Crueldade, jamais. Testes com animais, sim. Essa é a posição do pesquisador André Silva Carissimi, professor associado da Faculdade de Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ele há anos trabalha com animais de laboratório e se mostra aberto defensor do uso de cobaias para testes, "pela simples razão de que é impossível fazer ciência aplicada sem elas". Nesta entrevista, ele condena a ação dos defensores de animais que invadiram um laboratório em São Roque (SP) para resgatar cães usados em pesquisa e explica os cuidados que os pesquisadores têm:
Zero Hora - O senhor ouviu falar que defensores dos animais resgataram beagles de um laboratório no interior de São Paulo?
André Silva Carissimi - Sim, por alto. Soube que levaram cerca de 200 animais, entre cães e coelhos. Parece algo bem planejado, racional. Considero uma violência o que fizeram. O laboratório era autorizado a funcionar e o teste com animais, em si, não é vetado no Brasil. Existe legislação bem ampla e difundida sobre o assunto, a Lei 11.974/2008, de autoria do deputado Sérgio Arouca. Ela permite o uso de animais para ensino e pesquisa, desde que respeitadas acomodações, regras sanitárias e não haja crueldade. Sabe-se lá o que será desses animais agora...Pior: será que não estão inoculados e ficarão à solta, por aí? Quem soltou deve raciocinar sobre isso.
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ZH - A UFRGS trabalha com cobaias? Faz pesquisa para entidades privadas?
Carissimi - Sim, existem cobaias no Biotério, que é amplo e novo. Mas não cães, apenas roedores. Aqui no hospital veterinário, onde atuo, é comum se operar cães, mas apenas os que necessitam da cirurgia. Quando eles morrem, aí o corpo é usado em sala de aula, para estudo. Mas não usamos caninos para testes. O uso, via de regra, é para pesquisa acadêmica, para ensino. Mas sei que já se usou para testes de laboratório, via convênios.
ZH - Os defensores de animais dizem que é possível fazer pesquisa sem uso de bichos como cobaias. É possível?
Carissimi - Olha, é impossível fazer ciência sem uso de cobaias. Existem substitutivos, alternativas, mas não para a maioria dos casos de testes necessários. É preciso testar num ser vivo certos medicamentos, antes da aplicação em humanos. É algo normal. Em alguns casos já se consegue testar o produto de outra forma: uso de substâncias na membrana do ovo da galinha, para ver se causa reação alérgica, por exemplo. Mas a maioria dos testes necessita do uso de cobaias. Isso não significa crueldade. Já não são comuns usos de doses letais para testar em animais, injeções de produtos para irritação de olhos e outras práticas muito questionadas