Simone foi professora de Bernardo Uglione Boldrini, é coordenadora pedagógica no Colégio Ipiranga, e é mãe de colega do menino, que costumava dormir e se alimentar em sua casa. Confira trechos do que ela falou a Zero Hora:
A senhora avalia que a escola poderia ter feito mais pelo Bernardo?
Hoje, tendo todas as peças do quebra-cabeças, a gente tem noção do que acontecia. Na época, o que eu como professora, coordenadora, mãe de colega dele... Ele não dava sinais. Várias vezes conversei com ele: "Bê, o que tá acontecendo, conta para mim". Ele não contava.
Quantas vezes o pai ou a madrasta foram chamados na escola para conversar?
Logo que a Odi (Odilaine, mãe de Bernardo, morta em 2010) faleceu, o pai veio duas, três vezes na escola. Nosso pedido sempre foi que o Bernardo deveria ter acompanhamento psicológico. Em uma entrega de boletim (maio de 2013), a Kelly (madrasta) disse que o Bernardo seria esquizofrênico. A Denise (psicóloga da escola) pediu o parecer do médico e me disse: "Simone, se eles internarem o Bernardo, eu vou denunciar, porque ele não é esquizofrênico".
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Não pensaram em denunciar naquele momento?
Não, porque ela ficou de trazer (o parecer do médico) e não trouxe. Antes das férias de inverno, o Conselho Tutelar nos procurou. Depois disso, Bernardo voltou das férias bem mais tranquilo. Claro que a gente sente, puxa vida, por que é que naquela sexta-feira (4 de abril, quando ele foi morto) não levei ele lá para casa, por que é que não fiz isso, por que não fiz aquilo? Acho que o caso serve de exemplo para a gente se desesperar. Eu me pergunto se devo continuar na coordenação, como professora ou não. Quando a gente começa a pensar... O que tu vai fazer? Como vai se envolver na vida dos outros, na casa? Eu sei, denuncia, chama o Conselho Tutelar...
Não é um dever da escola?
Eu sei, mas é difícil. É um dever que nos cabe, que nos foi imposto, mas é difícil denunciar alguém sem ter certeza de nada.
Se os chamados à família não surtiam efeito, vocês não pensaram em levar o problema adiante, chamar o Conselho Tutelar ou avisar o Ministério Público?
Ele dizia em dia de entrega de boletim: "O pai tem cirurgia". Aí tu vai fazer o quê? É complicado, é difícil. A gente descansou quando o Conselho Tutelar veio aqui, pensou: "Graças a Deus".
A senhora entende que os órgãos da rede de proteção - escola, Conselho Tutelar, Justiça - precisam se qualificar melhor para situações assim?
Uma coisa é uma criança que apanha, que vem com marca, é mais fácil de enxergar. Mas para uma coisa que tu não enxerga, como vai saber? Eu não sei. O próprio Conselho Tutelar, eles encaminharam para o Ministério Público. Se o juiz e a promotora não perceberam, como? O Bernardo disse para a Juçara (Petry) que ele contou tudo para o juiz. Se o juiz, sabendo de tudo, caiu na lábia do Boldrini, como nós não íamos cair?