Em busca de personagens marcantes e histórias inusitadas, a série Beleza Interior percorre um destino diferente do Rio Grande do Sul a cada sábado de 2011. Em Iraí, na divisa do Estado com Santa Catarina, conheça as razões da popularidade de um simpático e matreiro macaco-prego.
- Ele é tão visto na região quanto o Rio Uruguai - avisa Bola, vulgo Ricardo Beltrame, 49 anos, seu proprietário há duas décadas e meia desde que o simpático animal foi comprado de um motoqueiro.
Chico é um embaixador gaúcho da BR-386, mascote do poncho e da bombacha. Saúda todo visitante que entra pelo limite do Estado com Santa Catarina.
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Morando numa casinha de madeira junto a um chalé, o macaquinho acena para as crianças, usa o trapézio dos galhos para mostrar o sovaco, arreganha os dentes para as fotos. Tornou-se uma atração à parte de Iraí, município de 8 mil habitantes, situado a 485 quilômetros de Porto Alegre. Com modesta cambalhota, ele arranca uma chuva de nozes, pinhão e aplausos.
- Sua casa é um camarim. O problema são as exigências de celebridade. Coloquei a Preta (pastor alemão) e a Peca (vira-lata) como guarda-costas - debocha Bola.
A fama atingiu duas gerações de turistas. Para conhecê-lo, houve menino que saiu de Mato Grosso segurando um cacho de bananas durante a viagem inteira.
Aproveitando a condição de primata mais inteligente da América e o único que utiliza pedras e madeiras para abrir objetos, Chico é capricorniano, impossível, ansioso, temperamental, possessivo. Os defeitos não rendem castigo e isolamento. Pelo contrário, aumentaram a popularidade e o conforto.
Pesando três quilos de fofura, ele desenvolveu um apetite estranho, voraz, gaudério de raiz. Não se interessa por fruta, come apenas quando não há nada melhor. Por outro lado, saliva com um suculento pedaço de costela malpassada na tábua.
- Na hora do churrasco, Chico soca o telhado pedindo preferência. Nasceu com mate misturado ao sangue.
Os acessos de fúria não se restringem à fome. Enlouquece de ciúme da paternidade de seu dono. Ralha com qualquer aproximação dos filhos Ricardo, 22 anos, e Leonardo, 17 anos. Ao perceber desvantagem de cuidado, converte-se numa assustadora e mimada prima-dona. Faz escândalo, ameaça morder os jovens e bate o rabo no chão com o tremor irritante de chocalho.
- Sou obrigado a andar de carro para acalmá-lo.
O bicho termina por alcançar o que desejava. Acompanhar Bola nos passeios ao centro da cidade é sua glória urbana, momento raro em que permanece imóvel e pacificado. Senta no para-brisa do jipe e curte o vento de 60 km/h no rosto.
- Ele só não fala para não trabalhar.
As traquinagens rendem mobilizações familiares e expedições pelas árvores e encostas do rio. Rápido e acrobata, não cansa de testar a generosidade dos curiosos e furtar picolé, celular, máquina fotográfica e chapéu.
- Mas o que ele mais gosta de afanar é sorriso.
Bola que o diga, era um burocrata carrancudo, inseguro, enfiado numa escrivaninha de agência bancária. O macaquinho mudou sua história.
- Não tem como ser sério com o macaco. Podemos ser compenetrados com cachorro ou gato, mas com ele não. Exige a gargalhada. É o rei das cócegas.