A zona sul da Capital, berço de craques como Ronaldinho e Raphinha, vê surgir um novo time de futebol. Mas não é qualquer clube — e nem em qualquer lugar. O nome, por si só, já chama atenção: Monsoon FC. Trata-se do nome da empresa, com sede em Dubai, que é dona da equipe. E a sede é o Estádio João da Silva Moreira, mais conhecido como Parque Lami, que pertence à família Assis Moreira e é a antiga casa do extinto Porto Alegre Futebol Clube.
Com menos de um ano de existência, já que o clube foi fundado em outubro de 2021, uma curiosidade sobre o Monsoon é que, até hoje, o time nunca perdeu em competições profissionais. Seja pela Copa FGF ou pela Terceirona do Gauchão, competição da qual a equipe foi campeã após vencer o Bagé, no sábado (24).
O presidente do clube é o gaúcho Lucas Pires, natural de Santa Maria. Aos 37 anos, ele mora nos Estados Unidos e faz parte do conselho do grupo Monsoon Venture Partners. Responsável pelo braço esportivo da companhia, que gerencia a carreira de atletas, o empresário já ocupou a vice-presidência de grandes empresas, como a MMA Elite, de produtos ligados ao mundo das lutas, e a Deluxe Media, que trabalha com a pós-produção cinematográfica.
Foi dele a ideia de criar um novo clube de futebol em Porto Alegre. Para colocar em prática, contou com o apoio de Sumant Sharma, indiano que é o CEO do grupo Monsoon. Multimilionário, o empresário do ramo de tecnologia participou da criação e da venda da Acme Packet para a Oracle, multinacional de tecnologia, por cerca de US$ 2 bilhões. O nome Monsoon, inclusive, é uma espécie de homenagem de Sharma a um velho amigo.
— Monsoon era o apelido de um amigo dele que morreu. Mas também significa tempestade. E a nossa ideia é essa, trazer tempo ruim para os adversários. Tem toda essa analogia, que nós vamos fazer chover. A gente pretende trazer esse impacto no futebol mesmo. Queremos chegar para fazer diferente, para causar — afirma Lucas Pires.
O primeiro impacto diz respeito à sede do novo clube. O Parque Lami estava praticamente abandonado desde 2012, quando o Porto Alegre FC fechou as portas. O estádio até chegou a receber o Cruzeiro, de Cachoeirinha, e jogos do futebol de várzea, mas quase não recebeu manutenção no período. Por isso, a primeira medida dos profissionais que foram contratados pelo Monsoon foi cuidar da reforma do espaço do estádio, área administrativa, alojamentos e toda a estrutura de centro de treinamentos, que inclui cinco campos, academia, sala de fisioterapia e vestiários.
— A gente fez um contrato de uso do espaço com o Roberto (Assis), que é meu amigo pessoal. Arrendamos a área por 10 anos e fundamos o clube. Eles nos cederam o direito de usar o estádio e todas as instalações. Em contrapartida, a gente faria todas essas reformas que eram necessárias. A gente pretende comprar outras áreas para expandir o nosso funil de captação, mas a nossa casa é aqui — explica o presidente do Monsoon.
Ao lado de Lucas Pires, dois profissionais que trabalharam com ele em outro projeto, no Marítimo, em Canoas, chegaram para tocar o novo clube: o ex-jogador Jurandir da Silva, com passagem pela dupla Gre-Nal, e o empresário Fernando Brandi, do ramo de tecnologia. Da Silva é o vice-presidente de futebol, responsável pela montagem do elenco e por cuidar do dia a dia da equipe, enquanto Nando é o homem da gestão e planejamento do time.
— A parte do futebol eu fico tranquilo para fazer, porque estou há muito tempo nesse ramo. Fui jogador, empresário, conheço muita gente nesse meio. O que eu não tenho é esse lado do business, da gestão de pessoas, que o Lucas (Pires) é expert — ressalta Da Silva, que foi relevado pela base do Inter e saiu para jogar no Grêmio, no início dos anos 2000.
