Ana Marcela Cunha não conseguiu repetir o ouro dos Jogos de Tóquio, em 2021, na Olimpíada de Paris. Ela terminou a prova de águas abertas (maratona aquática) na quarta posição nesta quinta-feira (8). Mesmo que lamente o resultado, a nadadora se sente feliz por representar o Brasil após quase desistir.
— Eu tenho de sair muito orgulhosa do meu ciclo. De tudo que eu pude fazer. Com todas as mudanças. Tudo que eu encarei. Há um ano, eu falei que eu não queria mais. Queria parar de nadar. Então, estar aqui hoje, ser quarto lugar, pra mim, é sensacional — disse à Rádio Gaúcha.
Apesar de ficar fora do pódio, a atleta comemora a participação e, principalmente, ter representado o Brasil em Paris.
— Em um ano, eu me reencontrei no esporte. Tenho de estar feliz. São poucos que estão aqui representando o Brasil. Meu choro é porque não sei se vou ter outra oportunidade — confessou.
No final de 2022, Ana Marcela foi submetida a uma cirurgia no ombro e ficou fora de competições por cerca de cinco meses. Depois, não conseguiu confirmar a vaga em Paris no Mundial de 2023, em Fukuoka. A confirmação veio no Mundial de Doha, em fevereiro deste ano.
Neste período, a nadadora baiana também alterou sua rotina. Ela se mudou para a Itália, onde continuou os treinamentos junto ao técnico Fabrizio Antonelli. Os últimos meses foram dedicados à prova de hoje, inclusive abdicando de participar de etapas do Circuito Mundial de maratona aquática.
Começo com dois anos
Ana Marcela começou a nadar aos 2 anos, em aulas de natação na creche que frequentava em Salvador, na Bahia. Aos 8, passou a competir por influência do pai, o ex-nadador George Cunha, e também da mãe, ex-ginasta. A atleta demonstrou talento desde a infância para as disputas de águas abertas, tanto em mares quanto em rios, além de se destacar nas provas de fundo em piscinas.
O talento nato para a natação levou a atleta a estrear em Jogos Olímpicos com apenas 16 anos, em 2008, quando ficou com o quinto lugar da maratona aquática, resultado considerado histórico. Dois anos antes, a brasileira já havia conquistado dois ouros no Sul-Americano de Buenos Aires.
Apesar do início de carreira promissor, Ana Marcela teve de lidar com frustrações olímpicas. Ela não conseguiu se classificar e ficou fora da Olimpíada de Londres-2012. Quatro anos depois, na Rio-2016, a atleta era favorita para subir ao pódio, mas um erro da sua equipe atrapalhou o seu desempenho. Os treinadores deixaram cair no mar a alimentação que a atleta deveria ingerir durante a prova. Sem a força necessária para competir com as adversárias, a soteropolitana encerrou em décimo.
O ciclo para os Jogos Olímpicos de Tóquio foi marcado por um drama pessoal. Em 2016, Ana Marcela descobriu uma doença autoimune que destrói a produção de plaquetas sanguíneas, responsáveis pelo processo de coagulação. Ela teve de se submeter a uma cirurgia para retirada do baço para manter a produção de plaquetas em um nível saudável, além de evitar complicações futuras. A nadadora faz uso de vacinas e antibióticos para ajudar o sistema imunológico ativo.
A doença foi descoberta depois de Ana Marcela sentir um mal-estar após uma prova em Salvador. Foi verificado que o número de plaquetas da atleta estava em 110 mil, quando o número normal ultrapassa a marca de 200 mil. Ela precisou passar por exames dolorosos, incluindo uma biópsia na medula para avaliar a possibilidade de câncer, e a retirada de 30 frascos de sangue em um único dia. A atleta se recuperou bem, apesar de a causa da doença ser incerta até hoje.
O tão sonhado ouro olímpico veio em 2021, nos Jogos de Tóquio, dois anos após subir ao lugar mais alto do pódio no Pan de Lima. Ana Marcela completou a distância de 10 km em 1h59min30s8, coroando a carreira de uma das maiores nadadoras de águas abertas da história. Desde então, a atleta alcançou o heptacampeonato em Campeonatos Mundiais, e o quinto ouro em Jogos Sul-Americanos. No Pan de Santiago-2023, ela ficou com a prata.