O Planeta dos Macacos, o livro de Pierre Boulle, completa 50 anos em 2013. O Planeta dos Macacos, o filme original, 45. A distopia sobre um mundo dominado por seres peludos em figurinos de época propunha uma espécie de paródia social da humanidade, refletindo e problematizando algumas das principais questões dos anos 60 - embora boa parte dos espectadores que assistiram ao filme comendo pipoca ou tomando Nescau no sofá da sala provavelmente não tenha se dado conta.
Para começar, os macacos eram separados socialmente conforme a raça. Gorilas eram soldados e tiravam partido da força física para impor respeito, orangotangos pertenciam à elite que queria deixar tudo como está, enquanto chimpanzés eram curiosos, inquietos e defensores da ciência e das mudanças.
Como acontecia com os humanos de forma especialmente intensa no começo dos anos 60, a convivência com a diferença não era pacífica entre as raças, e havia preconceitos de todos os lados. O tratamento dispensado aos homens, presos em jaulas e usados como cobaias pelos cientistas símios, porém, não parecia descabido nem mesmo para os avançados chimpanzés.
O medo de que a guerra fria e a cabeça quente da humanidade acabassem dando cabo do planeta é destacado no final apoteótico do filme: Charlton Heston avistando sobre as areias de uma praia deserta um pedaço da Estátua da Liberdade - e chegando à dolorosa conclusão de que a Terra que ele havia conhecido não existia mais. Já no livro de Pierre Boulle o destino trágico da raça humana aparece associado a uma questão que antecipava uma angústia contemporânea. O autor sugere que a derrocada da humanidade não foi causada pelas armas nucleares ou pelas disputas geopolíticas, mas por algo bem mais prosaico e aparentemente inofensivo: a preguiça. "O que está acontecendo poderia ter sido previsto. A preguiça mental tomou conta de nós. Acabaram-se os livros. Até mesmo histórias de detetive parecem exigir esforço demais de nós."
À luz da sensibilidade contemporânea, a forma como os humanos eram tratados pelos macacos no livro e no filme pode ser entendida como uma crítica aos experimentos com animais, embora o tema só tenha ganhado uma dimensão de discussão filosófica em 1975, com a publicação de Libertação Animal, de Peter Singer. De qualquer forma, já aparecia ali a semente do questionamento ético: temos ou não o direito de nos colocarmos acima das outras espécies? Em que circunstâncias? Sob que argumentos?
Na segunda década do século 21, a questão ainda está longe de parecer resolvida. Nos últimos 50 anos, o que consideramos aceitável em termos de sofrimento humano - e também em relação ao que temos o direito ou não de impingir a outras espécies - mudou bastante. A filosofia, que nos faz pensar em julgamentos morais e nas consequências dos nossos atos, e a ciência, que nos propõe avanços que podem ser úteis para toda a humanidade, nem sempre caminham de mãos dadas - e o caso das pesquisas com animais é um exemplo em que as escolhas, ou os "trade offs", nem sempre são simples ou evidentes a um olhar apressado ou apaixonado demais.
Virar cobaia de chimpanzés vestidos de doutor pode não ser um risco muito sério para a humanidade, mas os poderes destruidores da preguiça mental, como lembra Pierre Boulle, nunca podem ser subestimados.