Com apenas um trintão, time tem média de 21 anos
O Monsoon FC, hoje, conta com o grupo profissional e um time sub-17. Na equipe principal, porém, estão diversos jovens. A média de idade do elenco na Terceirona do Gauchão foi de pouco mais de 21 anos. Muito por conta das regras da competição, que limitam o número de inscritos acima dos 25 anos a até 12 atletas e, especialmente, pelo fato de um máximo de três jogadores poderem ter atuado na Primeira Divisão dos Estuais neste ano.
Por conta disso, o único com mais de 30 anos no elenco é o centroavante Maicon Santana, 33, capitão do time. Além dele, os mais experientes são os meias Marlon Bica (ex-Inter e seleção brasileira de base) e Rodney, ambos de 28 anos.
— Maicon é o cara mais experiente. Temos jogadores que dá para a gente fazer negócio ainda, inclusive já tivemos procura por alguns deles. O nosso papel aqui é formar o time, vender e formar outro. Não posso ficar apegado aos jogadores. Não vou prender ninguém, nossa obrigação é deixar o jogador pronto para o mercado. Por isso não acredito muito nessa lógica de que ou é campeão ou vende. Nós vamos fazer os dois, vamos ser campeões e vender também. Ninguém quer comprar time derrotado — diz Lucas Pires.
Da Silva conta como esses jogadores foram escolhidos para iniciar o projeto do Monsoon:
— Alguns deles jogaram comigo, como o Maicon e o Rodney, e o outros chegaram por indicação, por vídeo. Temos que dar o crédito também para o técnico que estava aqui, o Alexandre Lopes, que nos ajudou na formação do elenco. Agora o técnico é o Cristian de Souza, que treinou o Veranópolis e já passou por diversos outros clubes.
O investimento anual do Monsoon está previsto em R$ 3 milhões para este primeiro ano. Mas, conforme o presidente do clube, irá aumentar quando forem criadas as categorias sub-20 e sub-15. A folha salarial do grupo profissional, que tem 28 jogadores, é de aproximadamente R$ 120 mil. Além dos atletas, são mais 40 funcionários entre comissões técnicas e pessoal que cuida das partes administrativas, de limpeza, segurança, cozinha, manutenção e demais atividades internas.
— Hoje temos uma condição financeira que os outros clubes não têm. Alguns clubes têm investidores, mas não sei qual a capacidade financeira deles. Mas certamente somos o líder ou um dos líderes de investimento na Terceirona — afirma Pires.
A verba, por enquanto, vem toda da Monsoon Venture Partners. Lucas Pires é um dos sócios da empresa, mas se reporta a outros investidores. No grupo, há empresários de Dubai (sede), dos Estados Unidos e da Índia. O clube, hoje, segue o modelo de clube-empresa, mas ainda não é uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF), que dá benefícios tributários e de mercado. Até agora, não há patrocinador. Mas, segundo o presidente, não é por falta de propostas.
— O clube, hoje, vive do nosso investimento. Não temos patrocinador porque a gente quer parceiros fortes, que tenham a mesma visão e possam agregar. Não podemos vincular a nossa imagem a qualquer marca, porque se eles fizerem besteira reflete na gente também. Por isso vamos nos manter com verba nossa até encontrarmos os parceiros certos para o nosso projeto — diz o presidente do Monsoon.
Estrutura de fazer inveja a clubes tradicionais
O espaço físico impressiona. A área do antigo Porto Alegre FC, no bairro Lami, conta com muito mais do que apenas o estádio. São cinco campos de treinamento, alojamento para 250 atletas — hoje há 70 jogadores alojados no local —, academia, sala de fisioterapia, refeitório e uma ampla área administrativa. A estrutura, que segue em reformas, é elogiada por todos dentro do clube.
— Tudo que nós, profissionais do futebol, desejamos é uma estrutura física de qualidade. Esse foi, sem dúvida, um dos principais motivos que me fez aceitar esse desafio. Poder usar essa infraestrutura, que temos tanta limitação no nosso interior com clubes menores. Aqui não. Temos a possibilidade de poder usufruir e estamos fazendo um bom uso dessa área, que é esplêndida para a prática esportiva — destacou Cristian de Souza, treinador da equipe profissional do Monsoon.
