Espécie de "Constituição" da rede, que busca regulamentar o uso da web no Brasil, o Marco Civil da Internet tramita há dois anos na Câmara dos Deputados. Engavetado pelas divergências entre governo, empresas de telecomunicações e gigantes do mundo virtual, o projeto ressurgiu com a denúncia de espionagem baseada em documentos vazados pelo ex-analista da Agência de Segurança Nacional americana (NSA, em inglês) Edward Snowden. O cenário conturbado torna imprevisível o desfecho da votação.
Com o pedido de urgência da presidente Dilma Rousseff, provável vítima da vigilância americana e, a partir desta segunda-feira o projeto do marco (PL 2126/2011) tranca a pauta da Câmara. O que não significa que será votado nesta terça-feira, na retomada das sessões. Antes de levar o texto a plenário, é preciso costurar o acordo entre os partidos, negociação que dará maior relevância à discussão da segurança dos dados dos milhões de internautas brasileiros.
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Na tentativa de reforçar a segurança, Dilma defende o armazenamento no país dos dados dos brasileiros. A proposta desagrada gigantes como Google e Facebook, que teriam de investir em novos data centers. Apesar da preferência da presidente, a obrigatoriedade dos bancos de dados só será confirmada no projeto nos próximos dias, revela o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator do marco civil. Para ele, a regra não terminará com a espionagem, mas permitirá a punição dos bisbilhoteiros.
- Atualmente, quem viola a privacidade não é punido porque os dados ficam em outros países, o que tira o efeito das leis brasileiras - explica.
Outro tema que terá debates acalorados é o conceito de neutralidade da rede, sem discriminação de acesso na internet. O modelo é defendido pelo governo e por provedores de conteúdo, mas sofre resistências das empresas de telecomunicações. As teles pretendem comercializar pacotes
especializados por conteúdos (e-mails, redes sociais, vídeos), na contramão da neutralidade.
- As teles reclamam que o projeto limita o modelo de negócio, mas é papel do Congresso defender o internauta. O modelo de negócio se adapta ao bem do usuário - defende Molon.
Já o líder do PMDB Eduardo Cunha (RJ) apontado como "patrono" dos interesses das teles, negocia para derrubar a neutralidade do texto:
- Não vejo problema em pacotes diferenciados. Quem só usa e-mail, por exemplo, paga menos. Por que comprar uma Ferrari quando um Fusca resolve?
Para ministro, lei traz estabilidade jurídica
Ministro das Comunicações e um dos articuladores do Marco Civil da Internet, Paulo Bernardo confia na aprovação do projeto:
- Claro, com debates acalorados e algumas votações sem consenso prévio. Com sua aprovação, teremos uma lei moderna e abrangente, se comparada com qualquer país do mundo. Também nos trará estabilidade jurídica, diminuindo os contenciosos em torno da web.
Na quinta-feira, o diretor de Políticas Públicas do Google, Marcel Leonardi, afirmou durante o evento Futurecom, no Rio de Janeiro, que exigir de empresas que operam no Brasil a instalação de data centers em solo nacional atrasaria ou impediria o lançamento de produtos da companhia no país.
- A dificuldade é grande para identificar o que é dado brasileiro. É quem se declara brasileiro? É quem passa por aqui em viagem? É um IP brasileiro? Na oferta de novos serviços e funcionalidades, o Brasil entraria no fim da lista - afirmou.