Foi o espetáculo mais triste já exibido no Theatro São Pedro. Às 18h desta sexta, o nobre espaço cultural de Porto Alegre abriu as portas para familiares, amigos e fãs de Nico Nicolaiewsky, que morreu aos 56 anos, em decorrência de leucemia mieloide aguda. Do lado de fora, uma enorme faixa preta pendia na fachada do teatro. Na parte interna, as pessoas se acomodavam nas mesmas poltronas onde assistiram tantas vezes ao espetáculo musical e humorístico Tangos & Tragédias, fenômeno de popularidade sem precedentes no Rio Grande do Sul.
Pela primeira vez, o Theatro São Pedro sediou um velório, conforme a presidente do teatro Eva Sopher. O palco estava adornado com a cenografia do Tangos & Tragédias. Ao fundo, uma cortina azul cintilante. No lado direito, do ponto de vista do público, estavam o piano e o banquinho utilizados por Nico. O caixão estava no fosso que separa o palco da plateia, coberto por um pano preto com a Estrela de Davi, conforme a tradição judaica. Sobre o pano preto, recaía uma manta que Nico ganhou de presente do pai, estampada com notas musicais e teclas de piano. Ao redor, reuniam-se familiares, o parceiro Hique Gomez e um rabino. Todos os demais estavam na plateia, em silêncio reverente.
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Nico era conhecido por diversos talentos
Em 30 anos, o Tangos & Tragédias transformou Nico e Hique em duas das figuras mais queridas do Estado, tendo conquistado também o público de outras partes do país. Não é difícil encontrar alguém que nunca tenha assistido ao espetáculo, mas é raro que alguém tenha visto e não tenha se admirado. Diz-se que uma piada contada pela segunda vez não tem graça. Não era o caso. Praticamente sem sofrer modificações ao longo do tempo, o Tangos sempre lotava suas temporadas de verão no São Pedro. O público ria pela primeira, segunda, terceira vez. Exemplo disso é o diretor de produção Eliseu Rodrigues, 29 anos, um dos fãs presentes no velório:
- Assisti três ou quatro vezes em Porto Alegre, além de ter visto no Litoral. Chamava a atenção a expressão facial de Nico. Só de olhar era possível constatar que era uma pessoa de bom coração.
Perto dali, a engenheira agrônoma Vanessa Sperotto, 29, declara:
- É um tipo de artista que vai fazer falta no Rio Grande do Sul por sua importância com o Tangos e com seus outros trabalhos, como o Musical Saracura e a carreira solo.
O engenheiro civil Jullion Sperotto, 28, marido de Vanessa, resume:
- Essa perda foi inesperada. Todos estavam contando com a volta dele.
Diversas personalidades da cultura também foram ao São Pedro prestar homenagem. Para o escritor Luiz Antonio de Assis Brasil, secretário de Cultura do Estado, o artista conseguiu aliar a formação da música de concerto com a sensibilidade da música popular:
- O mais importante era a multiplicidade de talentos. Nico era músico, cantor, compositor e ator. E desenvolvia todos os talentos com o mesmo nível de excelência.
Thedy Corrêa, do Nenhum de Nós, acrescenta:
- Sempre foi um cara inventivo e nunca procurava a solução fácil. Se essa solução fácil aparecia, ele descartava.
O músico Arthur de Faria destaca a inventividade de Nico:
- Era um compositor muito maior do que as pessoas podem imaginar. Ele tinha um dado original que não existia em lugar algum. À parte do Tangos & Tragédias, criou, ao lado do (Cláudio) Levitan, um elemento de composição com características da música judaica.
Durante todo o tempo, a família de Nico manteve-se reservada. Hique também preferiu a discrição: optou por não dar declarações à imprensa, justificando que precisa de tempo para falar do parceiro de uma vida inteira.
Nico deixa a esposa, a atriz Márcia do Canto, e uma filha, Nina.
* Participaram desta cobertura
Carlos André Moreira, Daniel Feix e Marcelo Perrone
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