A intenção do governo russo em realizar Jogos da Amizade em setembro deste ano foi veemente rechaçada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) nesta terça-feira (19). Em carta aberta, a entidade que rege o esporte no mundo acusou a Rússia de "politizar o esporte" ao promover "seus Jogos da Amizade", que ainda teriam uma edição de inverno.
O forte manifesto do COI pede ao mundo esportivo e aos governos convidados por Moscou que "rejeitem qualquer participação e apoio" a este novo evento. O comitê acusa o governo russo de "lançar uma ofensiva diplomática muito intensa", o que "constitui uma violação flagrante da Carta Olímpica e, ao mesmo tempo, uma violação das diversas resoluções da ONU".
A intenção do governo de Vladimir Putin é organizar um evento paralelo aos Jogos Olímpicos, já que a Rússia sofre com sanções que impedem o país de participar em Paris. Até o momento, a participação de atletas russos nos Jogos Olímpicos de Paris, segundo o COI, será autorizada sob bandeira neutra e na condição de não terem apoiado a invasão russa da Ucrânia.
Em outro trecho da carta, o COI cita que os atletas poderiam ser "forçados por seus governos a participar dos Jogos da Amizade" e serem "explorados como parte de uma campanha de propaganda política", o que é vedado pela Comissão de Atletas da entidade.
Segundo a entidade, "o governo russo também mostra total desrespeito pelos padrões globais antidoping e pela integridade das competições" e também "esteve implicado no programa sistêmico de dopagem nos Jogos Olímpicos de Inverno de Sochi 2014 e, mais tarde, na manipulação de dados antidopagem".
O COI encerra a carta convocando " o Movimento Olímpico e todos os governos a rejeitarem qualquer participação e apoio a qualquer iniciativa que pretenda politizar totalmente o desporto internacional".
Confira íntegra da carta divulgada pelo COI:
O Comité Olímpico Internacional (COI) reafirma a sua forte posição contra a politização do desporto. Esta posição é um Princípio Fundamental da Carta Olímpica, que diz:
“Reconhecendo que o desporto ocorre no âmbito da sociedade, as organizações desportivas do Movimento Olímpico devem aplicar a neutralidade política. Têm os direitos e obrigações de autonomia, que incluem estabelecer e controlar livremente as regras do desporto, determinar a estrutura e governação das suas organizações, gozar do direito de eleições livres de qualquer influência externa e da responsabilidade de garantir que os princípios da boa governação sejam respeitados. aplicado.”
A Carta Olímpica também afirma:
"A missão do COI é promover o Olimpismo em todo o mundo e liderar o Movimento Olímpico. O papel do COI é: opor-se a qualquer abuso político ou comercial do desporto e dos atletas.
Estes princípios foram reconhecidos e apoiados repetidamente por diversas resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) nos últimos anos, incluindo expressamente o "reconhecimento dos princípios fundamentais da Carta Olímpica".
Estas resoluções também apoiaram o papel de liderança do COI, em particular a resolução chamada "O desporto como facilitador do desenvolvimento sustentável" , de novembro de 2022, que afirmava que a Assembleia Geral da ONU "apoia a independência e autonomia do desporto bem como a missão do Comitê Olímpico Internacional na liderança do movimento olímpico e do Comitê Paralímpico Internacional na liderança do movimento paralímpico".
A maioria destas resoluções foi adotada por consenso por todos os Estados-membros da ONU, com exceção da mais recente, que foi aprovada com abstenções apenas pela Federação Russa e pela República Árabe Síria.
O COI observa que, contrariamente aos Princípios Fundamentais da Carta Olímpica e às resoluções da Assembleia Geral da ONU, o governo russo pretende organizar eventos desportivos com motivação puramente política na Rússia. O governo russo criou e financiou a "Associação Internacional de Amizade" (IFA), para sediar os "Jogos da Amizade" de verão e inverno.
O governo russo pretende organizar eventos desportivos com motivação puramente política na Rússia"
COMITE OLIMPICO INTERNACIONAL
Entidade ao abordar a ideia russa de realizar os Jogos da Amizade
Aparentemente, a primeira edição dos “Jogos da Amizade de Verão” está prevista para ser realizada em Moscou e Ecaterimburgo, na Rússia, em setembro de 2024, e os "Jogos da Amizade de Inverno" em Sochi, na Rússia, em 2026.
Para este efeito, o governo russo lançou uma ofensiva diplomática muito intensa, fazendo com que delegações e embaixadores governamentais, bem como autoridades ministeriais e outras autoridades governamentais, se aproximassem de governos de todo o mundo. Para tornar ainda mais óbvia a sua motivação puramente política, eles estão deliberadamente a contornar as organizações desportivas nos seus países-alvo. Isto constitui uma violação flagrante da Carta Olímpica e, ao mesmo tempo, uma violação das diversas resoluções da ONU.
É uma tentativa cínica da Federação Russa de politizar o desporto. A Comissão de Atletas do COI, que representa todos os atletas olímpicos do mundo, opõe-se claramente à utilização de atletas para propaganda política. A Comissão vê mesmo o risco de os atletas serem forçados pelos seus governos a participar num evento desportivo tão totalmente politizado, sendo assim explorados como parte de uma campanha de propaganda política.
O governo russo também mostra total desrespeito pelos padrões globais antidoping e pela integridade das competições. Este é o mesmo governo que esteve implicado no programa sistémico de dopagem nos Jogos Olímpicos de Inverno de Sochi 2014 e, mais tarde, na manipulação de dados antidopagem.
Na semana passada, a Agência Mundial Antidopagem (WADA) expressou as suas "preocupações constantes sobre os planos da Rússia de organizar os Jogos da Amizade, um evento não sancionado, em setembro de 2024. Em particular, é preocupante que, como o evento não se realizará, sob a proteção do Código Mundial Antidopagem, a saúde e a justiça (resultados limpos) dos atletas podem ser comprometidas. A WADA convoca todos os signatários do Código Mundial Antidopagem a terem cautela e a não legitimarem este evento, uma vez que a Agência não pode garantir o programa antidopagem que pode ou não estar em vigor. Esta posição é reforçada pelo fato de a Agência Nacional Antidopagem da Rússia (Rusada) não estar atualmente em conformidade com o Código, de não existir atualmente nenhum laboratório acreditado pela WADA na Rússia e de a confiança geral no sistema antidopagem na Rússia permanecer baixa.
Por todas estas razões: a flagrante violação da Carta Olímpica; a violação das respectivas resoluções da ONU; o desrespeito aos atletas e à integridade das competições desportivas; o Movimento Olímpico condena veementemente qualquer iniciativa para politizar totalmente o desporto, em particular a criação de eventos desportivos totalmente politizados pelo governo russo.
O COI insta veementemente todas as partes interessadas do Movimento Olímpico e todos os governos a rejeitarem qualquer participação e apoio a qualquer iniciativa que pretenda politizar totalmente o desporto internacional."