Pelé e o filho mais velho, Edinho, têm um ritual fechado, um momento só dos dois: assistir aos jogos de futebol, principalmente do Santos, juntos. São horas de troca, cumplicidade e companheirismo. Edinho se sente orgulhoso porque o maior jogador de todos os tempos ouve o que ele diz e até reproduz os comentários em outras conversas.
— Talvez seja o momento mais feliz que tenho com ele. É uma tradição — diz Edson Cholbi do Nascimento, hoje com 52 anos.
Edinho contou essa lembrança ao Estadão antes da internação do pai, no mês de novembro. O técnico do Londrina passava um raro período de férias em Santos, no litoral paulista. Na quarta-feira (21) desta semana, ele foi apresentado oficialmente no clube paranaense e lamentou a distância do pai, que está internado em São Paulo desde o fim de novembro.
O último boletim médico do ex-jogador de 82 anos apontou piora do seu quadro de saúde, com progressão do câncer que trata no cólon. Ele vive o maior desafio profissional de sua carreira como treinador e, ao mesmo tempo, seu pai está internado em situação difícil.
— Ver os jogos é das coisas que mais nos une. Em alguns momentos, ele me consulta. Me sinto orgulhoso quando ele usa meus comentários em outras conversas. Além de ser filho, sou seu fã. Assistir a um jogo com ele é privilégio — disse Edinho perto do canal 6, numa tarde ensolarada, entre vários pedidos de autógrafos de quem passava pelo quiosque do Zé do Coco, em Santos.
Por conta da separação de Pelé e Rosemeri Cholbi, mãe de Edinho, os dois não foram muito próximos na infância e adolescência do treinador, vividas nos Estados Unidos.
— A gente foi muito distante na minha adolescência, mas, assim que voltei ao Brasil, busquei uma reaproximação e tenho muito orgulho disso. É uma relação de respeito e admiração mútua —afirma.
Por causa da distância, o adolescente Edinho tinha dificuldades em aceitar o apelido natural de "príncipe", o filho do rei. A homenagem acabou eternizada na música Capítulo 4, Versículo 3, do grupo Racionais Mcs.
— Quando cheguei no Brasil, eu ficava irritado porque não era príncipe, era maloqueiro. Naquele momento, eu ainda queria desassociar minha figura da história do meu pai. Tinha certa mágoa por causa da separação. Com o tempo, virou orgulho. Acabei abraçando o apelido — lembra Edinho.
O tema central da conversa não foi só o pai, mas a retomada da carreira do filho. O trabalho no Londrina é apenas o quarto na carreira do treinador. Antes, Edinho comandou Mogi Mirim, Água Santa e Atlético Tricordiano, de Três Corações, cidade mineira onde Pelé nasceu. Além disso, o treinador trabalhou ainda na comissão técnica do Santos entre 2007 e 2015 e depois entre 2020 e 2021, onde pôde desenvolver sua profissão.
— Depois da minha carreira como atleta é o momento mais importante e mais significativo da minha vida profissional — reforça.
Nesta última quarta, ele admitiu estar envolvido com o Londrina na preparação do time para o Campeonato Paranaense. Ele sabe da gravidade de saúde do pai, e se divide entre trabalhar e ficar ao seu lado no hospital.
— Quanto mais sucesso eu conseguir aqui, na minha trajetória, isso leva alegria para ele lá também. Estou em paz com isso. Mas, sempre com o pensamento lá. Às vezes me desligo um pouco e vou para um canto refletir, orar. É uma questão natural, mas muito difícil, que todos passam eventualmente. Mais uma vez, só muita gratidão por todo carinho e por toda energia positiva que a gente vem recebendo — acrescentou Edinho nesta semana.
Problemas com a justiça
Edinho também fala abertamente sobre os problemas que travaram sua carreira. Condenado por associação ao tráfico de drogas, ele deixou a prisão em 2019 ao conseguir progressão ao regime aberto. Sua única obrigação é comparecer ao Fórum Criminal uma vez por mês.
A pena de 33 anos de reclusão foi reduzida para 12 anos e 11 meses. Depois de cumprir mais de três anos em regime fechado, Edinho reafirma sua inocência.
— Fui acusado de um crime que eu não cometi. Quase destruiu a minha vida e atrapalhou muito minha carreira. Tudo por uma situação injusta — diz o treinador.
Por outro lado, Edinho reconhece que teve ingenuidade no episódio. Edinho foi condenado depois que uma operação da Polícia Federal interceptou conversas telefônicas do ex-goleiro com líder do tráfico no litoral paulista.
— Sempre deixei clara a distinção da minha inocência e da minha responsabilidade. Fui ingênuo no episódio, mas não sou nenhuma criança. Eu entendo onde eu fui responsável por permitir um cenário, por permitir que acontecesse essa injustiça — complementa.