A notícia que confirmava as arquibancadas vazias em Tóquio 2020 veio acompanhada de uma mensagem: emergência. Um dos países primeiramente impactados pela pandemia no começo de 2020 avisava que, mesmo diante do contexto mundial, precisaríamos buscar a esperança para construir o amanhã.
Hoje, 23 de julho de 2021, um ano após a data em que oficialmente seria realizada a Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos, foi possível compreender que essa esperança, essa necessidade de avançar, está baseada em uma pluralidade de vozes, visões, origens e, principalmente, corações.
Não entrei no Estádio Olímpico de Tóquio. E, confesso, incialmente, foi uma frustração entender que, mesmo carregando um crachá de uma empresa detentora de direitos, não teria a oportunidade de ver de perto um evento que seria transmitido por um sinal internacional de televisão para todo o mundo. O primeiro evento global e presencial realizado após o começo daquela mesma pandemia oficializada pela OMS em 12 de março do ano passado.
Comigo, também não entraram centenas, milhares, milhões de pessoas que sonhavam — e ainda sonham — em ver uma Olimpíada com os próprios olhos. Mas para vivenciar as Olimpíadas não é preciso estar unicamente dentro do estádio ou das áreas de competição.
Nos arredores, um dos japoneses com quem conversei me disse:
— Estamos aqui para podermos ouvir o que acontece lá dentro e, assim, poder sentir as Olimpíadas.
Ele havia comprado ingressos para assistir a provas do atletismo com toda a família. Estava orgulhoso de ver o seu país receber os Jogos. Pude ouvir de outro, um pouco mais jovem, que compreendia os protestos e o problema de realizar o evento diante do tamanho do impacto do coronavírus. Mas, ao mesmo tempo, não poderia deixar de ver a história acontecer.
Houve também um senhor europeu que, ao ver a multidão se reunir para fotografar o Estádio Nacional de Tóquio, perguntou-me: "O que é isso? O que está acontecendo lá dentro?".
Ele poderia, talvez, ter perguntado aos quase cem jovens japoneses que protestavam com dois pedidos: "Cancelem os Jogos Olímpicos" e "invistam para salvar vidas". Do outro lado, em frente aos mesmos anéis presentes nos cartazes do protesto, as pessoas se amontoavam para tirar fotos, aplaudir a entrada dos países e vibrar com os drones que sobrevoaram o céu da capital japonesa. Coincidência ou não, após impressionar a multidão com as suas luzes e movimentos, a nuvem de tecnologia falhou exatamente quando iluminaria a cidade olímpica com a letra da música "Imagine".
A informação já havia sido dada. Os tempos de emergência nos impedem até mesmo de iluminar o horizonte com imaginação. Contudo, na noite desta sexta-feira, foi possível viver, um pouco abaixo do céu, nas ruas dos arredores da Cerimônia de Abertura, a sensação de que é possível retornar a esperança no mundo. E não apenas com as gerações que virão, mas aquelas mesmas que estão ao nosso lado e, há tempos, deixamos de reconhecer. De aprender com eles.
A notícia das arquibancadas vazias na Tóquio 2020 não vinha acompanhada de uma grande verdade: a Olimpíada se faz nas ruas. Nos protestos de uma juventude que clama por investimentos no futuro. Em um casal que se junta para jantar em uma calçada enquanto admira o estádio. Ou mesmo em famílias, que, ao levarem seus filhos para a porta do Estádio Nacional, davam a eles o exemplo de conviver com a diversidade de uma rua em que se acumulavam nacionalidades, idades, expectativas, verdades e emoções.
A babel que se construiu ao redor do Estádio Nacional de Tóquio nessa noite de julho de 2021 não tinha a velocidade da silenciosa nuvem de drones que ocupou a cidade como gafanhotos. Também não pôde participar de ensaios milionários para que o seu ballet aéreo fosse minuciosamente preparado. E muito menos tinha a pretensão de impactar o mundo e virar um relato da história.
Apesar de tudo isso, a luz que veio das ruas de Tóquio na noite de hoje, em sua desorganização e naturalidade, conseguiu iluminar os céus, o futuro e os corações de quem vivenciou esse momento. Aqui, do lugar que eu pude ver esse capítulo, foi possível ler no olhar de todos: espero que um dia você se junte a nós.
A notícia das ruas cheias de pessoas ao redor do Estádio Nacional de Tóquio na Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos 2020 veio acompanhada de uma mensagem: esperança.