Com a urgência imposta pela rápida progressão de uma atrofia muscular espinhal (AME) que deformava o corpo e impedia os movimentos, Cláudio Luciano Dusik desvendou livros de informática e desenvolveu um teclado virtual para continuar escrevendo. Amanhã, na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o morador de Esteio de 36 anos defende sua dissertação de mestrado, detalhando a criação do aplicativo e os casos de cinco deficientes que se beneficiam com o programa, distribuído gratuitamente.
Bacharel em psicologia com duas especializações na área, Dusik sofre de AME do tipo Werdnig-Hoffmann. No decorrer da graduação, quando as mãos começaram a enrijecer, o estudante decidiu conceber a própria solução.
- Se tem um programinha que digita números, por que não tem um que digita letras? - pensou, ao utilizar uma calculadora no computador.
O universitário submergiu em lições de computação, área que desconhecia por completo. Nas madrugadas e nos intervalos da faculdade, destrinchou volumes "do tamanho de uma Bíblia" sobre linguagem de programação. O Mousekey, concluído em quatro meses, passou a permitir a seleção de letras e sílabas na tela, a partir de cliques no mouse. Hoje, Dusik consegue mexer, muito pouco, apenas a cabeça e a mão esquerda.
- A minha necessidade era urgente. A escrita iria me limitar, e a tecnologia me incluiu - comenta o mestrando.
Orientadora de Dusik, a doutora em Educação Lucila Maria Costi Santarosa destaca o brilhantismo, a persistência e a sensibilidade do aluno.
- Acabou essa história de a pessoa com deficiência ser a coitadinha. Você tem de dar espaço para ela crescer. O Cláudio responde prontamente, e à altura, a todos os desafios que você coloca - elogia a professora.
A presença de Dusik frente à banca avaliadora é mais uma conquista em uma trajetória improvável. Impactados com o diagnóstico do bebê, aos dois anos, e pelo alerta de que sobreviveria no máximo até os sete, os pais o submeteram a qualquer recurso que oferecesse um mínimo de esperança: tratamentos médicos, terapias alternativas e práticas religiosas.
Prognóstico médico era de fim iminente
Após inúmeras negativas em outras instituições, e com o tempo esgotando-se, um colégio particular, de orientação católica, aceitou a matrícula do menino. Para conseguir a vaga, a mãe fez um apelo à direção.
- Mas vocês pregam o amor! O meu filho não tem o amor de Deus? - questionou Eliza Arnoldo, 58 anos, professora de séries iniciais.
Aos cinco anos recém-completos, Dusik foi encaminhado a uma turma de 1ª série, para provar que seria capaz de aprender. Acomodaram-no em uma cadeira de dar papinhas a bebês, levada por Eliza, o corpo sem firmeza contido por almofadas para que não escorregasse. Impossibilitado de descer ao pátio, em um prédio sem elevador, ficava sozinho na sala durante o recreio. No segundo bimestre, estava alfabetizado.
Segundo de seis filhos - a única mulher também tem a doença -, o garoto vencia os dias imaginando a morte iminente. Os pais e os médicos explicavam que não tardaria a chegada do momento em que ele iria "morar com o papai do céu". O desfecho fatídico era tão alardeado que, após um período afastado das aulas, devido a uma intensa piora no quadro, o retorno espantou os colegas.
- Ué, "sor"? Ele voltou do céu? - perguntou uma menina ao professor.
Na adolescência, Dusik deparou com a necessidade de planejar uma carreira - perspectiva jamais considerada por alguém que havia se conformado com o futuro de "anjo". Agora, o quase mestre se prepara para a seleção do programa de doutorado, em abril:
- Vou seguir a minha vida. Nenhuma pessoa sabe o dia da sua morte. Não vou poder falar, não vou poder deglutir, vou usar aparelho para respirar. Sei que isso vai fazer parte de mim e vou pensar em como me adaptar.
Lição de vida
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Larissa Roso
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