A cada sábado de 2011, a série Beleza Interior vai percorrer uma cidade diferente do Rio Grande do Sul à procura de histórias inusitadas, personagens inesquecíveis e pontos de vista especiais. Hoje, a cidade retratada é Sério.
Não pergunte muito. Não vista roupas coloridas e extravagantes. Não coloque o som alto no carro. Não tente pedir informações na rua.
Os pedestres vão virar o rosto e fugir. Quem é da cidade é da cidade, e ponto final. Os que chegam são suspeitos.
- Identifico os rostos estrangeiros na hora - avisa Ricardo Luís Schuh, comandante da Brigada Militar.
Sério é um município acanhado, um esconderijo da BR-386. São 38 quilômetros de chão batido após Forquetinha. Estrada minúscula, serpeada, vertiginosa.
- Nosso esporte é remar poeira - diz Valmor Antoniolli, 47 anos. -Não tem camping, não tem rio, não tem fábricas. Ficamos esquecidos aqui por Deus e pelo Diabo.
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Sinais de celulares vacilam. Não há letreiros de hotéis e pousadas. A gasolina custa R$ 2,90 o litro. Nos bares, ainda persiste o caderno de fiado, com as compras acumuladas para acerto no final do mês. Homens andam com lenço no bolso da calça para limpar o suor. Mulheres penteiam o cabelo nas janelas. Ônibus de linha não tem pressa para sair, e o motorista conhece certinho o endereço de seus passageiros, e suporta atrasos sem reclamar. Não é o morador que precisa esperar na parada, é o motorista que espera o morador. Taxistas desapareceram. Os salões de beleza acontecem nos fundos das casas. Lojas são minimercados. O cemitério toma a quadra mais cobiçada do Centro - ironicamente, os mortos desfrutam da melhor paisagem daquela porção árida do Vale do Taquari.
Ninguém fica à vontade para rir na cidade de Sério. Não por ser um contrasenso, mas já prevendo a piada do visitante com o nome.
- Seriense não nasce chorando, nasce fazendo beiço para o destino - brinca Marisa Candido, comentando a falta de asfalto no acesso principal.
O estranho batismo reforçou uma fobia de turistas. As pessoas são desconfiadas, com um pé atrás.
- Não é antipatia, é timidez - esclarece Liane Farfatto, 38 anos, técnica em Enfermagem.
A tranquilidade torna-se a recompensa pelo isolamento. Ao meio-dia, Valmor nem fecha a loja aberta para almoçar com a família atrás do balcão. No costado do bar, reúne-se com sua mulher, Susana, 42 anos, seus filhos Wiliam, 15 anos, e Yuri, sete anos, e os sogros Victorino Danieli, 74, e Lídia Danieli, 73. Todo dia é a mesma coisa. William é o último a comer, Yuri é o primeiro a sair da mesa para esticar os braços diante do ventilador e monopolizar o vento, e Valmor provoca a sogra para um arranca-rabo.
- Só a convido para lavar a louça - cutuca.
- Ele me ama com culpa - responde Lídia.
A refeição costuma não ser interrompida por nenhum freguês.
- Aqui o cliente, além de ter sempre razão, tem imaginação - diz Susana.
As aventuras são por dentro dos pensamentos. O sonho das jovens é namorar sério e entrar de véu e grinalda na Igreja São José.
- Vale viver para esperar - diz Tatiana da Silva, 25 anos, que trabalha como babá em Lajeado, e noivou com Cedemir há pouco tempo.
Não descarta a possibilidade de passar a lua-de-mel na própria cidade.
- Quer maior privacidade? - desafia.
Notícia
Beleza Interior: Lugar de gente séria. E ponto.
Sério é o tema de hoje da série Beleza Interior
Fabrício Carpinejar
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