Cheguei à pista de skate de Ariake no final da manhã desta segunda-feira (26) com a esperança de cobrir um inédito pódio triplo brasileiro. Como um jornalista ávido por contar grandes histórias, essa era a minha maior expectativa, devido à presença de três atletas brasileiras top de linha nas finais do street feminino.
Por isso, quando foram divulgadas as notas da fase classificatória, que confirmaram a eliminação das favoritas Pâmela Rosa e Letícia Bufoni, fiquei um pouco frustrado, imaginando que a minha pauta perderia força.
Ledo engano. Acabei testemunhando in loco um dos mais importantes e mais emocionantes capítulos da história do esporte olímpico brasileiro.
Quem me conhece sabe que uma das minhas características como repórter é não me envolver emocionalmente com os acontecimentos. Acredito que a frieza e a objetividade são fundamentais para o jornalista cumprir o seu dever de relatar para o público os fatos que são de interesse público.
Bom, se isso for um requisito para uma boa cobertura jornalística, reconheço que nesta segunda eu falhei miseravelmente. Quando as notas da final confirmaram a medalha de prata para a jovem maranhense Rayssa Leal, de apenas 13 anos, me emocionei. Foi de arrepiar.
Enquanto eu gritava "Rayssa Leal é prata, é prata" ao vivo no microfone da Rádio Gaúcha (irritando um pouco os jornalistas estrangeiros ao meu lado que queriam escrever suas matérias em silêncio), me arrepiei. Ali, o jornalista frio e objetivo dava lugar a um brasileiro emocionado.
Esquecendo um pouco a pauta jornalística, lembrei da minha timidez e dos dramas típicos da pré-adolescência que vivia quando eu tinha 13 anos. Invejei a tranquilidade e a leveza com que Rayssa superava os obstáculos da pista naquilo que deveria ser o momento de maior ansiedade e tensão para ela. Mas não era. Ela competia na primeira final olímpica da história do skate como se estivesse brincando no Marinha.
Depois, na zona mista, Rayssa respondia às perguntas minhas e dos demais colegas com a naturalidade de quem bate um papo com os amigos no recreio do colégio. Ouvindo suas respostas, assistindo a suas manobras e observando o seu semblante, tive a convicção de que ela não tem nenhuma noção da dimensão do que ela fez. Só a terá daqui alguns anos. Para ela, naquele momento, parecia só mais uma brincadeira de skate. Uma brincadeira que divertiu milhões de brasileiros de uma forma que ela sequer imagina.
Relembrar os dilemas dos meus 13 anos é fácil. Mas há uma situação em que, como homem, não tenho como me colocar no lugar. Só tenho como imaginar. Me refiro ao drama das milhares de garotas que sonham em andar de skate e não o fazem por conta do preconceito. Essas meninas agora terão uma grande inspiração para ir em busca dos seus sonhos.
Só as mulheres sentem de verdade o que é o machismo. E só as garotas que sonham em andar de skate sem os rótulos de uma sociedade preconceituosa e conservadora desfrutarão por completo do legado proporcionado em Tóquio por Rayssa Leal.
Esta foi, sem dúvida, uma das maiores conquistas brasileiras na história dos Jogos Olímpicos. Mais importante e mais emocionante até mesmo do que um inédito pódio triplo.