Márcio Ebert, técnico da equipe sub-17, acrescenta:
— A gente conhece todo o Estado entre profissional e base. Fora dupla Gre-Nal e Juventude, difícil achar uma estrutura assim. São cinco campos de treinamento, mais estádio, academia, toda uma estrutura física incrível. Isso nos dá uma alegria, uma satisfação e ajuda na formação dos atletas.
O jovem Lucas Micael Barth, 17 anos, teve passagem pelas categorias de base do Inter e, no ano passado, estava no Marítimo, em Canoas, que tinha a participação dos profissionais que fundaram o Monsoon. Ele relata que resolveu migrar para o novo clube muito por conta do projeto que lhe foi apresentado, que incluía toda a estrutura na zona sul da Capital.
— Eles me apresentaram o local e eu não hesitei vir para cá, porque já os conhecia e aqui é muito bom. Essa estrutura, esse conforto, nos dão tranquilidade para nos preocuparmos apenas com o campo. Eu alojo aqui no clube. Os quartos são para seis meninos, bem espaçosos, confortáveis, tudo reformado. A fisioterapia e a academia também são novas, o projeto é muito bom — assegura o atleta do time sub-17.
Os jovens que tiverem interesse em fazer parte do clube, porém, terão de esperar a abertura de uma peneira ou chamar atenção por outra equipe. Isso porque a maioria dos atletas chega por meio de indicação de olheiros e empresários parceiros.
Clube mira o acesso e vaga na Copa do Brasil
Competir e ganhar. Esses são os lemas do Monsoon dentro de campo. Inspirado por modelos como o do Athletico-PR, comandado por Mario Celso Petraglia, e do Bragantino, que tem o aporte da Red Bull e o futebol é gerido pelo executivo Thiago Scuro, a ambição de Lucas Pires à frente do novo clube porto-alegrense é alcançar os resultados de uma forma rápida, sem esperar tanto tempo para colher os louros das vitórias.
— A gente quer chegar nas competição para brigar, não é para tomar pau. Pessoal fala que futebol é longo prazo e eu pergunto por quê. A empresa tem de ser eficiente. Temos de jogar para ganhar. Em todos os aspectos. Na gestão, na formação dos atletas e no campo. Não tem ganhar aqui e perder ali, a nossa meta é ganhar em tudo. Nossa ideia é ter um time campeão, que forma e vende. Não quero só uma das coisas. Por que ser bom em uma coisa só? Queremos ser bons em tudo. Tem um investimento, então a gente quer o resultado — afirma o presidente do clube.
O objetivo inicial, que era garantir uma vaga na Divisão de Acesso em 2023, foi assegurado ao classificar o time para a final da Terceirona.
Os dirigentes do Monsoon ressaltam que, para os jogadores, há possibilidade de seguirem para clubes parceiros no Brasil, como Athletico-PR, Corinthians e Flamengo, com os quais Lucas Pires mantém boa relação. Outro caminho natural, no entendimento do presidente da equipe, é o mundo árabe, já que a empresa que investe no time tem sede em Dubai e é parceira do Sharjah FC, dos Emirados Árabes Unidos.
Por enquanto, ao menos, o clube começou a aparecer com o título da Terceirona. Tem neste ano, ainda, o Troféu Tarcisio Flecha Negra, a Copa FGF, para tentar alcançar vaga na Copa do Brasil. Até porque a meta do Monsoon é "ser conhecido em todo o Brasil". Para isso, Lucas Pires entende que é preciso, além de subir de divisão estadual, conquistar vaga na Série D.
A partir daí, o investimento do mundo árabe e o modelo de um novo clube-empresa na zona sul da Capital terão de fazer a diferença para que o Monsoon cresça e deixe de ser "aquele time que joga no estádio da família do Ronaldinho" para se tornar "o time que formou o novo Ronaldinho". Ou Raphinha. E que, como os craques nascidos na região, consiga deixar o nome marcado no mapa do futebol.
Os campanha do Monsoon nos mata-matas
Quartas de finais
- Elite 2x2 Monsoon
- Monsoon 2x0 Elite
Semifinais
- São Borja 1x1 Monsoon
- Monsoon 2x0 São Borja
Final
- Bagé 0x0 Monsoon
- Monsoon 1x0 Bagé