Unimed Porto Alegre, que abrange a Capital e outras 14 cidades das redondezas, pode se tornar uma discussão judicial. A decisão de cancelar os serviços foi anunciada por meio de uma carta entregue a laboratórios de análises clínicas, serviços de radiologia, cardiologia, oncologia e clínicas médicas em 19 de dezembro - último dia útil antes de a Lei 13.003, que torna obrigatória a substituição de prestadores descredenciados, entrar em vigor, em 22 de dezembro.
Veja a lista de instituições descredenciadas pela Unimed
Quem planeja acionar a Justiça é a Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul (Fehosul), que representa 11 sindicatos da área da saúde. Para a entidade, os motivos do desligamento não foram especificados pela Unimed e trata-se de uma manobra para não cumprir as novas regras - entre as quais, estão a contratualização por escrito, a renegociação anual dos valores dos serviços e a adoção de um índice de reajuste.
O Procon Porto Alegre e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) afirmam que a empresa apenas precisa garantir que todos os serviços continuarão sendo prestados e está no direito de descontinuar contratos. A Unimed garante que nenhum usuário será prejudicado, pois apenas clínicas e laboratórios pouco utilizados ou cobertos por outras empresas foram desligados.
Conforme a Fehosul, há credenciados com valores remuneratórios atrasados há mais de 10 anos, principal motivo que deve levar a entidade a entrar com ação judicial contra o plano de saúde nos próximos dias. A federação também afirma que os usuários serão prejudicados:
- Há nulidades nesta determinação da Unimed as quais contestaremos via judicial. Esse é o maior descredenciamento da história do Rio Grande do Sul, que afeta diretamente os pacientes. Para se ter ideia, um dos serviços que foram descredenciados tem mais de 4 mil usuários pelo plano de saúde - afirma Cláudio Allgayer, médico presidente da Fehosul.
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Entre os casos mais críticos que terão de ser enfrentados com a medida, de acordo com Allgayer, estão o de pacientes com câncer. O tratamento autorizado até então será mantido até que seja concluído. Como é uma doença caracterizada pela reincidência, no entanto, se a clínica do paciente for descredenciada, ele terá de buscar outra para dar continuidade, caso a doença retorne.
- Pode ser ainda que ele faça uma quimioterapia em um foco da doença, por exemplo, em uma clínica, a partir de um protocolo já autorizado. E trate de outro foco, em caso de metástase, com outros profissionais, que continuam credenciados na Unimed. Isso é algo extremamente desgastante para pessoas que já estão fragilizadas - complementa o representante da Fehosul.
Outra queixa dos serviços descredenciados se dá em relação à "significativa diminuição" dos locais de atendimento para os beneficiados pelo plano. Conforme Allgayer, em Camaquã, eram cinco os laboratórios credenciados pela Unimed. Com a decisão, o número caiu para dois.
- Os usuários da Unimed terão de escolher entre os outros dois, que ficarão sobrecarregados. Embora ela tenha assinado contrato, lá quando buscou o serviço, por um plano bem mais completo do que a Unimed passa a oferecer. Essa manobra pode ainda ser interpretada como uma forma de a Unimed direcionar o atendimento para serviços prestados por ela mesma - diz Allgayer.
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Diretor de provimento de saúde da Unimed Porto Alegre, o médico Paulo Roberto Soares alega que a data de descredenciamento das 60 instituições foi "só uma coincidência" com a nova lei.
- Há algum tempo, estávamos fazendo uma avaliação da rede, pois havia um super-redimensionamento de acordo com o número de clientes. Para ter uma ideia, dos 60 descredenciados, em quase metade deles não havia sequer um registro de atendimento pela Unimed Porto Alegre. Por isso, o usuário não terá menos opções, mas ficará com aquelas que são geograficamente melhores e que realmente atendem às suas necessidades - justifica Soares.
Soares ainda garante que os clientes que já iniciaram algum tipo de tratamento poderão finalizá-lo mesmo que a clínica tenha sido descredenciada e ainda que, por exemplo, em caso de câncer, apareça metástase, não terá que migrar para outra instituição ou dividir o tratamento.
Sobre a afirmação da Fehosul de que os desligamentos seriam uma "manobra" para não precisar substituir os serviços credenciados (como previsto na nova lei) ou fazer o reajuste de valores remuneratórios, o diretor da empresa destaca que apenas uma parcela mínima foi retirada da rede. Segundo ele, as 60 instituições faziam 1,34% do volume total de atendimentos dos 720 mil clientes do plano de saúde - o diretor só soube informar o percentual, não o número.
Ele nega que a medida tentou escapar da necessidade de aumento nos pagamentos pelos serviços. Soares explica que os contratos firmados já previam índices de reajustes e todos foram cumpridos.
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O diretor ainda afirma que não existe nenhum artifício para obrigar os usuários a fazerem um uso maior dos serviços prestados pela própria instituição.
- A Unimed jamais faz direcionamento dos serviços, seja para laboratório A, B ou próprio. O usuário tem sempre livre escolha. Para reforçar que não existe direcionamento quanto aos desligamentos, dos nossos 353 serviços, 341 não são próprios da Unimed - finaliza Soares.
Procon acredita que não haverá prejuízo aos clientes
Flávia do Canto Pereira, diretora executiva do Procon de Porto Alegre, acredita que os clientes da Unimed não serão prejudicados com a medida. Ela entende que a decisão e também a nova lei dos planos de saúde não afetam diretamente o consumidor.
- Existe liberdade contratual da Unimed com cada clínica. O que a Unimed não pode fazer é deixar de prestar o atendimento contratado pelo plano - explica Flávia.
A advogada ressalta que, assim como o usuário não tem o direito de exigir o médico de sua preferência, apenas de ser atendido na especialidade que necessita, não pode escolher a clínica ou o laboratório onde fazer seu exame.
Somente se o plano de saúde não prestar o serviço requisitado, o cliente deve contatar a ANS - pelo Disque ANS 0800 7019656, através do formulário eletrônico ou ir até um dos endereços da agência - e acionar o Procon do seu município. Em Porto Alegre, o contato é o telefone (51) 3289.1774 ou diretamente na Rua dos Andradas, 686, no Centro.
Questionada, a ANS também afirma que, em princípio, não há irregularidade na ação da Unimed, pois a descontinuidade de um serviço pelo plano de saúde depende de cada contrato. A empresa que rege seus serviços e não precisa de autorização da agência para descontinuar contratos de laboratórios, clínicas e médicos, com exceção dos hospitais. Por isso, o caso não deve ser investigado.
A ANS ressalta que é caso de punição se algum usuário encontrar algum serviço na lista da empresa que não esteja mais credenciado por ela, pois a atualização deve ser em tempo real. Caso isso aconteça com qualquer plano de saúde, o usuário deve procurar a ANS nos contatos acima.